Sem acesso a recursos, partidos  buscam estratégias para sobreviver

CLÁUSULA DE BARREIRA

Sem acesso a recursos, partidos buscam estratégias para sobreviver

Das 28 legendas e federações existentes, 16 não alcançaram desempenho mínimo na eleição à Câmara dos Deputados para receber verba do fundo partidário e ficam sem tempo de rádio e TV até 2026. No Vale, pelo menos três siglas que têm representação regional são afetadas com a medida

Sem acesso a recursos, partidos  buscam estratégias para sobreviver
Desempenho na corrida à Câmara influencia na distribuição de recursos. Crédito: Wesley Amaral
Brasil

O Brasil conta com 28 partidos políticos e federações legalmente constituídas. Mas nem metade terá acesso aos recursos do fundo partidário. Também ficarão de fora da propaganda gratuita de rádio e televisão nas próximas eleições. Isso ocorre devido à regra da cláusula de barreira, que coloca em xeque a existência de dezenas de siglas, inclusive algumas com representação no Vale do Taquari.

A cláusula foi fixada em 2017, por meio de emenda constitucional aprovada no Congresso. Cinco anos depois, deve provocar movimentos para a sobrevivência dos partidos “nanicos”. Algumas discussões já estão em andamento, como é o caso da união entre Solidariedade e o Pros, que, juntos, superariam a barreira de desempenho.

Entre as legendas afetadas pela nova regra na região está o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), que elegeu somente um deputado federal em todo o país. Com mais de 30 vereadores e um prefeito, mas com recursos escassos a partir do ano que vem, a sigla deve enfrentar uma debandada em 2024, devido a eleição municipal.

A medida também traz à tona a discussão sobre o excesso de agremiações políticas no país e o fisiologismo. Por vezes, candidatos se filiam a uma sigla por interesses nem sempre condizentes com o campo ideológico da mesma. Depois, quando há uma oportunidade, mudam de partido.

Fortalecimento

Na avaliação do advogado Fábio Gisch, especialista em direito eleitoral, a cláusula de barreira surge como um movimento positivo para a diminuição no número de partidos. Mas alerta também para o esvaziamento daqueles mais voltados ao centro, devido à crescente polarização entre dois espectros ideológicos.

“O Brasil caminha para uma tendência, onde se fortalecem os campos da direita e da esquerda e enfraquece o centrão. Os partidos que, historicamente ficam nesse espectro, terão que se posicionar mais para um lado ou outro. O resultado das urnas mostrou isso. Mas não significa que teremos só dois partidos. Nem seria bom”, comenta.

Gisch não acredita em fusões de partidos maiores com siglas nanicas, e vê como natural uma migração de políticos às legendas com mais recursos. “O que um partido forte ganha em se unir a um que não atingiu a cláusula? As pessoas que tem interesse em se filiar vão procurar um partido com fundo e dinheiro”.

Reorganização

Tradicional sigla no RS e também no país, o PTB chegou a eleger 38 deputados federais em 1990. Três décadas depois, só emplacou um nome à Câmara Federal. Fruto das brigas internas pelo comando nacional e do esvaziamento sofrido nos últimos anos.

Candidato a deputado federal pela sigla e um dos líderes na região, Ricardo Wagner foi o mais votado do PTB no RS em 2022. Mas o desempenho geral foi insuficiente para a sigla colocar um parlamentar em Brasília. Contudo, acredita ser viável a reformulação da legenda, sobretudo pela forte ligação dos filiados com as raízes partidárias.

“Uma coisa é criar um partido totalmente novo, outra é reformular. O PTB é histórico. Creio que não seja tão difícil de reorganizá-lo. Vamos trabalhar para isso. Mas, logicamente, aguardamos as decisões que vem de cima para baixo”, sustenta.

Segundo Wagner, há negociações em andamento com outros partidos, que podem resultar em uma fusão ou na criação de uma federação. “Até o fim do ano teremos isso bem definido”, antecipa. Sobre uma possível saída de políticos para outras siglas, Wagner entende que “trocar de partido é um direito de cada um” e que não pode interferir.

Princípios

Em sua segunda eleição geral, o Novo encolheu a bancada no Congresso. Elegeu apenas três parlamentares. Candidato a deputado estadual e principal líder da sigla no Vale, Douglas Sandri acredita que a condução do partido – por parte de João Amoêdo – contribuiu para a perda de espaço no Congresso. Segundo ele, o ex-presidente foi uma “liderança ruim”.

Sandri lembra que o Novo é contrário ao uso de dinheiro público em campanhas e atividades partidárias e manterá esse princípio mesmo com o mau desempenho em 2022. “Continuaremos nessa linha e vamos fazer uma reestruturação, baseada nos nossos princípios. Assim, atingir a cláusula será uma consequência. E hoje não está nos planos fazer fusão com outro partido”, cita.

No PSC, as discussões também avançam para fusão com outros partidos, como o PTB e o PRTB. Principal nome da sigla no Vale, o ex-vereador de Bom Retiro do Sul, Tiago Pedroso aguarda os movimentos nacionais para auxiliar na estruturação e crescimento da legenda não só na região, mas também no RS. Pedroso, que foi candidato a deputado estadual, já era crítico da “falta de igualdade” na divisão do tempo de propaganda no rádio e na televisão, antes mesmo da criação da cláusula. “É algo totalmente errado, na minha concepção. Se defendem isonomia, todos deveriam ter tempos iguais”, pontua.


ENTENDA A CLÁUSULA DE BARREIRA

– Fixada em 2017, por meio de emenda constitucional, a cláusula de barreira determina quais partidos vão receber dinheiro do fundo partidário e usar o tempo de propaganda gratuita de rádio e televisão;

– Pelo desempenho nas eleições de 2022, 12 partidos e federações superaram a cláusula, enquanto os demais não atingiram o mínimo necessário;

– As regras determinam que um partido deve eleger pelo menos 11 deputados federais, distribuídos em pelo menos nove unidades da federação, ou obter, no mínimo, 2% de votos válidos nas eleições para a Câmara dos Deputados;
– Os 16 partidos que não atingiram a cláusula de barreira continuam a existir, embora não recebam mais suporte financeiro de origem pública a partir de fevereiro de 2023. Como alternativa, podem recorrer a fusão, incorporação ou federação com outras legendas;

– A cláusula de desempenho passou a ser aplicada em 2018 e será reajustada de forma escalonada, em todos os pleitos federais, até 2030.

 

 

 

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