Neste período de transições nos governos, tanto federal quanto estadual, grupos de interesse representando os mais diversos setores se articulam para ocupar espaços, definir narrativas e defender suas causas. É o lobby, aquela atividade vista, em geral, com desconfiança e que é realizada de forma pouco transparente, com o objetivo de influenciar decisões.
Nos bastidores do poder, em Brasília e Porto Alegre, estão em curso inúmeras combinações de nomes para a composição dos cargos em cada escalão de governo. Quanto mais ampla a frente formada para a eleição, mais complexo o quebra-cabeça – uma das razões pelas quais o número de integrantes das equipes de transição não para de crescer. Difícil imaginar quantas reuniões, listas, afazeres, projetos, remunerações, viagens e quanto café tem sido bebido nos gabinetes, na busca de um consenso para a escolha das pessoas que deverão ocupar os cargos políticos e de confiança abertos Brasil afora.
No nosso país, a atividade de lobista não é regulamentada (há um projeto de lei em discussão). Mas o livro “O Lobista – Fernando Ernesto Corrêa: negócios, política e jornalismo”, de autoria de Márcio Pinheiro (Porto Alegre, 2021), traz, entre outros temas, uma abordagem interessante: os oito mandamentos que o lobista precisa seguir para atingir seus objetivos.
A lista foi elaborada por Fernando Ernesto, que citou os itens que considerava importantes para o exercício da função. Na concepção dele, a atividade de defender interesses de um setor ou entidade não tem em si nada de suspeito ou desonesto. Eis os mandamentos, de forma resumida e adaptada:
1. O pleito que o lobista está fazendo deve ser legal e legítimo. Significa que só se pode pedir por algo que se tenha uma excelente justificativa.
2. O lobista deve estar bem preparado para a sua atividade. Para defender uma causa, é preciso ter profundo conhecimento. O tema deve ser muito estudado e dominado pelo lobista. A preparação envolve estar preparado para qualquer contra-argumentação.
3. Ter paciência. É fundamental ouvir quem está do lado oposto, entender o ponto de vista e atuar na busca de um ponto de convergência que permita utilizar esse viés a favor do objetivo buscado pelo lobista.
4. Humildade. Saber esperar em salas dos gabinetes sem reclamar. São muitas pessoas envolvidas até se chegar numa audiência com a pessoa certa. Antes disso, há horas e mais horas de espera por secretários(as), assessores de segundo escalão e etc.
5. Exclusividade. O lobista e sua equipe devem ser especialistas e não generalistas. Por dominar completamente o tema em causa, precisam estar focados no assunto em pauta.
6. Estabelecer e manter relações saudáveis com as pessoas certas nos diferentes escalões do poder.
7. Falar outro idioma, como inglês ou espanhol, é uma vantagem para as falas em reuniões de foro internacional. Línguas como o alemão e o chinês são bem-vindas.
8. Ter um bom fígado – o que significa ter disponibilidade para participar de eventos com boa comida e bebida em ambientes especiais e agradáveis. Exclusividade, requinte e elegância são importantes requisitos.
Se pensarmos no aspecto político, a defesa (ou pressão) para a escolha de um nome para ocupar determinado cargo equivale em partes à defesa de uma posição para influenciar uma política de governo para um determinado grupo. São pessoas ou grupos buscando entrar ou se manter no jogo do poder.
Isso requer sabedoria, planejamento e recursos para que se consiga atingir os objetivos. Colocar as pessoas desejadas no lugar certo pode ser o resultado de anos de trabalho. A construção de pontes entre o mundo corporativo e o mundo público é trabalho do lobista, seja no Brasil, em Nova Iorque ou Xangai. Nos cabe torcer para que, pelo menos, o mandamento 1 esteja sendo seguido e as causas – e nomes – em discussão nos gabinetes país afora sejam legais e legítimas.