Foi na tranquilidade de Vila Prass, à época interior de Lajeado, onde Henrique Frederico Krüger iniciou seus primeiros passos na vida pública. De coordenador da Secretaria de Obras local, foi alçado à câmara de vereadores do recém-criado município de Forquetinha. Eleito pela primeira vez em 2000, já soma seis mandatos no Legislativo.
Krüger é um dos exemplos na região de vereadores que exercem mandatos desde a emancipação. Algo comum em cidades de pequeno porte. Todos os casos do Vale são em municípios de população inferior a 7 mil habitantes. Outro fator em comum é que são todos homens, com origens no campo.
Aos 61 anos, Krüger sempre esteve nas fileiras do PP, desde os tempos do antigo PDS. Considera a fidelidade partidária importante nos dias de hoje, onde ocorrem sucessivas trocas de legenda por interesses eleitorais. “Sou da época em que o Cláudio Schumacher e o Erni Petry eram os principais líderes da sigla em Lajeado”, recorda.
Embora tenha recebido convites para concorrer ainda no período em que Forquetinha pertencia a Lajeado, ele só aceitou disputar uma eleição no novo município. Mesmo receoso, acabou eleito com 128 votos. Desde então, sempre esteve pelo menos entre os cinco vereadores mais votados. Em 2020, mesmo em meio à pandemia, obteve sua maior votação: 166 votos. “Foi um período difícil. Era recebido por quem me conhecia bem. Já em outros locais, era mais difícil. As pessoas estavam receosas. Mas consegui me eleger com um bom desempenho”.
Receptividade e permanência
Mesmo com reduto eleitoral em Vila Prass, Krüger tem boa aceitação em praticamente todas as localidades de Forquetinha. Fruto também do período como servidor. “Eu fiquei quase 40 anos em cima de uma patrola. Só parei há dois anos. Era muito conhecido por conta disso na comunidade. As pessoas se lembram do meu trabalho”, recorda.
Durante os mais de 20 anos no Legislativo, Krüger também se licenciou do mandato em quatro oportunidades para atuar no alto escalão do Executivo. Foi secretário de Obras nas gestões de Waldemar Richter e do atual prefeito, Paulo Grunewäld. Na nomeação mais recente, permaneceu por pouco mais de um ano e saiu em 2022.
Embora acredite ter condições para seguir no Legislativo, Krüger entende que chegou a hora de “pendurar as chuteiras”. Ainda que líderes do partido tentem o convencer do contrário, seu desejo é se aposentar da política. “Quero me dedicar à família, passar mais tempo com os netos”.
Busca pelo conhecimento
Aires Daldon é agricultor, morador de Alto Palmas, no interior de Capitão. Tem 62 anos, sendo 32 deles dedicados ao Legislativo. Eleito pela primeira vez em 1992, ano da emancipação do município, participou de todos os processos eleitorais e sempre se saiu vitorioso. São oito mandatos seguidos como vereador, pelo MDB.
O convite para ingressar na política chegou logo após a emancipação. Foi o então presidente da comissão emancipacionista, Eloi Matte quem fez o convite. “Nem sabia o que era política. Num primeiro momento, falei que não seria candidato. Ele voltou na minha casa e me convidou novamente. Eu tinha um envolvimento comunitário e decidi concorrer”, lembra.
Daldon foi eleito com 88 votos, o segundo mais votado do partido. Assumiu a cadeira em 1993 e permanece até hoje. Na última eleição, recebeu 141 votos. Para manter a sequência de vitórias, acredita que o diferencial é a humildade no trabalho e a confiança conquistada pelos moradores. “Desde que me elegi pela primeira vez, até hoje faço visitas constantes nas comunidades. Ouço as demandas de cada um e analiso projetos sem olhar partido ou ideologias”, destaca.
Nestes mais de 30 anos no Legislativo, Daldon foi presidente em 1996 e 2020. Tornou-se figura conhecida dentro do partido e com isso conseguiu avançar bastante na busca por recursos junto aos deputados e na capacitação. “A cada ano, preciso me atualizar. As leis mudam toda hora e novas tecnologias surgem para auxiliar no trabalho”.
