Adequar os limites municipais e serviços aos moradores em áreas de divisas. Esse é o propósito de pedido encaminhado por duas cidades da região à Assembleia Legislativa. A revisão envolve pelo menos 47 famílias em três comunidades do interior.
O processo mais recente é o de Sério, protocolado esta semana na Comissão de Assuntos Municipais. Desde 2013, líderes locais buscam a correção de traçado com Boqueirão do Leão. A área questionada envolve as localidades de Arroio Galdino e Santa Madalena, cerca de 750 hectares.
Outra situação é entre Westfália e Boa Vista do Sul. A revisão de divisa compreende 148,9 hectares na comunidade de Linha Berlim Fundos. Em ambos os casos, houve a coleta de assinaturas dos moradores e a aprovação nas câmaras de vereadores. Os municípios também contrataram técnicos para elaboração da proposta do novo mapa.
Esse ajuste é justificado por eventuais erros no processo de emancipação. Os responsáveis nos municípios atribuem essa falha por ausência de regras claras e tecnologia para definir os limites. Ao mesmo tempo, quem mora nessas regiões, convive com a dúvida para qual serviço público recorrer.
Com a revisão cartográfica, além de ajustar os critérios técnicos, a intenção dos gestores municipais é qualificar o atendimento às famílias. Agora, no caso de Sério e Westfália, esse impasse depende da tramitação na Assembleia. Por conta do período eleitoral, não há expectativa de que seja votado este ano.
Serviços públicos
Uma das divergências nessas localidades é em relação a quem presta o atendimento à população. Conforme o prefeito de Sério, Moisés de Freitas, o governo faz a manutenção das estradas, atende os produtores e oferece os serviços de saúde, mas a contribuição das famílias vai para Boqueirão do Leão.
“As parcerias e cooperações entre os municípios nem sempre funcionam. A melhor solução é oficializar essa correção de divisas e assim cada morador terá uma documentação única”, comenta Freitas. No caso da comunidade de Arroio Galdino, a estrada é o ponto de referência para a divisa. Pelo novo modelo, arroios e córregos passam a definir a divisa.
Freitas lembra que a mobilização da comunidade é antiga. Os primeiros movimentos surgiram em 2013. Além do aspecto técnico, há um desejo dos moradores em pertencer a Sério. “Com o passar dos anos muitas famílias migraram o bloco de produtor para nosso município. Dessa forma são contemplados com os programas de incentivo do setor primário.”
Já o prefeito de Boqueirão do Leão, Jocemar Barbon, entende que a administração municipal também presta serviços a produtores que geram renda para a cidade vizinha. “Foram várias terraplanagens para construção de aviários. Alguns deles têm o bloco em Sério e a renda vai para lá.” Ele considera que essa revisão não atende o desejo de todos.
Barbon era vereador em 2019 quando o pedido tramitou no parlamento municipal. “Fui favorável e mantenho minha posição. Se for bom para os moradores que assim seja feito.” Na época, os demais parlamentares também alegaram que mesmo com a perda territorial, essas famílias consomem no comércio local e não há maiores impactos.

Danieli mora em área cadastrada para Boqueirão do Leão. Do outro lado da estrada, galpão e estufas de fumo ficam na delimitação de Sério. Crédito: Felipe Neitzke
Uma comunidade, dois municípios
A igreja de Arroio Galdino está no território de Sério, já o salão comunitário e a escola ficam do lado de Boqueirão do Leão. O novo poço artesiano que deve abastecer 17 famílias de um lado do município foi perfurado na área vizinha. Nas propriedades rurais também é comum a divisa interferir em relação à cidade onde moram e produzem.
Esse é o caso do agricultor Paulo Danieli, 61. Os canteiros de fumo estão do lado que pertence a Boqueirão do Leão. Ao atravessar a estrada, as estufas foram construídas na área de Sério. “Eu voto em uma cidade e tenho bloco de produtor em outra.”
Outro fato pelo qual Danieli defende a adequação dos limites municipais é a proximidade com Sério. Sua propriedade fica a seis quilômetros da sede administrativa. Já em relação à cidade vizinha está distante mais de 20 quilômetros.
Amparo na legislação
De acordo com o analista legislativo, Filipe Madsen Etges, a revisão de limites é possível quando se identifica erro ou incorreção na descrição das divisas.
Essa mudança está amparada em lei estadual de 2013. Para que a Assembleia possa apresentar um projeto é preciso encaminhar uma série de documentos que passam por avaliação no setor de cartografia antes de avançar na tramitação.
“Se aprovado, altera a lei de criação do município e por consequência a delimitação”, observa Etges. Para alcançar essa etapa, depende do aval da Comissão de Assuntos Municipais e da aprovação na Comissão de Constituição e Justiça pela maioria absoluta dos deputados. No plenário, a proposta precisa da autorização da maioria simples.
Além de Sério e Westfália outras cidades do Vale buscam informações. “Com frequência nos consultam sobre essa possibilidade, mas é preciso de fato ter algum erro e não apenas uma intenção em fazer parte de determinada cidade.” Sobre os processos de anexação ou emancipação, Etges lembra que não há regulamentação do governo federal.