Escrevi o texto que segue abaixo em 2008, logo após um episódio explicito de racismo ocorrido no estádio Santiago Bernabéu em Madrid. Na época, além de imitarem macacos, ainda estenderam uma faixa onde se podia ler: “Imigrantes e sul americanos, primeiro nos invadem e logo nos matam”.
Portanto os lamentáveis acontecimentos envolvendo o jogador brasileiro Vini Jr. (e outros jogadores negros) na Espanha infelizmente são a repetição e a continuidade de um comportamento intolerável de vem de longa data.
Antumi Toasijé, presidente do Conselho para eliminação da discriminação racial ou étnica integrado ao Ministério da Igualdade foi contundente em sua declaração: “O racismo tem uma longa tradição na Espanha,mas estamos vivendo um momento de retrocesso. (…) A Espanha basicamente inventou o racismo como conhecemos hoje durante as disputas territoriais com os mouros, ao pregar a superioridade das pessoas brancas e cristãs.”
“Os maiores bárbaros da história nos últimos séculos vêm da Europa. Muitos países e tantos povos diferentes talvez expliquem a fúria que de tempos em tempos assola o continente. Apesar disso os europeus sempre se sentiram um degrau acima na escala civilizatória e consideram seus países exemplos de respeito aos direitos humanos bem como de civilidade.
Não é bem a verdade como claramente nos demonstram o colonialismo europeu, as guerras religiosas e a inquisição, a primeira e a segunda guerra mundial e ultimamente as ofensas aos imigrantes. O racismo sempre esteve presente no velho continente. Em algumas épocas melhor disfarçado e em outras escancarado. Um exemplo recente vem de Madrid, estádio Santiago Bernabeu.Os espanhóis, não mais satisfeitos em imitarem macacos estenderam uma faixa onde se podia ler: “Imigrantes e sul americanos, primeiro nos invadem e logo nos matam”.
Para nossa sorte o mundo está mais maduro e tal atitude provavelmente se deva a pobres coitados que projetam suas frustrações em estrangeiros. Xenofobia é o nome disso, mas é como um pequeno tumor, precisa ser logo extirpado para não atingir o corpo todo.
A malfadada frase além de racista e xenofoba é falsa do ponto de vista histórico já que foram os espanhóis os verdadeiros invasores não só da América do Sul, mas de toda América Latina.
Em 1478 o papa Sisto IV atendendo ao pedido dos Reis Católicos espanhóis assinou uma bula fundando a nova inquisição espanhola. É preciso que se diga que eram tempos duros para a Espanha. Recém expulsara os mouros e já se preocupava com a influência judia sobre os rituais católicos. Em um país tão dividido, a religião seria importante como fator de coesão. Certamente não por acaso, a longa lista de arbitrariedades e perseguições, especialmente aos cristãos novos começou por Sevilha, a antiga fronteira entre os muçulmanos e católicos.
Precisaria ainda mais uma década para que Ferdinando e Isabela resolvessem patrocinar a aventura do genovês Cristóvão Colombo. Aquilo que para a Espanha seriam tempos gloriosos, para os latino-americanos seria o começo de uma série de atos bárbaros.
Paralelo a tudo isso, nascia em 1474 em Sevilha aquele que mais tarde seria o frei Bartolomé de las Casas. Seu pai participou da primeira expedição de Colombo e o próprio viria a América na expedição de Oviedo em 1502.Anos mais tarde frei Bartolomé voltaria à Espanha para relatar primeiro aos regentes, os cardeais Cisneros e Adriano, e mais tarde ao novo rei Carlos I os horrores praticados pelos espanhóis no novo mundo.
Ali se pode ler que os espanhóis tinham um método terrível de semear o respeito nas novas terras promovendo matanças, como fizeram em Cholula no México. Tão cruéis eram os conquistadores que faziam apostas sobre quem conseguiria cortar a cabeça de um homem com um só golpe de espada. Outra macabra diversão era arrancar as crianças do colo das mães e matá-las de um só golpe, batendo sua cabeça contra pedras.
Torturar e queimar eram uma burocrática rotina.Não se pode esperar que torcedores de futebol sejam letrados, mas caso tivessem lido o livro do frei, escrito na língua que Carlos I usava para falar com Deus, talvez não colocassem, no século XXI, uma faixa tão infame.”