Mulheres que (se) leem

Opinião

Rosane Cardoso

Rosane Cardoso

Professora de literatura

Mulheres que (se) leem

Durante séculos, a leitura foi negada às mulheres, assim como o direito de escrever. O crivo familiar temia que ler e escrever pudesse fazer mocinhas inocentes desviarem-se do caminho da virtude. Recentemente, o escritor Stefan Bollmann dedicou-se a pensar sobre o assunto em Mulheres que escrevem vivem perigosamente, de 2013, e Mulheres que leem são perigosas, de 2016.

No primeiro, o autor transita pela história de grandes escritoras e constata a necessidade existencial de escrever. A escrita, dessa perspectiva, vem a ser uma condição “sine qua non” (sem a/o qual não pode ser) de estar no mundo. No segundo livro, Bollmann faz uso de fotografias, pinturas e outras formas de arte para mostrar como tem sido vista a relação entre mulheres e leitura ao longo dos tempos.

O fato é que, apesar das restrições, as mulheres nunca deixaram de se perder de amores por livros e pela escrita. De Safo a Conceição Evaristo, de Mary Shelley a Bell Puã, de nobres a paupérrimas, ler e escrever foram ações femininas que se sobrepuseram ao patriarcalismo. Mas, talvez melhor do que isso, tem sido a (re)união de leitoras e escritoras. Nos séculos XVII e XVIII, mulheres como a Condessa d’Aulnoy e Jeanne-Marie Leprince de Beaumont, escreviam e sussuravam ideias sobre literatura, nos ricos salões franceses.

Mas não precisamos ir tão longe. A autoria feminina se fortalece, em conjunto, no Brasil atual. O projeto Mulheres que escrevem medium.com/mulheres-que-escrevem promove, desde 2015, encontros para discutir a representatividade feminina no âmbito da produção escrita. Além disso, realiza curadoria, divulga e edita material produzido por mulheres

Já o Projeto Leia Mulheres (leiamulheres.com.br), sediado em São Paulo, é composto por grupos de leitoras em mais de 100 cidades do país e faz parceria com editoras, livrarias e centros culturais. A proposta inspirou-se no #readwomen2014, de Joanna Walsh, e tem, atualmente, cerca de 400 mediadoras.

Em Santa Cruz do Sul, aqui pertinho de nós, também encontramos um Leia Mulheres (@leia_mulheres_scs). Luana, Ana Luiza e Rosiana – as três Anas, como são chamadas – encontram-se mensalmente, aos sábados, e, à parte de estudos, família, trabalho e outras atividades, desfrutam de um tempo em que ler e conversar sobre livros é a tônica.

Ultrapassando, no momento, a 35ª leitura, elas se preparam para discutir, em março, A fúria, de Silvina Ocampo. Entre as autoras lidas, destacam-se Annie Ernaux, Livia Garcia-Roza, Adriana Lomar e Lygia Fagundes Telles. A atividade, no entanto, não para aí e avança para divulgação de leitura e participações na comunidade (vide Instagram).

Em Lajeado, temos uma iniciativa nesse sentido. Ainda que não esteja vinculado ao Leia Mulheres, o Macabeas, idealizado por Laura Peixoto e Meire Brod, é um grupo que se encontra, desde outubro de 2022, na última terça-feira de cada mês. A proposta das participantes é compartilhar leituras, escritas e vozes que (se) leem, se escutam e dão continuidade ao desejo que surgiu quando, pela primeira vez, uma mulher pôs os olhos sobre um texto e descobriu um mundo a ser decifrado.

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