A reforma no ensino começa neste ano em todos os primeiros anos do Ensino Médio tanto na rede pública quanto na privada. Por um lado, coordenadores de escolas particulares demonstram otimismo diante da construção do método, do diálogo com as famílias e dos diferenciais na formação dos jovens.
Em outra ponta, docentes e diretores das escolas públicas preocupados com a falta de estrutura para que o método funcione como o planejado. No Vale do Taquari, das 41 instituições do Estado, dez integraram projetos piloto para reestruturação das metodologias. As experiências iniciadas em 2019 foram prejudicadas devido a chegada do coronavírus.
Pela nova metodologia, haverá mais carga horária e a implementação de disciplinas optativas. Especialistas, representantes dos professores e diretores temem que o modelo precarize o trabalho dos docentes devido a falta de formação específica para os itinerários.
Conforme o diretor da escola estadual Vidal de Negreiros, de Estrela, Joel Mallmann, a adaptação do currículo foi interrompida em 2020. “Houve um baque para todos. Todas as dinâmicas e a necessidade de trabalhar à distância deixou o novo formato um pouco de lado.”
No início da experiência, os treinamentos dos professores eram presenciais. “Depois a urgência foi outra. Tivemos de aprender a fazer aulas remotas.” De acordo com o diretor, para definição das disciplinas optativas, a escola buscou escolher professores com mais afinidade aos assuntos. Ainda assim, diz, não houve tempo hábil para as formações. “O ideal seria começar com conhecimento prévio. Isso não foi possível. O treinamento será ao longo do ano, junto com as aulas.”
A implementação será de forma progressiva a partir do próximo ano, com as 1ª séries do Ensino Médio. Em 2023 com as 1ª e 2ª séries e completando o ciclo nas três séries do Ensino Médio em 2024.
Experiência em Taquari
Na escola estadual Pereira Coruja, em Taquari, o histórico da instituição com cursos de Magistério e técnicos de administração contribuíram para formação do projeto piloto. O vice-diretor, André Vanderlei da Silva, afirma que houve pontos positivos e negativos no processo.
Dos cinco itinerários, dois foram ofertados aos alunos. Um voltados às Ciências Exatas e outros à Cidadania e linguagens. “Tínhamos professores com afinidade nesses assuntos devido aos cursos técnicos. Sabemos que outras instituições não tiveram essa facilidade.”
No aspecto negativo, admite haver incertezas com relação a como será a continuidade do processo para os segundos e terceiros anos. De acordo com ele, do projeto piloto, houve mudanças na gestão da Secretaria Estadual de Educação, o que interferiu no método. “Tudo ainda está muito nebuloso. Temos como será no primeiro ano, mas não sabemos como serão os próximos.”
“As escolas não têm como ofertar o que foi prometido”
A presidente do Cpers Sindicato, Helenir Schurer, critica o formato de elaboração do agora chamado Ensino Médio Gaúcho. “Não houve uma construção coletiva. Os professores, as universidades, as escolas, as famílias e os alunos não foram ouvidos. Foi um modelo criado dentro de uma sala, sem conhecimento da realidade do ensino público.”
Pelos cinco itinerários formativos, há áreas distantes das escolas públicas. “O fato é que os colégios terão um ou dois itinerários. As escolas não têm como ofertar tudo o que foi prometido.”
Essa condição, afirma Helenir, põe por terra a afirmação de que o aluno será protagonista, por poder escolher diferentes áreas para se aprofundar. “Em muitas escolas do interior, serão um ou dois itinerários. Esse aluno estará em desvantagem na comparação com quem estiver em instituições com mais condições de ofertar esses cursos.”
Embate nacional
A deputada federal, Rosa Neide (PT\MT) ingressou no Congresso Nacional com um pedido de adiamento da mudança. Na opinião da parlamentar, é “temerário prosseguir com a reforma que altera a estrutura da última etapa da educação básica do país” em um quadro conturbado devido a pandemia e as consequentes limitações impostas pela doença nos últimos dois anos. O projeto está em análise nas comissões de Educação, de Constituição e Justiça e também de Cidadania da Câmara dos Deputados.
Certezas na rede particular
Em quatro instituições privadas do Vale, as novas diretrizes fizeram com que as equipes revisassem métodos e currículos para atender as obrigações legais. O Colégio Madre Bárbara, de Lajeado, iniciou os estudos e discussões sobre o tema há mais de dois anos.
O objetivo da equipe era criar um projeto inovador, atrativo aos estudantes e que viesse ao encontro da missão e os valores da Rede Imaculado Coração de Maria (ICM) de Educação. Esse novo currículo contempla no mínimo 3 mil horas distribuídas em um período de 3 anos destinadas as aprendizagens essenciais previstas na Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e aos Itinerários Formativos.
