Entre a magia e os perigos da exposição

COMPORTAMENTO

Entre a magia e os perigos da exposição

Ainda crianças, elas são fenômenos das redes sociais, com vídeos no YouTube ou postagens no Instagram. Para que a atividade como “blogueiras mirins” seja saudável, no entendo, o acompanhamento dos pais é essencial

Entre a magia e os perigos da exposição
Ana Clara interpreta a personagem Clarinha, a Tracinha que conta histórias em eventos e pelas redes sociais.

Por trás das câmeras, o sorriso tímido e a voz doce de Ana Clara Krug Cassol, de apenas 10 anos, ganharam o coração de crianças e adultos da região e ela ficou conhecida por contar histórias infantis. A ideia surgiu há três anos, quando a menina pediu à mãe, Patrícia Krug, 40, para criar um canal no YouTube. Com o gosto pela leitura e o amor por livros, esse foi o tema escolhido para compartilhar conteúdos nas redes sociais.

“Eu li a coleção ‘Querido Diário Otário’ em poucos dias e foi quando eu percebi que gostava muito disso. Então comecei a decorar as histórias e contar”, diz Ana Clara, carinhosamente chamada de Clarinha, a Tracinha.

Para dar vida à personagem, o Instagram, Facebook e Youtube, com 401 inscritos, tornaram-se ferramentas importantes. Mas todas as redes sociais são administradas pela mãe. “Ela tem acesso para responder as pessoas que volta e meia conversam com ela, mas precisa estar comigo. Eu sou a mãe, e faço isso até para ela se sentir segura com quem está falando”, destaca Patrícia.

Com o tempo, Clarinha passou a ser conhecida também fora das redes sociais e a participar de eventos presenciais. Ela já passou por diversos municípios do Vale do Taquari e foi homenageada pela feira do livro de Cruzeiro do Sul em 2019.

Mas foi depois de uma contação de histórias em um evento da Sicredi que a demanda aumentou. E, no início, a procura por Clarinha assustou Patrícia.

“Sabemos que as redes sociais oferecem um mundo de possibilidades, mas se não for bem administrada, ela pode se tornar perigosa”, acredita a mãe. “Por isso sempre fiz questão de deixar a Ana segura em relação a isso e dizer exatamente o que ela poderia ou não fazer”, ressalta.

Cuidados redobrados

Segundo Patrícia, a filha conheceu muitas crianças no processo, e as pessoas a reconheciam na rua. Por compartilhar conteúdos educativos, o desenvolvimento da menina também foi um ponto positivo.

“Talvez a única coisa negativa é que em alguns momentos eu recebia convites de homens mais chamando ela para conversar. Eu logo questionava se eles tinham percebido que era uma página de incentivo à leitura e que uma criança estava ali e acabava bloqueando os contatos”, ressalta.

Outra questão trabalhada por Patrícia foi a não aceitação dos vídeos por parte de algumas pessoas. Assim, Clarinha também aprendeu a lidar com as frustrações. “A internet é algo benéfico, mas que ao mesmo tempo pode ser perigosa se não tiver esse olhar de zelo e proteção à criança”, acredita a mãe.

Influenciadora mirim

Isabelle, de apenas 7 anos, possui 73,6 mil seguidores no Instagram.

A lajeadense Isabelle de Almeida Follmer, de 7 anos, também começou cedo a aparecer nas redes sociais. Ela tinha apenas 3 anos e já posava para fotos compartilhadas no Instagram.

Com um rosto de boneca e roupas diferentes, ela conquistou os internautas e passou a receber parcerias de marcas infantis. Tudo foi feito de forma natural, com a supervisão e apoio da mãe Julia Emanuelle de Almeida Follmer.

“Apesar de ser algo bacana, a Belle não tinha entendimento sobre esse mundo digital e precisava desse cuidado”, conta Julia.

Com o tempo, pessoas mais próximas da família passaram a elogiar as produções, comentar e pedir por mais postagens. Foi naquele período que Belle começou a questionar o que era o Instagram, quantos seguidores ela tinha e outras curiosidades sobre a plataforma.

