Em meio a tantos estímulos, dos filmes por streaming, mensagens dos grupos de amigos no WhatsApp e dos jogos eletrônicos, manter a concentração parece cada vez mais difícil. A imersão digital traz um senso de urgência, de que tudo precisa ser instantâneo, rápido e objetivo.
Neste ambiente tecnológico, o lúdico se confunde com as obrigações da realidade. Indiferente da faixa etária, seja da criança na sala de aula até os adultos no trabalho, a capacidade de manter a atenção representa uma qualidade fundamental entre quem atinge as metas ou fica para trás.
“Estou faz mais de 25 anos dando aulas. Tem sido cada vez mais difícil manter a atenção da gurizada. Estão muito dispersos, com outros objetivos. Mesmo sentados na nossa frente, parecem focados em outros assuntos e não naquele momento.
O contexto apresentado pelo professor dos cursos de Engenharia da Computação e de Software da Univates, Fabrício Pretto, é uma amostra de como as ferramentas tecnológicas podem interferir sobre a concentração. “É muito difícil competir com essa variedade. São vídeos no youtube, podcasts, games.”
De acordo com ele, o professor precisa “tirar coelhos da cartola”. Criar modelos que tornem a sala de aula mais interessante. “Muitos ficam mais de cinco horas com atenção total em um jogo de videogame. Mas não conseguem se manter focados por um período de 50 minutos na sala de aula.”
O desafio, realça Pretto, é fazer com que o nível de atenção na frente da tela seja repetido na vida real. Neste processo, aparece o termo gamificação (também chamado de ludificação). Conceito criado na década de 70 pelo segmento empresarial dos Estados Unidos, parte do princípio de usar ferramentas de jogos no mundo do trabalho. “Nas empresas, surgiu para maximizar a participação dos funcionários, com objetivo de melhores resultados.”
Essa técnica se popularizou a partir de meados dos anos 2000, justo no período de maior capilaridade das tecnologias de informação e dos jogos. Por meio de objetivos, desafios e recompensas, se busca estimular uma participação mais engajada nas atividades propostas, diz o professor Fabrício Pretto.
Neste contexto, buscar um equilíbrio entre a concentração e a distração, segundo o médico Nelson Spritzer, especialista em neurolinguística. É a capacidade de ser eficaz para buscar os resultados necessários, sem deixar de lado o espaço para o descanso, o lazer, ou as emoções agradáveis.
Habilidade e concentração
Todas as pessoas são dotadas da capacidade de prestar atenção. O foco é uma aptidão necessária para a própria sobrevivência do ser humano frente aos problemas e desafios do dia a dia. Uns, no entanto, têm maior dificuldade em desenvolver esta habilidade, enquanto outros conseguem lidar melhor com a concentração.
Para Nelson Spritzer, o foco é nada mais do que a capacidade em manter a atenção em algo. Seja no ambiente de trabalho, ou na vida pessoal, estar focado é essencial para alcançar um objetivo, aquilo que se espera. As distrações, contudo, surgem como obstáculos. Superá-los vai da capacidade de cada um.
Nos momentos de distração excessiva, a pergunta que ronda a cabeça das pessoas é: “onde foi parar o meu foco?”. Recuperá-lo, e treiná-lo são tarefas essenciais. É um treinamento quase que diário, segundo Spritzer. “Nosso cérebro é treinável. É desenvolvido para isso. E o foco é a mesma coisa. Se tiver tempo para treinar, eu vou desenvolver esse foco”, explica.
Atenção ao problema
Nem sempre estar totalmente concentrado é um bom sinal. Principalmente quando o foco está em um pensamento ou situação negativa. Nesses casos, Spritzer acredita que as próprias distrações podem ser benéficas ao ser humano.
“Os eventos internos e externos podem nos causar distração. No caso do interno, são as nossas emoções. Se a pessoa tem uma doença, ou qualquer tipo de mal estar, quando vai se distrair, cria um estado emocional bom. É uma maneira de tirar esse foco negativo”, exemplifica.
Se o estresse é uma emoção que piora o foco, existem outras que aumentam a capacidade produtiva do ser humano. “A motivação, a alegria, a paz interior são emoções que nos deixam mais eficazes, trazem mais resultados”.
Práticas para manter a concentração
Mindfullness: atenção e consciência plena
Estudos apontam que, em 50% do tempo, nossa mente está “em outro lugar”, pensando em outras coisas. No trabalho, isso ocorre com frequência. Por isso, práticas como o mindfullness surgem como alternativas para ajudar a melhorar a qualidade de vida.
A instrutora de mindfullness, Kareen Martinato destaca que a prática busca treinar a atenção e consciência plena. “Na maior parte do tempo, nossa mente funciona no modo automático e não nos damos conta disso. Por isso, é preciso ter consciência do que está ocorrendo conosco. A partir disso, se desenvolve a capacidade de criar um espaço de autocuidado para melhorar a tensão do dia a dia. Ou seja, sair desse modo automático e focar em uma coisa de cada vez”, explica.
No cotidiano, sobretudo profissional, há a ideia frequente de que as pessoas são “multitarefas”. Ou seja, desempenham várias atividades ao mesmo tempo. Kareen alerta que, nestes casos, os prejuízos são maiores.
“Dizem que assim seremos mais produtivos. Isso é uma ilusão. Assim, podemos perder até 40% da nossa produtividade e, de brinde, ganhar uma sensação maior de cansaço físico e mental. Por isso é importante nos concentrar no que é prioritário para nós. É fazer uma coisa de cada vez”.
Meditação: a busca pelo autoconhecimento
Prática milenar, a meditação ganha adesões como forma das pessoas buscarem o autoconhecimento. E, a partir dele, trabalhar o foco e a concentração de forma equilibrada. O terapeuta Augusto Miranda afirma que os benefícios atingem tanto o corpo quanto a mente.
“A meditação é acessível a todo mundo, e podemos encontrar diversas formas de meditar. Estamos muito focados no que vem do exterior, mas todas as soluções estão internas. Ela não precisa de nenhum recurso, a não ser o próprio corpo e a respiração. Os benefícios são visíveis”, sintetiza.
Dentro da meditação, existe o thetahealing, que trabalha com as chamadas crenças limitantes. “São os medos e traumas que temos. É uma prática muito voltada à parte terapêutica. Quando você entra nessas ondas cerebrais, conseguimos acessar o subconsciente. Para todas as perguntas feitas, as respostas vem de forma muito profunda”.
Segundo Miranda, as pessoas que procuram a meditação, com o tempo, querem continuar com este contato. “Não é fugir da realidade, mas entender diferentes possibilidades do que está ali fora. Entender que o problema existe, e que há solução.