Os cofres públicos dos municípios da região tiveram um incremento de quase 30% nas receitas no primeiro semestre deste ano, na comparação com o mesmo período do ano passado. Juntas, as 38 cidades do Vale arrecadaram R$ 1,1 bilhão em seis meses.
O levantamento foi feito pela reportagem com base em dados disponibilizados nos portais de transparência dos municípios e também no site do Tribunal de Contas do Estado (TCE). São levados em consideração somente as receitas arrecadadas nos executivos municipais, sem incluir os recursos do Poder Legislativo.
Boa parte dos municípios aumentaram as receitas em mais de 30% no primeiro semestre. São, na maior parte, cidades com população abaixo dos 10 mil habitantes. Entre eles, destaca-se Marques de Souza, cuja arrecadação cresceu quase 60% na comparação com os seis primeiros meses de 2021. Passou de R$ 11,8 milhões para quase R$ 19 milhões.
A maior parte da arrecadação do município vem das transferências correntes. Neste primeiro semestre, foram R$ 13,2 milhões oriundos de repasses da União e do Estado. No mesmo período de 2021, por exemplo, o montante recebido foi de R$ 9,9 milhões. Já o valor arrecadado com os tributos municipais foi de R$ 4 milhões.
Outros quatro municípios fecharam os seis primeiros meses de 2022 com alta acima dos 40% na arrecadação: Relvado, Vespasiano Corrêa, Muçum, Imigrante, Anta Gorda, Mato Leitão e Colinas. Chama atenção o fato de que todas são cidades com população abaixo de 10 mil habitantes.
Cautela
Município mais populoso do Vale, Lajeado, por consequência, tem também o maior orçamento regional. E a arrecadação cresceu 18% no primeiro semestre na comparação com o mesmo período de 2021. Conforme o secretário da Fazenda, Guilherme Cé, o aumento acima do previsto se dá por dois fatores: a alta da inflação e o crescimento econômico de 2022.
“A inflação acaba gerando um efeito positivo na arrecadação em todas as esferas do governo, sendo que a pressão no lado da despesa demora um pouco mais para acontecer. E as estimativas de crescimento econômico têm sido superiores às projetadas no início do ano”, salienta.
Cé, no entanto, ressalta que o momento requer cautela e responsabilidade na gestão, pelo próprio efeito inflacionário e as incertezas globais. “Além disso, muitas medidas aprovadas em Brasília gerarão efeito nos estados e municípios com mais força no segundo semestre em termos de arrecadação”, analisa. O secretário da Fazenda não tem uma projeção exata, mas estima que a perda na arrecadação do município de Lajeado pode variar entre R$ 3 milhões a R$ 5 milhões no próximo ano, com base nos dados atuais.
Composição
A arrecadação de um município ocorre tanto com as receitas próprias, oriundas principalmente dos impostos, taxas e contribuições de melhoria, quanto através de transferências constitucionais da União e do Estado. Cidades menos populosas, por exemplo, tendem a depender mais de recursos governamentais.
Em Marques de Souza, 73% do montante arrecadado no primeiro semestre provém de transferências correntes. Já a receita gerada por tributos municipais representa somente 20% do total. Lajeado, por outro lado, quase 30% da arrecadação neste período veio dos impostos e taxas, como o Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU).
“Quanto menor o município, normalmente a dependência de recursos de fora é maior. Então, quando aumenta a arrecadação federal, acabam sendo mais beneficiados. E Lajeado provavelmente é o que tem a menor dependência no Vale”, salienta Guilherme Cé.
Base frágil
Na avaliação da economista Cintia Agostini, uma comparação entre 2022 e 2021 traz uma base frágil, sobretudo porque, em parte do ano passado, as atividades econômicas ainda não estavam a pleno em virtude da pandemia. Para ela, a retomada impacta de forma positiva na arrecadação dos municípios.
“E alguns rendimentos, repasses ou recursos dependem do processo inflacionário e do aumento da taxa de juros. Esses valores também passam a uma arrecadação à maior. E os preços administrados, aqueles regidos por contratos públicos, também são pressionados pela inflação. Isso faz a arrecadação aumentar”, salienta.
Porém, nos próximos meses, Cintia acredita que o cenário tende a mudar, com a União abrindo mão de recursos de impostos atrelados ao combustível, por exemplo. E também por conta dos repasses de programas como o Auxílio Brasil e o Auxílio Caminhoneiro.
“Isso já impacta, inclusive, em bloqueios de recursos de outros ministérios. E, mais ainda, na divisão de recursos do bolo tributário. Todos estão abrindo mão de receita. Vai causar impacto ali na frente aos municípios. O número tende a se estabilizar e não ser tão positivo no segundo semestre”, projeta Cintia, que também ressalta a preocupação com o aumento inflacionário no mundo.
Impacto imediato
Estudo da Confederação Nacional dos Municípios (CNM) aponta que as medidas federais recentes somam um impacto imediato de R$ 73 bilhões para os municípios brasileiros. E pode chegar a R$ 250,6 bilhões nos próximos meses, caso outras pautas em tramitação sejam aprovadas em Brasília.
O impacto corresponde a 16,7% na receita corrente líquida dos municípios em 2022. Os valores são referentes não somente à redução de receitas federais, como também pelo aumento de despesas – como o aumento de pisos salariais de diferentes categorias – e liminares que impedem redistribuição de recursos às cidades.
Arrecadação por municípios