Tudo muito acelerado por um objetivo. Jander tem que ser melhor hoje do que foi ontem. Estava colado na geladeira o cronograma de cada dia. Acordar às 4 horas da manhã, cumprir a primeira tarefa com uma caminhada, seguida pelo café da manhã.
Pão sem glúten com creme de ricota light. Depois passava por mais de 12 horas em atividades profissionais, talvez alguma escala de leitura sobre o poder da ação. Era preciso trabalhar enquanto os outros descansavam.
“Essa é a fórmula do sucesso”, defendia para quem fosse. Neste ínterim, aumentou a distância da família, dos pais e da irmã. A namorada já havia desistido dele. “Ela me limitava”, reafirmava para si próprio em frente ao espelho.
Fingia cada sentimento para não mostrar fraqueza. Dizia sim para tudo. Pode assumir o relatório do estoque? Sim. Antes de sair, revisa o portfólio dos clientes? É claro. Precisamos de alguém para limpar as maçanetas? Eu faço!
Se as novas tarefas lhe ocupavam por ainda mais horas, tinha na ponta da língua: “quando morrer vou ter tempo de descansar”. Comprou a ideia em um curso online, assinado pelo Instrutor Mindset, seu tutor de comportamento, personagem em quem me dedicarei numa próxima oportunidade.
O dia de esforço virou semanas e os meses viraram anos. O nível de estresse estava disfarçado. Na negação do cansaço, dormiu no serviço. Quando acordou, viu um grande escritório desconhecido, muito iluminado. Franziu o cenho em uma expressão de desconfiança.
Um executivo muito bem vestido se aproximou. “Olá, Jander. Você morreu.” Antecipou a resposta antes da pergunta. “Como assim? Eu estava tão bem”, duvidou ele. “Não, não estava. Vem cá, vou lhe mostrar.”
Aquele homem era um dos CEOs do céu. Coworker de Deus. Responsável pelo deadline dos humanos. Naquele meeting fez o briefing ao recém-chegado: “está vendo esses arquivos? Nestes documentos temos o que chamamos de prazo de validade das pessoas. Trata-se de um controle do tempo de cada um na terra. Sua busca constante pelo sucesso acelerou o seu relógio da vida, ou melhor, de morte”.
O tão esperado descanso havia chegado para o nosso herói. “Só um pouquinho”, disse o CEO a serviço do Criador. “Jander, agora você precisa colocar esses relatórios em ordem alfabética, tabular os próximos 105 anos de novas chegadas e encaminhar cada um às respectivas repartições.”
Frente ao olhar de incompreensão do desencarnado, o executivo divino finaliza: “você está pensando que o céu é moleza. Vamos, vamos. Bora trabalhar!”
Olhar à saúde mental
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Crédito: Filipe Faleiro
Estresse, ansiedade, síndrome de Burnout e depressão. Para muitas pessoas, falar das próprias angústias, medos e preocupações é demonstrar fraqueza. Inclusive encarado como fator de ameaça caso apareça frente aos superiores.
No ciclo da vida moderna, ter desempenho profissional satisfatório junto com o bem-estar faz parte dos propósitos de todo trabalhador. Ainda assim, temos dificuldade de medir a dose.
Controle do tempo, efetividade naqueles momentos de labuta e doses de lazer, descanso e ócio (sim, não fazer nada também é importante). Outra dica: não leve o celular para o quarto.
Problema individual ou coletivo?
As doenças da mente já superam as enfermidades físicas provocadas pelo exercício laboral. Se nas décadas de 1980 e 90 o afastamento do trabalho se dava por lesões, esforço repetitivo ou amputações, os novos tempos desafiam o psicológico das pessoas.
A estimativa atual aponta que pelo menos 5% da população adulta no mundo conviva com algum transtorno psíquico já em estágio severo. Essa situação traz um temor de elevação nos índices de suicídio para os próximos anos.
Tal quadro tem como nascente uma predisposição do sujeito para esses quadros? Ou se trata dos modelos produtivos, das exigências no mundo do trabalho e da insegurança sobre o futuro? Me ajudem a entender.