A piada é velha, mas oportuna e me foi presenteada no dia 11 de agosto pelo amigo Hugo Schunemann. O homem encontra uma lâmpada – não as de luz, aquelas modelo Aladim, que têm um gênio dentro. Como reza o manual, ele esfrega o artefato fazendo surgir o tal gênio.
Eu te concedo 3 desejos, dispara o gênio. Hum, pensa o incauto: eu desejo um mundo sem advogados! Seu desejo agora é a realidade … você não tem mais desejos! Indignado, o homem questiona: mas você não disse que eu tinha 3 desejos? Me processe, respondeu o gênio.
A leitura do livro “O Dialogo Possível”, do professor Francisco Bosco, faz a gente olhar com outros olhos, por outros ângulos, o momento de radicalização de posicionamentos que enfrentamos em todas as esferas. O autor sustenta que precisamos urgentemente tomarmos consciência acerca da importância do diálogo, do debate de ideias e de proposições.
Dentre os obstáculos que enfrentamos, ele destaca a “desalienação” e “desidentificação” como tentativas de desativar as “lógicas de grupo”. As pessoas têm prazer com a confirmação de suas ideias – ideológicas, partidárias, morais – e assim tendem a recusar enfrentar a realidade, caso ela possa colocar em xeque essas ideias.
“O narcisismo do pertencimento (esse sentimento de proteção que o grupo nos concede) tende a sacrificar o diagnóstico mais preciso da realidade, quando esse se mostra complexo e exige criticar as perspectivas do próprio grupo ou reconhecer a pertinência dos argumentos e das evidências apresentadas pelos adversários.”
Bosco afirma que a condição do sujeito “ensimesmado” não apenas falsifica e desqualifica o debate, em seus argumentos, como também deteriora a confiança nos interlocutores. Sem um mínimo vínculo de confiança, não existe abertura para o diálogo e as soluções para os impasses ficam cada vez mais distantes.
Neste exato momento, estamos vivenciando várias situações nas quais o debate público se deteriorou, o narcisismo tomou conta da pauta e a confiança entre os interlocutores se esvaiu. Bem próximo da gente, após intermináveis discussões acerca do modelo de pedágio a ser aplicado nas estradas que riscam o Vale, o Estado lançou o edital.
As lideranças empresariais se revoltaram, tentaram retomar o diálogo, patrocinaram pesquisa de opinião, mas nada demoveu o Poder Público de levar o projeto adiante. Afinal, depois de muito argumento e troca de farpas – o “vocês são ineficientes” contra o “vocês não querem pagar nada” – a questão foi parar no Poder Judiciário.
Aí entra em cena o Estado Democrático de Direito, aquele que tem 3 poderes independentes. Se o Governo diz não, se não está disposto a conversar, ainda nos resta alternativa. Se o sujeito lá do primeiro parágrafo realizasse o seu desejo, quem poderia nos socorrer?