A perda do poder de compra, atrelada à alta de juros e escassez de componentes na indústria automotiva travam a venda de carros novos. Com isso, a média de idade da frota em circulação registra envelhecimento nos últimos anos. O cenário não é diferente na região, onde os números superam inclusive a tendência estadual e nacional.
Conforme informações da Secretaria Nacional de Trânsito (Senatran), a idade média da frota de 305,1 mil veículos no Vale do Taquari chega a 18,8 anos. Similar ao registrado no RS, onde esse número aumentou de 14, em 2011, para 18,2 anos ao fim de 2022. Já no país, o indicador alcança 10,3 anos, o maior em quase três décadas.
Esses dados se referem aos automóveis, comerciais leves, caminhões e ônibus. De acordo com estatísticas do setor, em quase uma década, o envelhecimento elevou-se em 1 ano e 10 meses, ao considerar o cenário no Brasil, e em mais de 4 anos, em relação ao RS.
Com o envelhecimento da frota, aumenta a preocupação sobre a segurança e emissão de poluentes. Desde 2014 são itens obrigatórios o ABS e airbag, dispositivos que contribuem para uma condução mais segura e reduzem danos ao motorista e passageiros em caso de acidentes. Ao mesmo tempo, a cada ano as montadoras inovam com motores mais econômicos e eficientes no aspecto ambiental.
Em relação aos impactos econômicos, o governo federal iniciou estudos para incentivar a redução de preços e incentivo ao consumo. Uma das propostas é poder usar parte do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) para a compra do veículo zero-quilômetro.
Poluição e risco de acidentes
De acordo com o coordenador do curso técnico em Manutenção Automotiva da Univates, Edson Antenor Scheuermann, os carros mais novos apresentam importantes evoluções nos sistemas. Por conta disso, enfatiza alguns dos impactos se não houver devida atenção sobre os carros em circulação.
“No caso do ABS, contribui muito na frenagem mais segura, e o airbag evita lesões mais graves, além de salvar vidas”, observa Scheuermann. O professor com experiência na área automotiva há quase 40 anos, atenta ainda para a importância da revisão veicular para reduzir o impacto ambiental.
Sem a manutenção em dia, há também maior risco de pane e, por consequência, acidentes e até mesmo obstrução do fluxo nas estradas.
“O motorista precisa conhecer seu automóvel, ficar atento ao painel e fazer as revisões de acordo com o plano de revisões do fabricante”, recomenda Scheuermann. Outro fator indicado é a qualificação dos profissionais. Com equipamentos mais modernos, o nível de exigência é maior. “Há muitas ferramentas que qualificam o diagnóstico, mas o mecânico precisa saber interpretar esses dados e aplicar a melhor solução”, reitera o professor.

Professor e técnico em Manutenção Automotiva, Scheuermann alerta aos riscos da falta de manutenção nos automóveis. Crédito: Arquivo/A Hora
Impactos na cadeia produtiva
Na avaliação do vice-presidente do Sindicato dos Concessionários e Distribuidores de Veículos no RS (Sincodiv), Rogério Wink, a não renovação da frota ocorre nos últimos anos pelo impacto da pandemia na cadeia produtiva, entre elas, a falta global de componentes. Essa situação ainda traz consequência e as montadoras voltam a suspender a produção.
“Quando falta um item, a linha para. Além disso, no momento o custo alto dos financiamentos e incertezas políticas na economia diminuem o poder de compra de frotistas e população em geral, isso também impacta na velocidade da renovação da frota”, pontua.
Ainda de acordo com Wink, uma política de renovação de frota, no médio prazo, poderá reverter o cenário. “A criação de um fundo de recompra, que retire de circulação veículos mais antigos é uma boa ideia.
Além do aspecto da segurança e qualidade ambiental, contribui no setor responsável por grande parcela do PIB industrial brasileiro.”
Wink indica ainda os riscos ao manter a taxa de juros a dois dígitos. “Nenhuma atividade suporta por muito tempo conviver com taxas de juros estratosféricas como as praticadas no atual momento.”
Taxa de juros freia renovação
A alta taxa de juros é um dos principais motivos para empresários reverem a renovação da frota. De acordo com o empresário Leonicio Schussler, o ritmo para a troca de veículos diminuiu e está na espera por reações do mercado.
“Temos cerca de 350 caminhões, sendo a idade média de 5 anos de uso. Por enquanto vamos manter nosso trabalho com o que temos”, observa. Segundo ele, as incertezas com a troca de governo deixam o mercado mais retraído e com o juros acima de 13% há pouca motivação por investimentos.
Alta nos preços
Assim como houve a valorização dos automóveis de passeio, os veículos de carga subiram de preço. Além das escassez de componentes que acirrou o mercado, a mudança na tecnologia dos motores para o sistema Euro 6 também refletem nos custos.
De acordo com o vice-presidente do Sindicato das Empresas de Transportes de Carga e Logística no RS (Setcergs), Diego Tomasi, essa alta chega a 30%. “As novas tecnologias dos caminhões representam economia de combustível e maior segurança nas operações. Contudo, diversos fatores comprometem a atualização nas transportadoras.”

Evolução dos veículos exige capacitação dos profissionais do segmento de reparação mecânica. Crédito: Arquivo
Produção limitada
De janeiro a março foram produzidos 538 mil veículos, apenas 8% a mais que no início do ano passado, quando a crise dos semicondutores estava no auge. Para modelos pesados, houve redução de cerca de 30% no volume de produção. Os dados são da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea).
Segundo o presidente da Anfavea, Márcio de Lima Leite, oito fabricantes paralisaram as fábricas nos três primeiros meses do ano. Além da dificuldade de componentes, agora, há outro fator, como é o caso da menor demanda. Segundo ele, o cenário somente não é pior por conta das vendas para locadoras, que em março representaram 28% do total.
Tipo de combustível
Relatório do Sindicato Nacional da Indústria de Componentes para Veículos Automotores (Sindipeças) mostra que os veículos flex representavam 72,7% da frota circulante no país em 2021, enquanto os veículos a gasolina seguiram reduzindo sua participação: de 17,4% em 2020 para 15,6% em 2021. A participação daqueles movidos a diesel se manteve estável, ligeiramente acima de 11%.
No caso dos veículos híbridos ou elétricos, embora a quantidade ainda seja irrisória, registraram-se 65,3 mil unidades em 2021, com participação de 0,1% em relação à frota total. Os lançamentos, as importações a cada ano e a decisão de várias montadoras de interromper a produção de veículos a combustão até 2035 devem elevar a presença desses veículos na frota.