Gaiteiros de todas as idades se reuniam em frente à praça da cidade para tocar e conversar. O ano era 1993, e ali surgia o 1º Encontro Internacional dos Gaiteiros de Nova Bréscia. O evento, que se tornou tradição no município, era muito esperado pela comunidade, e grandes artistas tradicionalistas já participaram.
Este ano, a iniciativa volta a mobilizar o Vale, nos dias 5 e 6 de abril. A programação celebra os 57 anos de emancipação política da cidade conhecida, também, como a “terra do churrasqueiro” e a “capital da mentira”.
Sucesso desde a primeira edição, o encontro reuniu quase mil pessoas naquele ano. Entre as atrações, estavam Renato Borghetti, Edson Dutra, do grupo Os Serranos, Gildinho, de Os Monarcas, e Maurinho, do Grupo Pampeano.
Na época, quem estava à frente da organização era Wilson Mocellin, que além de afeito à música, era amigo dos artistas. O empresário saiu do município aos 17 anos para trabalhar em churrascarias. Hoje, mora em Uberlândia, Minas Gerais, onde tem seu próprio restaurante e mantém o gosto pelo tradicionalismo. “Onde eu sei que tem um gaúcho tocando, eu convido para conversar. Foi assim que eu conheci todo mundo”, conta.
Ele lembra que da primeira vez que propôs o encontro de gaiteiros, nem mesmo o prefeito da época, Dalton José Nichel, acreditou na iniciativa. Mocellin insistiu e, em parceria com entidades locais, foi promovido um jantar no Clube Tiradentes para receber os artistas.
“Esses músicos nunca cobraram nada para tocar em Nova Bréscia, exceto os conjuntos que se apresentavam nos bailes após o evento”, lembra.
A ideia de confraternizar com os amigos de profissão reuniu ainda mais músicos no ano seguinte. Em 1994, a comunidade participou de forma ativa, e ofereceu suas casas para os gaiteiros passarem as noites, já que a cidade não possuía hotel. O sucesso prosseguiu nos anos seguintes, até 1997, quando deixou de ser organizado e ficaria mais de duas décadas parado.
De pai para filho
Um grande incentivador do encontro foi Cacildo Albare da Rocha, 66. Natural de Montenegro, desde que veio a Nova Bréscia, trouxe com ele o gosto pela música e a paixão pelo tradicionalismo. Foi por meio da iniciativa dele que tantas crianças e jovens fizeram aulas de gaita no município. E, no repertório, já tem mais de 70 músicas nativistas escritas.
As letras são sobre experiências no campo e na cidade, e contam histórias da vida real. Rocha lembra que, quando criança, não tinha condições de comprar um instrumento musical, e foi ter a primeira gaita apenas 20 anos mais tarde. Mas, antes disso, já tinha boa voz para a cantoria, e ensaiava com um violão improvisado feito com corda de nylon utilizada para pescar.
Luis Felipe Dalpian da Rocha, 17, herdou o gosto pela música do pai. Rocha lembra que aos dois anos, o filho já brincava com o microfone e uma pequena gaita vinda do Paraguai. Onde Rocha ia com o instrumento, Luis Felipe ia junto.
“O pessoal dizia, como toca aquele guri, e ele só abria a gaitinha”, lembra o pai. Com sete anos, o menino começou a fazer aulas de música e, hoje, participa do grupo “Garotos do Surungo”, criado pelo pai. Segundo o dicionário, a palavra “surungo” significa “baile de gente simples”, e os músicos já se apresentaram por diversos fandangos do estado e de Santa Catarina.
Na próxima semana, Luis Felipe também vai participar do encontro, inclusive, com uma composição para Albino Manique, músico homenageado desta edição. Estudante do ensino médio, o jovem pensa em seguir a música como profissão. “A gaita é um instrumento apaixonante. Tu te dedica a ele e consegue sentir a música, passar o que pensa por meio dela”, destaca.
Artista internacional
Rocha lembra do primeiro ano em que Nova Bréscia sediou o encontro de gaiteiros. Depois disso, participou de todas as edições. Muitos artistas de sucesso visitavam o município e, em 1996, um acordeonista dos Estados Unidos também veio prestigiar.
Frank Marocco era conhecido por ter feito mais de 200 trilhas sonoras para filmes americanos. No ano em que veio à região, viu os homens com trajes típicos do sul, e queria uma roupa igual.