No Colégio Sinodal Gustavo Adolfo, os alunos terão acesso a uma nova estrutura. Parte das aulas será um currículo voltado para promover o protagonismo e a autonomia. O modelo foi elaborado a partir de parceria com a Univates e parte dele será no complexo universitário.
Já no Colégio Alberto Torres (Ceat), a reforma foi importante para revisitar o que a instituição já fazia. Esse processo, diz o diretor Rodrigo Ulrich, mostrou que formados pela instituição atingem os objetivos previstos pela nova diretriz.
De acordo com ele, os resultados quanto à qualidade do ensino no Ceat estão no mesmo nível de países desenvolvidos. Como exemplo, cita o Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa). “Com o novo Ensino Médio, o que fizemos foi ampliar o tempo do aluno na escola, com disciplinas obrigatórias e atividades optativas.”
No Colégio Teutônia, a meta é incentivar o protagonismo dos jovens, a partir de ações colaborativas e ajudar no processo de transformação social. Esses preceitos, afirma o diretor do Colégio Teutônia, Jonas Rückert, fazem parte da identidade e do perfil da comunidade regional.
A aproximação com o mundo do trabalho é uma tônica para a atuação da escola. “Precisamos buscar maior conexão com a sociedade, com o mundo do trabalho, com a performance das nossas ações cotidianas”, afirma Rückert.
Pesquisa Rumo
Aproximar o jovem do mundo do trabalho e ajudá-lo a conhecer suas aptidões e talentos. Esse é um dos objetivos da reforma no Ensino Médio e também a meta de pesquisa do Grupo A Hora. Por meio do Programa Rumo, se elabora um diagnóstico com os empresários sobre as carências no momento de contratar. Já nas escolas, os estudantes são questionados sobre anseios futuros e as metas profissionais.
Os resultados da pesquisa serão apresentados entre maio e abril. Depois disso, serão agendados painéis, debates e seminários sobre a aproximação dos jovens e do trabalho.
Ensino Médio Gaúcho no Vale
A região tem 41 escolas públicas do Estado com Ensino Médio. Deste total, dez foram incluídas no projeto piloto com o novo formato. São:
• Escola Estadual de Ensino Médio Estrela;
• Vidal de Negreiros (Estrela);
• São Miguel (Cruzeiro do Sul);
• Guararapes (Arroio do Meio);
• Padre Fernando (Roca Sales);
• Escola de Ensino Médio Nova Bréscia;
• São Francisco (Progresso);
• Pereira Coruja (Taquari);
• Gomes Freire de Andrade (Teutônia);
• Escola de Ensino Médio Westfália.
Rede pública na região
- 86 escolas
- 41 com Ensino Fundamental
- 41 com Ensino Médio. Deste total,
32 também tem turmas do Fundamental - Mais de 20 mil alunos em 2021
- Quase 9 mil matrículas no Ensino Médio no ano passado
- 1,5 mil professores na rede estadual do Vale
Entrevista – Regiane Mallmann • coordenadora pedagógica da 3ª CRE
“Nas escolas piloto houve mais avanços do que dificuldades”
• A Hora – Em que estágio as escolas de ensino médio estão para começar o novo modelo neste ano letivo?
Regiane Mallmann – A matriz do Ensino Médio Gaúcho está em implementação gradativa. No decorrer do ano letivo, será disponibilizado o catálogo dos componentes de Aprofundamento Curriculares e Eletivas para estudos e estes farão parte dos Itinerários Formativos para os anos subsequentes, no 2º e 3º Ano.
Para as dez escolas piloto, será seguida a nova matriz para o 1º Ano e os demais com adaptações de acordo com os Itinerários Formativos (Cidadania e Gênero, Educação Financeira, Empreendedorismo, Expressão Corporal, Expressão Cultural, Profissões, Relações Interpessoais, Saúde, Sustentabilidade e Tecnologia).
• Quais as principais dificuldades percebidas até então?
Regiane – As escolas contam com a disponibilidade de recursos humanos, formação pedagógica nos componentes do Projeto de Vida, Mundo do Trabalho e, Cultura e Tecnologias Digitais, bem como as Ementas e Objetos do Conhecimento que darão suporte às atividades de ensino. Nas escolas piloto houve mais avanços do que dificuldades. O principal foi mesmo devido à pandemia vivenciada por todos.
• Diante dos projetos pilotos. Quais os principais aprendizados dessas experiências? Como fazer para multiplicar isso?
Regiane – As dez escolas pilotos possibilitaram ao estudante o aprofundamento dos conhecimentos, competências e habilidades desenvolvidos na formação geral básica, visando à preparação para a vida e o mundo do trabalho, fortalecendo o protagonismo juvenil, a autonomia e a pesquisa.