“Ela acha bonito dizer que tem Instagram e “seguimores”. Porém sempre leva na brincadeira, assim como sempre levamos a situação dela nas redes sociais”, ressalta a mãe.

Julia conta que a família nunca tratou as publicações como trabalho ou obrigação. “Quando surge alguma proposta de divulgação, nós amamos, mas deixo sempre bem claro que ela é uma criança, e que possui vontades próprias, nós nunca a obrigamos. As coisas devem fluir conforme o seu tempo”, ressalta a mãe.

À medida que as pessoas gostavam da pequena influenciadora, o número de seguidores aumentava. Hoje ela possui 73,6 mil seguidores no Instagram. Por algum tempo, Belle também participou de um grupo de influenciadores mirins e ficou conhecida por todo o Brasil.

Mesmo com a grande visibilidade, as publicações sempre foram feitas de forma leve, a fim de evitar frustrações. “Passamos um tempo sem postagens, porque ela não queria fotografar. Depois ela começou a querer fazer vídeos e eu passei a liberar a internet para os stories, mas tudo demanda muita dedicação nesse meio. O conteúdo tem que ser atraente aos olhos dos internautas, caso contrário, as pessoas deixam de seguir”, destaca Julia.

Hoje, além de Belle, ela também é mãe da Manu. Com o cuidado das duas, o tempo dedicado às postagens diminuiu. Mas hoje Belle já entende sobre o perfil e o que gosta de divulgar nas redes sociais. Segundo Julia, a menina se tornou mais expressiva e comunicativa, e esse é considerado o lado positivo da exposição.

Mas, ao mesmo tempo, ela se preocupa com o tipo de pessoas que seguem a filha, cuida dos perfis falsos e do uso de imagem sem autorização. Julia e Belle não sabem se a menina seguirá no mundo digital. Mas o perfil será alimentado pela mãe quando possível e de acordo com os “recebidos” da influenciadora mirim.

“Por enquanto, mamãe que lute com essa pequena e linda influencer mirim lajeadense”, brinca Patrícia.

Na brincadeira, um alerta

Se por um lado a exposição das crianças às redes sociais desenvolve a expressão e oratória, por outro exige um olhar atento dos pais e responsáveis.

Apesar da idade permitida para criar uma conta nas plataformas ser de 13 anos, o estudo TIC Kids Online Brasil de 2016, do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), mostra 86% das crianças e adolescentes de 9 a 17 anos com perfis próprios nas mídias sociais.

Youtube, Facebook e Instagram são as plataformas mais comuns. Mas um novo aplicativo ganhou as redes e vem viralizando vídeos de jovens com as “dancinhas” do TikTok.

De acordo com a psicopedagoga Cristiane Loposzinski, 44, sócia proprietária do Espaço Pé com Pé, desde muito pequenas as crianças têm uma exposição excessiva às telas e, devido ao contato precoce, as redes sociais fazem parte da socialização dos pequenos.

“Pensando que a via de maior aprendizagem da criança dá-se pela visual, ela vai criar modelos através daquilo que está assistindo. Vai querer imitar o que está sendo usado pelo adulto como distração, mas que para ela é o correto”, alerta a profissional.

Além disso, quando uma criança é exposta nas redes sociais, pessoas mal intencionadas podem buscar endereços, dados pessoais e, em muitos casos, imagens inadequadas das crianças.

A psicopedagoga também destaca a dificuldade para os influenciadores mirins diferenciarem o imaginário do real. “Nesse momento os pais devem mostrar para as crianças que existe uma realidade social diferente daquela em que vivem, e que nem sempre elas vão conseguir as coisas de forma fácil na vida”.

Em alguns casos também é importante cuidar com a exposição do corpo das crianças e jovens, além de conteúdos inadequados para a idade, como as músicas, por exemplo. Mas, ao mesmo tempo em que é preciso o alerta, a psicopedagoga afirma terem muitas crianças com bons conteúdos nas redes sociais, como contação de histórias ou jogos pedagógicos.

“Se diminuirmos o tempo de uso das telas, as crianças terão mais tempo para fazer atividades como brincadeiras ao ar livre, pinturas ou desenhos”, destaca.

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