Entre o desejo da renda extra e o risco de perder tudo

Apostas esportivas

Entre o desejo da renda extra e o risco de perder tudo

Ainda sem regulamentação, mercado em ascensão movimenta em torno de R$ 2 bilhões no país. No Vale, atividade conquista adeptos, que apontam controle emocional e conhecimento como essenciais para o êxito. Em nível nacional, grupo oferece auxílio a quem sofrem com o vício

Entre o desejo da renda extra e o risco de perder tudo
Ahne joga há cinco anos e concilia trabalho com apostas. Quando pode, acompanha ao vivo as partidas em que arrisca palpites. (Foto: Mateus Souza)
Vale do Taquari

“No início, foi muito difícil. Hoje posso dizer que sou consistente. Mas isso levou algum tempo”. Jean Todeschini Tasca, 41, entrou no mundo do ‘Trading Esportivo’ há três anos. Após um início difícil e perdas, se especializou. Passou a obter lucratividade após um bom tempo de estudo. Hoje, é trader esportivo e faz mentorias e treinamentos.

Tasca está entre tantos moradores da região que colocam dinheiro em uma plataforma de apostas esportivas, em busca do retorno financeiro. Vão desde partidas das principais ligas de futebol da Europa até confrontos da Série B do Campeonato Brasileiro. É um mercado que cresce a cada ano.

Tão atrativo quanto traiçoeiro, o mercado das apostas esportivas aguarda regulamentação no país. Hoje, a atividade não é proibida, mas a falta de segurança jurídica faz com que as casas do ramo se hospedem em países como Malta ou Curaçao, onde operam de forma mais efetiva.

Estima-se que o setor movimente em torno de R$ 2 bilhões por ano no Brasil. O governo federal acredita que, com uma legislação específica para o setor, seja possível arrecadar até R$ 700 milhões em impostos. Há, dentro do Ministério da Economia, um grupo que trabalha na elaboração de um projeto de regulamentação. Entretanto, só deve sair do papel no fim de 2022.

Gestão, controle e método

Tasca se tornou um dos mais conhecidos jogadores do Vale. Ele tem um canal na rede social Telegram, onde passa dicas e ensinamentos para cerca de 150 pessoas. Para chegar a esta condição, passou por dificuldades. Entrou no ramo em busca de uma renda alternativa, mas perdeu dinheiro e teve muitos problemas.

Após as desilusões, criou coragem para se especializar e superar o preconceito que parte da sociedade tem com as apostas esportivas. Assistiu vídeos, estudou, fez cursos e começou a criar métodos de trabalho. “É puro conhecimento. Você pode prever o que vai acontecer numa partida se souber fazer uma boa análise”.

No trading Tasca diz que existem três pilares fundamentais para obter êxito: gestão de banca, controle emocional e método. “Tem como ganhar dinheiro? Sim, como em qualquer profissão. É preciso comprometimento e, sobretudo, saber perder. As apostas muitas vezes te deixam à beira do abismo”.

Para quem inicia no ramo, Tasca diz que a quantidade de valor investido não importa. “Sempre aconselho a utilizar aquilo que você pode perder. Se não tem muito dinheiro, não tem problema. O que importa é começar certo”. Quanto ao gerenciamento da banca, é direto. “Trabalhe sossegado, sem medo de errar e perder. Mas saber se terá lucro ou não, é só a longo prazo”.

Segunda profissão

Engenheiro ambiental, Lucas Ahne, 28, começou a apostar em 2016. Jogava valores baixos. Com o tempo, o lazer agregou renda a ele. Todos os dias, acessa o site da Bet365, uma das maiores do mundo no ramo. Para manter o controle sobre as apostas, anota todas as entradas e saídas em uma tabela.

Segundo Ahne, nas apostas esportivas, é sempre recomendado pensar a longo prazo, além de equilíbrio. “Sei de amigos que foram com muita sede ao pote e queriam ganhar bastante no início, mas perderam dinheiro. Isso acontece com mais de 90% dos apostadores. É bom ganhar, mas para perder é muito mais rápido”, frisa.

Hoje, Ahne divide as atenções do trabalho com as apostas. Em meio aos projetos da sua área, tira um tempo para acompanhar seus jogos. “Hoje é uma questão de lucratividade. Virou profissão junto com a engenharia. Me dedico muito a isso. É um lazer, mas faço também porque tenho retorno financeiro.”

Consultoria

Deivid Brizolla, 26, morador de Lajeado, trabalha em uma revenda de automóveis. Nas horas vagas, participa de apostas esportivas. Iniciou em 2018, como uma brincadeira. Hoje, faz do jogo uma forma de obter renda extra. Só num dia, já tirou R$ 4 mil.

“Iniciei daquele jeito, apostando que o Grêmio iria ganhar, ou que o Inter iria perder. Aí você começa a ganhar e gostar. Bota um pouco mais de dinheiro e dá certo”, comenta. Mas como se dar bem neste ramo? Brizolla participa de um grupo de 30 pessoas, de diversos cantos do país. Eles pagam uma consultoria especializada em apostas esportivas.

Segundo Brizolla, possibilita palpites mais seguros e menor risco de ficar sem dinheiro. “Temos uma planilha onde dividimos a banca por unidades, para não sair do controle. Se tu perde sete unidades, não aposta mais naquele mês”.

Uma das estratégias para evitar sequências ruins é apostar nos chamados “mercados estranhos”. Ou seja, competições esportivas desconhecidas ou ligas de países onde há pouca informação. “Gostamos mais de operar na chamada várzea, tipo a Divisão de Acesso do RS, a Série A2 do Rio. Nesses locais, você consegue buscar informações mais acertadas”.

Jogador compulsivo

Nem todos os jogadores, contudo, são bem-sucedidos nas apostas esportivas. Pelo contrário. Há pessoas que vão da ilusão em ganhar muito dinheiro à ruína em pouco tempo. Jogam, perdem e, desesperados, tentam recuperar o investimento perdido. O jogo torna-se muito mais que um vício, uma doença.

Este é o “jogador compulsivo”. Pessoas em que o jogo causou contínuos e crescentes problemas na sua vida. Na maioria dos casos, não se reconhecem como “doentes”. Mas que podem se recuperar. Iniciativas como o “Jogadores Anônimos” buscam ajudar aqueles que sofrem com isso.

No Brasil, existe desde 1993 e atua sobretudo nas capitais. Em sua página na internet, se descrevem como uma “irmandade”, onde compartilham experiências, força e esperança com o intuito de resolver o problema comum. O único requisito para participar é o desejo de parar de jogar. O programa de recuperação do grupo é baseado em 12 passos de recuperação e 12 passos de unidade.

Limites

Para o economista Eloni José Salvi, quanto menos as pessoas conhecem os esportes em que apostam, maiores são as chances de perder. Por isso, ressalta que apostas devem ser feitas sempre com dinheiro que não prejudique as finanças pessoais ou da família em casos de perda.

“Isso deve ser feito com muito conhecimento e cuidado, principalmente de não saber a hora de parar”, frisa. Aos que embarcam neste ramo, Salvi recomenda que se defina um limite de valor a ser apostado e o limite para sair com os resultados desejados.

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