Os “por quês?” que não se calam

Opinião

Rosane Cardoso

Rosane Cardoso

Professora de literatura

Os “por quês?” que não se calam

Alguém já disse que as perguntas são mais significativas do que as respostas. Perguntas nascem da curiosidade, da dúvida e até do medo. Perguntas pressupõem criatividade, razão por que, às vezes, incomodam.

A pergunta, em se tratando de literatura infantil, é especialmente importante. Por essa razão, já vai longe o tempo dos livros com moral da história, mensagens óbvias e linguagem edulcorada. Crianças são exigentes. E gostam de descobrir…

A atual literatura infantil é desafiadora e nem sempre traz resoluções explícitas ou respostas únicas. A chave pode estar nas veleidades de uma trama complexa ou num verso que continua sussurrando na cabeça do leitor, mesmo quando se torna adulto, pois um livro a ser experenciado por meninos e meninas precisa ultrapassar, na memória, o tempo da infância, fazendo-os voltar, de vez em quando, para aquele texto que nos encantou, décadas atrás.

Por isso, é muito bom ver que novos escritos para a infância estão surgindo em nosso meio e que ultrapassam o imediatismo. Morgana Domênica Hattge lançou, recentemente, Por quê?, livro belamente ilustrado por Oscar Reinstein. Educadora apaixonada por literatura, Morgana enveredou pela escrita e já está em sua segunda criação. A primeira, Maria na janela (2022), ilustrado por João Alfredo Caberlon, também revela o encanto que a autora sente pela curiosidade das crianças.

Por quê?, Editora Arterinha/Appris, 2023.

Bernardo, o protagonista de Por quê?, é um garoto que pergunta incessantemente e, quando encontra as respostas, em livros, internet ou professores, volta com outras perguntas. O processo, no entanto, se interrompe, na medida que se torna adulto. O homem esquece o menino e não questiona mais. Sua missão no mundo, agora, é seguir a suposta ordem da vida: trabalhar, estudar, progredir, ter coisas.

Por sorte, a existência humana é plena de infância. Bernardo, em dado momento, encontra o seu Oráculo de Delfos e, possivelmente, o nosso espelho como adultos. Se, por um lado, Por quê? é um livro dirigido a crianças, ele também incita-nos a revisitar o passado e a inquirir sobre por que (e quando) paramos de “curiosear” e de mexer em caixas secretas.

Mas, para além das reflexões que provoca, a nova obra de Morgana Hattge é pura leveza e, inclusive, rende boas risadas. Nas páginas finais, encontramos o alarido de um delicioso recreio, formado pelas perguntas feitas por crianças inteligentes e curiosas. “Por onde andará a minha meninice? ” questiona a nossa voz interior. Para saber, pode-se perguntar ao pequeno Martin que, na sabedoria dos seus 3 anos de idade, tem uma resposta na ponta da língua: Sabe por que eu sei? É que eu penso em tudo.

Acompanhe
nossas
redes sociais