Para não deixar o samba morrer

CARNAVAL

Para não deixar o samba morrer

Sem depender de recursos dos municípios para festejar, escolas encontram em eventos, leis de incentivo e gincanas, um modelo sustentável para manter a tradição

Para não deixar o samba morrer
Neste ano, a escola Inhandava, de Bom Retiro do Sul, homenageia as mulheres que fizeram história na cidade. Crédito: Júlia Amaral

Plumas coloridas, lantejoulas e tecidos brilhantes compõem as fantasias dos foliões. Desde as vestimentas aos carros alegóricos que descem as ruas da cidade, o carnaval é feito pelas mãos de voluntários. Mas é preciso investimento para que o evento atraia os curiosos moradores. Mais do que uma festa para promover o turismo nos municípios, os desfiles trazem às avenidas, a cultura, por meio dos figurinos, das danças e do tradicional samba-enredo.

Em Bom Retiro do Sul, o tema da escola de samba Inhandava neste ano resgata histórias de mulheres que passaram pelo município, em áreas como saúde, educação e esportes. Mais do que uma homenagem, a escolha também busca servir de crítica e exemplo para que o empoderamento feminino seja um tema prioritário da cidade.

Na comissão de frente da escola está o presidente Bruno Petry. Fundada pelos pais dele, Leny e Airton Petry, há 40 anos, a Inhandava conta, hoje, com cerca de 200 pessoas. Com oito alas, a escola desfilou na noite de sexta-feira pela rua Jorge Fett, ao lado também do Bloco dos Palhaços, de Lajeado, e das escolas Renascer do Samba, de Estrela, e Moleque Atrevido, de Encantado, que desfilam juntas, devido a falta de integrantes em cada uma.

Para manter uma escola viva

De acordo com Bruno, esta é uma das situações que as escolas enfrentam, hoje, além da diminuição de recursos recebidos pelas prefeituras. Apesar disso, acredita que o carnaval não deva depender do município.

Na Inhandava, uma tradicional gincana auxilia na arrecadação financeira, assim como patrocínio de empresas. Há cerca de cinco anos, R$ 15 mil eram destinados ao carnaval da cidade. Hoje, são pouco menos de R$ 4 mil. Mas o poder público ainda é responsável por organizar as ruas para a passagem das escolas, montar palco e garantir a segurança.

Em contrapartida, a escola não cobra cachê. Com os municípios onde os foliões da Inhandava também desfilam, é a mesma coisa. As prefeituras pagam apenas o transporte e um lanche aos músicos e dançarinos.

Esta é a primeira edição do carnaval de Estrela, que passa pela Rua Arnaldo J. Diehl. /Com exemplo do pai, Adriana segue na tradição do carnaval e, hoje, é presidente da escola Renascer do Samba, de Estrela. Crédito: Bibiana Faleiro

Bruno diz que, na pandemia, as leis de incentivo à cultura auxiliaram a escola a manter as atividades. “A gente criou um projeto e nos inserimos nas comunidades, com aulas de bateria e dança. Um dos nossos diretores é historiador e dava aulas em contexto histórico carnavalesco. Em troca disso, entramos para a lei”, comenta.

Ele destaca que é preciso dedicação para que o carnaval atraia espectadores. “Se a gente não tiver um carro alegórico, não vai ter gente vindo assistir. Pra gente poder movimentar o carnaval, tem que investir nele”, observa.

Tradição de 40 anos

“É impossível fazer um carnaval esperando só recurso da prefeitura. Não é viável”, enfatiza o produtor da Associação Esportiva e Cultural Fiel Tribo Guarani, Moacir Eisermann, de Venâncio Aires. Para ele, o segredo para tornar a festa sustentável é ter bons parceiros e patrocinadores, além de escolher um tema que envolva a comunidade.

Neste ano, a Fiel Tribo Guarani vai homenagear os “10 anos Caravana Luzes de Natal”, evento que ocorre em dezembro e envolve mais de 150 pessoas e 10 carros iluminados. Os mesmos veículos serão utilizados no desfile pela Osvaldo Aranha, o que representa economia na produção. Da média de R$ 45 mil necessários para efetivar o desfile, cerca de 40% são recursos do governo municipal.

Mais de 800 pessoas se envolvem na produção da festa. Só na Fiel Tribo são 130. “A gente tem certeza que nas duas noites vão ter de 30 a 40 mil pessoas na rua. Por mais que a pessoa fala que não gosta, quando chegamos na avenida ela está lotada”, brinca o produtor. Já Valdir Antonio Ferreira nunca escondeu o gosto pel festa. Desde os três anos, participa das escolas de samba e, em 2023, completa 10 anos como Rei Momo de Venâncio Aires, além de ser presidente da Liga do Carnaval da cidade.

“É uma festa importante para todo mundo. Hoje o carnaval é saúde, porque é alegria. As pessoas vêm participar já na expectativa de ter uma alegria a mais na sua vida”, ressalta. Para Ferreira, a comunidade tem sido participativa e é a grande responsável por manter a folia viva até hoje.  O carnaval em Venâncio Aires faz parte do calendário de eventos há mais de quatro décadas. Hoje, o município conta com cinco escolas de samba. Antes disso, algumas eram blocos. Para fazer a transição, é preciso ter cinco alas, dois carros, ter comissão de frente, bateria, mestre-sala e porta-bandeira e estandarte, além de mais de 100 pessoas.

Berço de família

Em 2019, o Bloco Renascer do Samba, de Estrela, se tornou escola de samba. À frente do grupo, está Adriana da Silva Vidal, que tem no gosto pela folia, um exemplo de família, assim como grande parte dos carnavalescos.

Na noite deste sábado, 18, Adriana desfila pela Renascer como passista, ao lado dos três filhos. Esta é a primeira edição do carnaval no município, que conta com a participação das escolas Inhandava, de Bom Retiro do Sul, e Moleque Atrevido, de Encantado. A presidente conta que a preparação para a festa começa meses antes, com arrecadação de recursos. Apesar do auxílio do município, a busca por patrocínio é importante para manter a escola aberta.

Para esse ano, a Renascer também quer promover oficinas culturais. “Não dá para ficar sentado esperando que o poder público nos alcance. Temos que mostrar trabalho e, graças a Deus, temos pessoas que simpatizam com nossa causa”, ressalta a presidente.  O grupo vai às ruas com 100 pessoas que dão voz e figurino ao tema “Vaso ruim não quebra”, que fala da resistência do povo em não deixar o carnaval morrer.

A Corte de Venâncio Aires é formada pela Princesa Luana Henckes (e), Rei momo Valdir Ferreira, Rainha Sandriele Soares e princesa Mayara de Oliveira. Crédito: Divulgação

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