“Ele veio com um intérprete de São Paulo e pediu um traje gaúcho, foi emocionante”, conta Rocha. A bombacha e guaiaca foi ele quem emprestou. Mas a bota ficou pequena, e outro morador se prontificou.
O artista passou três dias com os trajes e, na hora de ir embora, quis levar as roupas. “O prefeito da época me pediu e eu disse que seria uma honra dar a bombacha e guaiaca para ele”, recorda Rocha. No mesmo ano, a Associação dos Acordeonistas do Brasil e a Orquestra Sanfônica de São Paulo também estiveram presentes no evento.
A volta
O Encontro dos Gaiteiros foi uma iniciativa da comunidade que contou com o apoio da prefeitura. Mas, entre 1997 e 2019 não teve força para retornar. Quando voltou ao calendário de eventos de Nova Bréscia, a cidade já contava com uma nova geração de gaiteiros, com nomes como Guilherme Giovanelo (25).
O jovem conta que o gosto pela música surgiu quando ele tinha seis anos e se encantou pela gaita de brinquedo da irmã. Mas Maria do Carmo, mãe de Guilherme, tem outra versão.
“Quando eu estava no final da gravidez, começou um temporal, e eu tinha medo. O pai dele pegou uma gaita que tinha em casa, mas estava esquecida, e começou a tocar. Achei engraçado, fiquei prestando atenção. Acho que veio dali o gosto de Gui pela música”, conta.
Conforme Guilherme, a gaita sempre foi valorizada na família. “Meus pais também viram na música um meio de despertar e expressar emoções e sentimentos”, reforça. Essa relação familiar com o instrumento se repete em outras casas do município.
Quem vem de longe
Hemerson Ribeiro Carlin, o Taroba Teixeirinha, é apresentador do programa “Canta Parana”, na emissora paranaense TV Parobá. No domingo, ele pega a estrada para percorrer mais de 500 km rumo a Nova Bréscia. Apesar de não tocar gaita, o evento chamou sua atenção.
Carlin já sabia do encontro desde 2019, mas não conseguiu participar naquele ano. Depois, a pandemia adiou os planos de conhecer o Vale do Taquari. Conforme o apresentador, a amizade entre os músicos faz com que informações sobre os encontros circule por todo país.
“Sou um apaixonado pelo tradicionalismo e acredito que nesse encontro vou ganhar muita experiência. Quero gravar tudo o que eu puder para usar no programa depois”, conta. Outra motivação para vir a Nova Bréscia este ano é a homenagem a Albino Manique.
Para conhecer os artistas preferidos
Éric, o Gaiteiro Feliz, de 13 anos, também vem de longe. Ele mora com a família em São Bento do Sul, Santa Catarina, e vai participar do evento pela segunda vez. Para ele, esta é a oportunidade de rever amigos da música e conhecer aqueles que admira. “Quero conhecer o Paquito, da dupla Paquito & Jóia. Comecei a tocar gaita porque queria ser igual aos músicos que via na televisão”, conta.
Ele começou a tocar aos quatro anos de idade, mesmo sem músicos ou gaúchos na família. “Nós somos todos gaúchos de coração”, brinca Eric. Da primeira vez em que veio para cidade, se apresentou em escolas, e tem planos de ser professor de música no futuro.
Este ano, na 6ª edição, a banda “Os Mirins” será a grande atração do encontro gratuito que conta com shows e oficinas. Nos dias 8, 9 e 10, a terceira edição do Festival do Churrasqueiro dá continuidade às festas, na Praça da Matriz. Na programação, está um jantar na sexta-feira às 20h. No sábado, será oferecido almoço e jantar e, no domingo, a refeição é oferecida somente à noite.
Programação
Sexta-feira: 8/4
18:30 – Abertura
19 hs – Cantare La Vita
20 hs – Os Atuais
22 hs – Werner e Cia. Musical
Sábado (9/4):
11 hs – Zé e Elias
14:30 – San Marino
16:30 – OSCA: Orquestra de Capitão
18 hs – Garotos do Surungo
20:30 – Shana Müller
22:30 – DJ Diego Martini
23:30 – Baile Clube Tiradentes com Negão e Banda
Domingo (10/4)
11 hs – Gabii e Banda
12:30 – Banda Sol Vanera
14:30 – Banda Destaque Nacional
17:30 – Luiza Barbosa
19:30 – Tchê Barbaridade