“Eu vi a abertura de todas as estradas, do começo ao fim delas”, conta Valter Pretto, 66. Natural de Pouso Novo, ele lembra de como o caminhão de seu pai, Constante Pretto, esteve à disposição das obras rodoviárias. Ele, os cinco irmãos e o pai eram caminhoneiros e, mesmo que a antiga Estrada da Produção já estivesse pronta quando Valter começou a trabalhar, ele não esquece de como antes do asfalto, a viagem até Porto Alegre era demorada e difícil antes de 1972.
Em 7 de junho daquele ano, a estrada Tabaí-Canoas foi inaugurada. Marco para o Vale do Taquari, o trecho reduziu a distância da região até Porto Alegre em 40 quilômetros e também consolidou a BR-386, construída na década anterior, como a rodovia da produção e importante corredor logístico no Estado.
Antes, a viagem de Lajeado até a capital gaúcha ocorria por trajetos mais distantes e, em alguns casos, precários. No passado, as estradas de pista simples e chão batido desafiavam motoristas. Muitos moradores seguiam por Garibaldi e Carlos Barbosa para chegar à capital.
Outra alternativa era trafegar por Vila Mariante, Taquari, Montenegro e São Leopoldo, na antiga RS-19. O trajeto era de mais de 170 quilômetros. Hoje, a distância entre as rodoviárias de Lajeado e Porto Alegre é de 111 quilômetros. Uma viagem que antes demorava até três horas rumo ao destino final hoje leva uma hora e meia.
Passadas cinco décadas, a BR-386 hoje passa por novas transformações desde que a CCR ViaSul assinou o contrato de concessão, em 2019. Obras de duplicação e reestruturação de trechos que contam hoje com pista dupla visam aumentar a capacidade de tráfego, melhorar a fluidez no trânsito e a segurança dos usuários.
Atuação dupla
Conforme reportagem do Jornal Nova Geração em 3 de junho de 1972, a construção do trecho Tabaí-Canoas foi entregue a duas empreiteiras diferentes. A Indubras executou as obras do quilômetro 0 ao 20, enquanto o restante (até o 54) ficou sob responsabilidade da Sultepa.
À época, a antiga RS-13, era chamada de Rodovia Presidente Kennedy. A denominação se deve ao fato do projeto final de engenharia e execução da obra ter sido acompanhada por técnicos norte-americanos. Em 2007, passou a se chamar Rodovia Leonel de Moura Brizola, em homenagem ao ex-governador responsável por iniciar a construção da via.
O custo total da obra, incluindo duas pontes, foi de mais de cinquenta milhões de cruzeiros, segundo informações do DNER (antigo Departamento Nacional de Infraestrutura e Transportes (Dnit). Hoje, o valor representa R$50 mil. A nova estrada Tabaí-Canoas tinha 54,4 quilômetros de extensão.
O corte da fita ocorreu no trevo de acesso a Tabaí e contou com a presença do ministro dos transportes à época, Mário Andreazza. Naquele período, cerca de 3 mil veículos utilizavam a rodovia por dia.
“Melhorou muito”
Administrador das rodoviárias de Lajeado e Estrela, Nelson Noll recorda da consolidação da BR-386 como principal rota à capital. Na década de 1960, ele assistiu à solenidade de inauguração da rodovia, com uma corrida de carreteiras que cruzaram o trecho. Várias figuras conhecidas da política nacional estiveram presentes. “Estava ali no Boa União, logo adiante de onde hoje é o trevo. Tinha um barranco e assisti a esse momento”, lembra.
Já quando ocorreu a inauguração da Tabaí-Canoas, Noll trabalhava na Rodoviária de Estrela. E destaca o avanço que se teve para a região. “Anteriormente, os ônibus desviavam por Mariante, Taquari e, posteriormente, Montenegro e São Leopoldo. Melhorou muito”, pontua.
Duas empresas faziam as linhas da região até a capital: a Expresso Azul e a Irmãos Mayer da Silva. Um tempo onde poucas famílias tinham condições de comprar um carro, e o ônibus era o principal meio de locomoção em viagens para fora do Vale. “Era tudo caro, até o combustível. E o ônibus era um meio mais acessível. Mas eram viagens cansativas”, frisa Noll.
