Conexões analógicas

Opinião

Júlia Amaral

Júlia Amaral

Jornalista

Colunista do Caderno Você

Conexões analógicas

Das muitas idealizações da vida adulta, a minha inclui uma casa com uma biblioteca e uma boa coleção de vinil. Vai ser assim: uma das paredes do escritório será um móvel sob medida. Na parte de cima ficam os livros, embaixo os discos e, no meio, a cafeteira que meu namorado já escolheu. Ao lado, uma poltrona de leitura. De frente para o móvel, as mesas de trabalho.

Perfeito. Para mim, mais do que perfeito. Consigo visualizar até mesmo a cor dos móveis e das aberturas da janela. Essa semana, quando voltei de uma entrevista, a cena quase se materializou na minha frente. Vi alguns dos bons discos que desejo ter: “Minha voz”, da Gal Gosta, “Outras Palavras”, do Caetano Veloso, e o “Rita Hits”, da Rita Lee e Roberto de Carvalho.

Aqueles eram só alguns itens da coleção do Hélio. Quando ele percebeu a minha empolgação do acervo, se pôs a procurar o clássico Sgt. Pepper’s, dos Beatles. A entrevista foi embalada por aquele que, para mim, é um dos melhores trabalhos do grupo britânico que marcou época. Sim, às vezes, conversar com pessoas ao som de “With a Little Help From My Friends” faz parte do meu trabalho. É sensacional.

Hélio tem o dobro da minha idade e viveu momentos gloriosos dos materiais analógicos. Eu já cresci no mundo das telas, dos chats, das milhões de fotos compartilhadas por segundo e das playlists do Spotify. Tem seu charme, confesso. Mas o mais legal é ter a possibilidade de acessar outros mundos ou fragmentos que nos levam ao melhor do passado.

Além do mais, mergulhar na paixão dos outros, que às vezes conversam com a nossa, é uma das graças do jornalismo. A gente sempre aprende com uma nova pauta, mas, às vezes, é mais do que isso. A gente se diverte, se entusiasma, volta para os sonhos, conecta com os nossos desejos para o futuro.

Nesta semana, o Caderno Você fala sobre discos de vinil. Um jornal impresso fala sobre a música antes do mundo digital. São muitos fatores analógicos, é verdade. Mas não deixam de se relacionar com o presente e, se não perdem a importância mesmo diante da ascensão da tecnologia, não deve pouca coisa.

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