História preservada nas casas da cidade

Antigos casarões

História preservada nas casas da cidade

O projeto do novo Inventário do Patrimônio Histórico de Lajeado começa a ser executado em breve. O documento vai listar as edificações e monumentos que fazem parte da memória do município e atualizar o material feito em 1992

História preservada nas casas da cidade
O casarão foi construído em 1917 e fica na esquina entre a Júlio de Castilhos e a Marechal Deodoro. Hoje, prédio está restaurado e abriga a Cometa livraria e papelaria, no Centro / Crédito: Bibiana Faleiro
Lajeado

Prédios que resistem ao tempo e se tornam marcos da história. Casarões e estabelecimentos comerciais que, em outra época, simbolizavam o desenvolvimento da cidade. Na parte histórica do Centro de Lajeado, não faltam edificações neste estilo. São prédios como estes que serão catalogados no novo Inventário do Patrimônio Histórico de Lajeado, elaborado pelo município.

Na esquina entre a Júlio de Castilhos e a Borges de Medeiros, há um desses casarões. É o chamado Sobrado das irmãs Jaeger, construído em agosto de 1926, que abrigou a infância das irmãs até os últimos anos de vida delas. Alda, Sonia, Doris e o irmão eram primos de Dagmar Jaeger Scheid, 91. Moradora de Lajeado, ela lembra da entrada da antiga residência onde aprendia piano com a mais velha das irmãs.

Dagmar conta que a edificação foi construída por um primo-irmão do pai, criado pela avó. “A casa foi construída pelo Tio Alfredo e depois ficou para os filhos”, conta. Na época, ela morava na Rua Marechal Deodoro e, além de aprender música, frequentava a residência para brincar com as primas no casarão. No pavimento térreo, também encontrava-se o Banco Pelotense, que encerrou as atividades em 1931.

Hoje, o prédio possui outro proprietário, mas Dagmar acredita que o antigo piano permanece entre as paredes do casarão.

Para preservar

Assim como o sobrado das irmãs Jaeger, outras dezenas de prédios farão parte do Inventário do Patrimônio Histórico de Lajeado. O documento deve listar as edificações e monumentos com valor histórico e cultural do município, com foco na preservação desses bens.

Um projeto similar foi desenvolvido em 1992. Assim, o novo documento deve atualizar a lista, considerando o atual estado dos imóveis, edificações já demolidas e inclusão de novos prédios e monumentos.

Para a execução do projeto, coordenado pela Secretaria de Cultura, Esporte e Lazer (Secel), será firmada uma parceria com a Univates, responsável por executar a tarefa. Assim, é montada uma equipe de professores das áreas da arquitetura e urbanismo e história, a fim de elaborar critérios de seleção para a definição do inventário.

“Vai ser uma das mais importantes entregas que faremos ao município. Temos um débito com a cultura e com a história de Lajeado. O que queremos com o inventário é mudar a cultura da cidade por meio do reconhecimento do patrimônio histórico edificado”, ressalta o secretário da Cultura, Esporte e Lazer, Carlos Reckziegel.

O recurso destinado é de R$ 150 mil e o projeto deve ser executado em oito meses. A proposta, que ainda está em processo de avaliação, foi encaminhada ao Conselho de Cultura pela Secel.

 

Dagmar Jaeger Scheid, 91, era prima das irmãs Jaeger, que moravam na casa de 1926, entre a Júlio e a Borges de Medeiros / Crédito: Bibiana Faleiro

Na educação

Por parte da Univates, Augusto Alves, professor do curso de arquitetura e urbanismo e mestre em Planejamento Urbano e Regional, integra o grupo de arquitetos e historiadores que executam o projeto. Conforme ele, a ideia é criar uma cartilha de educação patrimonial, utilizando os resultados do estudo como referência para atividades em sala de aula e visitas ao centro histórico do município.

O inventário será disponibilizado como um documento público, em formato ainda estudado, e também ficará acessível na Biblioteca Municipal. Alves ainda destaca que a proposta é participativa e com a colaboração da comunidade local para definir os critérios de seleção e identificar novos prédios considerados patrimônios.