Conforme um dos fundadores do Expresso Azul, Carlos Alfredo Glufke, logo que o trecho foi inaugurado não era permitida a passagem de ônibus. “Não era a obra que não dava permissão. Era o controlador do sistema de transporte de passageiro”, explica. Poucos meses depois, o acesso foi liberado.
Glufke ainda estudava em Porto Alegre quando a estrada foi inaugurada. No ano seguinte, começou os trabalhos na Expresso Azul. Apesar da estrada estimular o uso de carros particulares, ele conta que a inauguração da rodovia não interferiu no número de passageiros transportados. “Muita gente ainda tinha medo de dirigir para longe. Não era comum”, comenta.
Para ele, em termos de logística, o que mais teve impacto foram as entregas rápidas, que, entre outros serviços, levavam os documentos de uma empresa para outra. “A economia de diversas regiões do estado ficam atreladas à capital. Então, o caminho para Porto Alegre sempre é procurado e deve ser melhorado”, destaca.
Desenvolvimento regional
Aos 85 anos, Rogério Kappler lembra do tempo que demorava para chegar em Porto Alegre e das tantas vezes em que perdeu o avião para São Paulo por isso. Na época, as viagens para o sudeste eram frequentes e necessárias para consolidação da Motomecânica na região, que foi uma das primeiras empresas a deixar o centro da Lajeado para se instalar próxima à BR-386.
“Tinha uma expectativa muito grande na região. Quando foi inaugurado o trecho Tabaí-Canoas deu vontade de soltar foguetes. E eu nem gosto de foguetes”, brinca. No dia da inauguração, Kappler estava em viagem.
Quem também comemorou o feito foi o ex-prefeito de Estrela Hélio Musskopf. Na época, Musskopf ainda morava em Bom Retiro do Sul. Para ele, a importância da rodovia se estende para além da produção primária, incluindo a indústria, os serviços e o comércio.“Hoje vivemos outros tempos. Precisamos nos parabenizar e agradecer aos que participaram desse processo”, conta.
Visão de futuro
Assim como o Motomecânica, uma das primeiras empresas a se instalar na BR-386 foi a Fruki. O empreendimento do ramo de bebidas tinha suas operações em Arroio do Meio. Em 1971, ocorreu a transferência das atividades para Lajeado, em uma área à época pouco habitada. Tudo isso graças a uma visão de futuro do diretor Nelson Eggers.
O terreno foi adquirido na década de 1960. Eggers conhecia um dos engenheiros que trabalhou na obra de construção da BR-386 e teve acesso ao desenho do trecho, projetado até Porto Alegre. Anos depois, a rodovia se consolidou como corredor de exportação e foi duplicada até Estrela.
“Ele me forneceu os mapas de onde iria passar a rodovia e começamos a procurar áreas ali. Antes era tudo propriedade de colonos. Não havia nada do que tem hoje”, comentou Eggers, em entrevista ao programa “O Meu Negócio”, da Rádio A Hora, em abril deste ano.
Reestruturação do trecho
Assinado em 2019, o contrato de concessão da BR-386 à CCR ViaSul tem duração de 30 anos. Até lá, a rodovia receberá uma série de investimentos. O trecho de Lajeado a Carazinho, hoje em pista simples, será duplicado em etapas. A primeira, até Marques de Souza, estará pronto em fevereiro de 2023.
Por outro lado, o trecho entre Tabaí e Canoas também receberá melhorias. Conforme a concessionária, os investimentos serão do ano 4 (2022) até o ano 18 (2036) e contemplam diversas melhorias. “São obras de readequação para a reclassificação da rodovia, com implantação de acostamento e canteiro central ou defensas metálicas”, cita.
Readequações ainda previstas entre Tabaí-Canoas
- 23,4 KM de vias marginais, entre 2031 e 2036
- 23 acessos (melhorias e novos), entre 2031 e 2036
- 7 interconexões (reformulações e novas), entre 2022 e 2036
- 5 retornos (melhorias e novos), entre 2034 e 2036
- 5 passarelas novas, entre 2022 e 2023
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