No ano que vem, Daldon quer buscar a nona eleição consecutiva, mas antes de tomar a decisão vai ouvir as lideranças do partido e avaliar o cenário municipal. “Temos novas lideranças que pedem espaço. A renovação é necessária, mas se o partido e meus simpatizantes entenderem que devo concorrer, meu nome estará à disposição mais uma vez”.
Atenção integral
O caso de Marino Bozzetti se difere um pouco dos demais vereadores citados na reportagem. Eleito vereador na primeira eleição municipal, em 1988, ele chegou a concorrer a vice-prefeito em determinado momento da trajetória política, mas acabou derrotado. Porém, em todos os pleitos ao parlamento, se saiu vitorioso.
Mais votado na primeira disputa, Bozzetti atribui o sucesso ao trabalho incansável e à simplicidade “O mandato de vereador não é uma coisa só do último ano. Eu procuro dar atenção às demandas da população nos quatro anos. Seja na busca por recursos, emendas, em acompanhar projetos ou cobrar da administração. E conta muito não ser diferente. Ser sempre a mesma pessoa ”, frisa.
Outro fato que Bozzetti entende ser fundamental nas suas eleições é o bom desempenho em Xaxim – onde reside –, uma das localidades mais populosas do interior. “Eu sempre arranco com uma boa votação por lá. Mas faço votos em todo o município. E tenho eleitores que votam em mim desde 1988”.
Para o futuro, o parlamentar, perto de fazer 70 anos, ainda mantém mistério. Já havia pensado em parar no último pleito, mas acabou se candidatando e foi o mais votado no município. “Ainda não discuti isso. É algo que será decidido só em 2024”.
ENTREVISTA – Fredi Camargo • cientista político
“Se o detentor do cargo público não corresponde, a sociedade troca”
A Hora: É comum, nos pequenos municípios, vereadores se reelegerem para sucessivos mandatos. Isso indica que são bem avaliados pela comunidade ou ocorre pela dificuldade de renovação?
Fredi Camargo: Podemos dizer que os dois fatores podem causar essa situação. Primeiro, muitos políticos, principalmente em pequenos municípios, têm ligação direta com a história do local e vêm de uma representatividade social familiar grande, se apegando ao cargo e não dando muita brecha para a entrada de novas lideranças.
Nesses casos, há uma permanência no poder pela fidelidade dos eleitores para com os nomes e com as famílias. Mas também é explicada porque os vereadores atenderam bem aos anseios das comunidades. Por mais que não tenhamos muito espaço para renovação política, se o detentor do cargo público não corresponde, a sociedade troca.
AH: O excesso de mandatos legislativos é um alvo frequente de críticas. Essa “eternização” contribui para uma visão negativa da sociedade frente aos vereadores?
Camargo: Em termos gerais, a política é “criminalizada”, e isso cobra um preço. O problema disso é o efeito colateral de não encorajar novos atores e pessoas realmente engajadas no desenvolvimento comunitário a entrar na política. Mas com as redes sociais temos visto mudanças. Muitos tiveram possibilidade de manifestação social por esse canal de comunicação comunitário e isso fez com que surgissem novos atores na política, complicando inclusive a vida de velhos políticos que ainda não entenderam as novas ferramentas de comunicação com a população e perdem terreno.
AH: Limitar o número de mandatos legislativos seria uma saída para minimizar essa descrença com a política?
Camargo: É uma saída muito simplória que tem duas consequências a serem refletidas: se o mandato do vereador estiver dando bons resultados, é justo perdermos essa representatividade? Segundo, se eu limitar o vereador mas esse colocar o filho, a mulher ou o irmão a concorrerem, estarei realmente limitando seu poder? Vemos inúmeros casos históricos dessa perpetuação familiar paternalista e até mesmo coronelista na política brasileira. Saídas mais democráticas, com possibilidade de realmente mostrar capacidade de representatividade, ao meu ver seriam melhores.