“A atualização do inventário tem importância tanto para o conhecimento da realidade local quanto para a educação patrimonial. Além disso, contribuirá para a proteção e preservação desses bens, servindo como instrumento de salvaguarda e estabelecendo diretrizes para a sua conservação”, destaca o professor.

Envolvimento comunitário

A ideia de atualizar o inventário de 1992 foi despertada com o Conselho Municipal de Política Cultural (CMPC), por meio do setorial do Patrimônio Material e Imaterial. “O estopim foi a transferência do Monumento do Imigrante. A partir desse debate, começamos a olhar diferente para o patrimônio de Lajeado”, conta a presidente do CMPC, Ana Cecília Togni. A partir disso, o conselho encaminhou o pedido para a Secel.

A preocupação não era apenas com as edificações da área central, mas também com o restauro de monumentos e prédios de todos os bairros.

Família Feldens

No inventário, também está a Casa de Cultura, a única edificação de Lajeado tombada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado do Rio Grande do Sul (IPHAE), e a Casa da Família Feldens.

Na residência, que mantém a fachada original, ainda vive uma neta do proprietário, Mirna Feldens. Na casa ao lado, vive sua irmã Tânia Feldens e o marido, Xyko Barzotto. Ele conta que as duas são as únicas herdeiras do prédio construído no final da década de 1800, na rua Bento Rosa. Apesar de restaurada, a estrutura permanece a mesma até hoje, incluindo a pintura nas cores branco e azul.

 

Formas de manter o patrimônio

A ideia de que os antigos prédios não colaboram para o avanço da modernidade é posto à prova com empreendimentos como a Cometa Livraria e Papelaria. Há 33 anos, o negócio ocupa um casarão de 1917 na esquina entre a Júlio de Castilhos e a Marechal Deodoro e mantém o local preservado, com troca de telhado e pinturas.

O edifício é propriedade dos donos da livraria e papelaria. O espaço físico é amplo e a localização é favorável aos negócios. Além disso, os empreendedores consideram o afeto pelo local, que também conta sobre a história de Lajeado.


ENTREVISTA

Fernanda Pramio Thomas – Arquiteta e urbanista, titular do Setorial de Patrimônio Histórico, Cultural e Natural

Crédito: Mateus Souza/Arquivo

Qual a importância de um documento como o inventário?
Por meio dele, é possível fundamentar e viabilizar novas concepções de bens culturais, com a valorização e acesso à informação ao patrimônio inventariado. É possível catalogar e registrar as edificações que fazem parte do patrimônio de Lajeado, com fotografias, registro histórico, detalhamento arquitetônico da edificação. A partir disso, é possível elaborar novas propostas de proteção ao patrimônio do município, além de iniciativas para conservação. Este material serve como base para demonstrar o desenvolvimento e história da cidade.

Como você percebe a relação da comunidade com o patrimônio histórico edificado?
Um dos motivos para o meu trabalho de conclusão de curso ter sido na Casa Born, foi justamente por acreditar que a cidade encontrava-se de “costas para o rio Taquari”, que foi fundamental para o desenvolvimento do município. Por isso a importância de mostrar para comunidade o potencial que existe na área. Muitas vezes, o tema do patrimônio significa, para muitas pessoas, “parar no tempo” ou “parar a especulação imobiliária”. Mas a valorização e preservação destes edifícios históricos buscam mostrar como eles podem estar inseridos no contexto urbano atual, passando por melhorias, restauro e abrigando novos usos.

As edificações podem receber novos usos e ocupações”

Existe a ideia de que os “prédios velhos” não colaboram com o progresso. Como mudar essa cultura?
Com a atualização do inventário, teremos a catalogação das edificações remanescentes. Com isso, podemos buscar diretrizes de desenvolvimento para o município, junto com as edificações históricas. Mostrando à população a importância da valorização e preservação das edificações, que podem receber novos usos e ocupações. Além disso, é fundamental que aconteça a educação patrimonial, desde o contexto escolar.

 

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