Recuperação tímida do PIB gaúcho evidencia dependência do agro

ECONOMIA

Recuperação tímida do PIB gaúcho evidencia dependência do agro

Seca da safra passada ainda interfere sobre resultado da economia gaúcha. De janeiro a setembro deste ano, Produto Interno Bruto gaúcho caiu 6,6% enquanto o brasileiro cresceu 3,2%. Pelo trimestre mais recente, Estado contabiliza primeiro resultado positivo, com avanço de 1,3%

Recuperação tímida do PIB gaúcho evidencia dependência do agro
Seca da safra passada provocou queda no PIB. Indústria e serviços tiveram resultado positivo, mas insuficiente para equilibrar a balança. Crédito: Gabriel Santos
Estado

O terceiro trimestre do ano (julho, agosto e setembro) costuma ter menos influência do setor primário, pois a safra de soja já foi negociada. Essa tendência fica clara quando se avalia os resultados do Produto Interno Bruto (PIB).

A apresentação dos indicadores ocorreu na manhã de ontem, pelo Departamento de Economia e Estatística, ligado à Secretaria Estadual de Planejamento (Seplag). No período em questão, houve um crescimento de 1,3%. Esse é o primeiro resultado positivo da economia gaúcha no ano. No primeiro trimestre, houve uma retração de -4,9%. De abril a junho, nova queda, de -2,7%.

No acumulado do ano, de janeiro a setembro de 2022, o PIB do Estado foi de -6,6%, enquanto no Brasil a alta é de 3,2%. “Após a passagem dos principais efeitos da estiagem sobre a agropecuária, a economia gaúcha voltou a crescer no terceiro trimestre do ano, impulsionada pelos desempenhos positivos da indústria e dos serviços”, ressalta o chefe da Divisão de Análise Econômica do DEE. o economista Martinho Lazzari.

No acumulado de três trimestres, a queda de 6,6% no PIB do RS em relação ao mesmo período de 2021 é explicada, especialmente, pela baixa na Agropecuária (-50,5%). Indústria (+3,1%) e Serviços (+3,2%) registraram altas entre janeiro e setembro. Na taxa acumulada dos últimos quatro trimestres, a economia do Estado teve variação negativa de 4,2%, enquanto no país a alta foi de 3,0%.

“Não somos produtores de grãos, mas precisamos à indústria”

A economista e professora, doutora em Desenvolvimento Regional, Cintia Agostini, analisa os dados a partir do impacto para o Vale do Taquari. “Não somos produtores de grãos, mas precisamos à indústria. Nossa cadeia produtiva de carnes e leite demanda muito de milho e farelo de soja.” Com a seca do fim do ano passado e início de 2022, a quebra na produção trouxe como resultado crescimento do PIB brasileiro e queda do gaúcho.

“Tivemos de comprar de outros estados e do exterior. Isso tornou a produção das agroindústrias muito cara. Por isso vemos empresas admitindo prejuízos.” De acordo com ela, o Vale sofre em dois momentos, de forma direta e indireta. “Primeiro pois a seca reduz a produtividade dos nossos agricultores. Depois, torna os insumos mais caros e escassos.”

O cenário internacional também interfere, afirma Cintia. “Os preços das commodities mais do que dobraram. Começou pelo impacto da pandemia e agora temos resquícios da guerra na Ucrânia. Há todo um cenário negativo à produção primária e agroindustrial.”
Pelos prognósticos da meteorologia apontam para mais regularidade nas chuvas a partir de janeiro. Por essa tendência, há menos risco de um novo ciclo de estiagem. Essa situação, pode amenizar os efeitos à produção primária gaúcha, realça a economista.

Cadeia primária além dos grãos

Consultor, analista de mercado e economista, Fernando Röhsig destaca a amplitude do agro. “Não é só grãos. Estamos falando de equipamentos, de fertilizantes, defensivos agrícolas, carnes. Toda uma cadeia complexa.”

Essa conjunção de atividades representa 44% do PIB gaúcho. “Se olharmos só os grãos. A soja e o milho, esse percentual cai pela metade, fica em torno dos 12%”. Esses números, frisa Röhsig, são duas vezes mais do que o conjunto nacional, por isso, episódios de seca tem um impacto tão grande sobre a economia gaúcha. No acumulado do ano, a agropecuária do RS reduziu 50,5% a participação no Produto Interno Bruto. Já em termos nacionais, ficou em -1,5%.

PIB do Vale gira em R$ 15 bilhões

Pelos cálculos de Röhsig, a participação do Vale no PIB gaúcho gira em torno dos R$ 15 bilhões. Significa em torno de 2,5% de tudo que é produzido no RS. Pelo dado mais recente em termos de recursos gerados, conforme apuração de 2021, a produção gaúcha foi de R$ 582,9 bilhões.

“Aquele foi um ano muito positivo. O nosso estado cresceu mais do que a média brasileira. Algo que esse ano tende a não se repetir.”
Neste quadro, o consultor ressalta a dinâmica regional. “O Vale do Taquari costuma ter desempenho mais equilibrado. Não sofremos grandes tombos e nem temos grandes avanços.”

Essa característica, frisa, se sustenta na diversidade produtiva. Para além da cadeia agrícola, há um setor de serviços disseminado, inclusive com trabalhos para outras localidades. “Atendemos a Região Metropolitana em diversos segmentos. Também temos indústrias que vendem ao exterior. Tudo isso faz com que exista menos oscilações na economia regional.”


Entrevista – Martinho Lazzari • chefe da Divisão de Análise Econômica do DEE

“Os últimos dois anos foram de uma sequência de dificuldades”

A Hora – O que a análise sobre nove meses deste ano indica sobre a economia gaúcha em 2022?

Martinho Lazzari – Embora não tenhamos o ano fechado, há um quadro quase completo do desempenho da nossa economia. Há uma característica marcante e que determina o resultado. Trata-se da seca. Tivemos produtos agrícolas, em especial a soja, muito atingida.

A quebra na lavoura determina a evolução das atividades produtivas como um todo. Ao verificarmos o acumulado, com queda de 50%, há um efeito negativo sobre todo o PIB.

De outro lado, desempenhos muito satisfatórios da indústria e dos serviços. Inclusive com crescimento acima do país. Apesar disso, os setores não conseguem contrabalancear as perdas do setor primário, muito pela agropecuária ser um setor muito grande e que puxa tudo para taxas negativas.

Como é possível fazer com que o RS seja menos dependente do segmento agropecuário?

Lazzari – Os últimos dois anos foi de uma sequência de dificuldades. A pandemia, depois a guerra. Tudo fez com que as commodities aumentassem muito. É uma elevação geral e com mais ênfase sobre os insumos agrícolas. Milho e soja duplicaram de preço. Esse é um fator muito relevante para o Estado e também para o Vale do Taquari.

Essa é uma característica do sistema econômico mais integrado. Não é uma decisão dos governos que vai mudar os preços. Tudo é regulado pelo mercado internacional. Escapa do controle das gestões. Há pouco o que fazer. Por parte do Estado, ele precisa agir como um indutor do desenvolvimento. Com ações pontuais para fortalecer setores mais atingidos. É uma visão particular, mas o governo tem de garantir infraestrutura, qualidade de mão de obra e políticas de fortalecimento pontuais.

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