Em 12 horas, 94 mil seguidores a mais nas redes sociais. Desde que assumiu o governo gaúcho, 535 novas pessoas acompanham as mídias de Eduardo Leite todos os dias. Mas a partir do momento em que afirmou ser gay no programa “Conversa com Bial”, da TV Globo, o impacto alcançado pelo governador atingiu outro patamar.
Para o doutor em Comunicação e membro do coletivo Aquenda, que luta pela diversidade de gênero, Tainan Pauli Tomazetti, a atitude é um marco histórico. Ele availia no discurso, porém, uma forma de se afastar da pauta. “Quando ele coloca ‘não sou um gay governador, e sim um governador gay’, isso demonstra essa possibilidade de se eximir da sua sexualidade”. Para Tomazzeti, o discurso deve ser acompanhado de ações práticas. “Ser gay não significa nada se você não está lutando pelo progresso da pauta”, acrescenta.
A visão crítica é compartilhada pelo advogado e diretor executivo da ONG Somos, Caio Klein. A organização trabalha com direitos dos LGBTs. Para Klein, a responsabilidade de Eduardo Leite para apoiar políticas públicas de diversidade aumenta.
“Uma vez que o governador é membro assumido dessa comunidade, que sejam criados mecanismos dentro dos serviços públicos do Estado”, manifesta.
De acordo com os grupos de defesa dos direitos aos homossexuais o tema seria irrelevante em uma sociedade sem discriminação e violência. A discussão aberta da orientação sexual de pessoas públicas se torna fundamental na atual conjuntura.
Influência política
A posição de Eduardo Leite repercute em Brasília. O deputado federal e presidente do PSDB gaúcho, Lucas Redecker, acredita que o governador adianta o tema para retirar da pauta na corrida presidencial. “Ele antecipa algo justamente para tirar isso da campanha eleitoral”, afirma.
A disputa interna entre tucanos para as eleições está consolidada. Os governadores de São Paulo, João Dória, e do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, são os principais nomes. Para Redecker, as bandeiras econômicas são muito semelhantes, mas Leite ganha na capacidade de diálogo.
O líder do partido no Rio Grande do Sul acredita que não houve cálculo político na afirmação de Leite. Ele nega as especulações sobre uma pesquisa ter sido encomendada para medir o impacto da fala. “Eu, presidente estadual, fiquei sabendo pela televisão”.
Divergências no parlamento
Outros parlamentares da bancada gaúcha tem uma opinião divergente. O deputado federal Ubiratan Sanderson (PSL) estranha em três anos de mandato como governador a orientação sexual nunca ter sido pautada por Leite. “Agora, com o nome como presidenciável, se declara gay sem ninguém ter perguntado. Ele não foi questionado no programa”.
Já o parlamentar Elvino Bohn Gass (PT) avalia que a gestão à frente do governo do RS descredencia Leite como candidato à presidência. “Como gestor, a vida pessoal dele não importa. O que importa é como ele cuida da vida dos gaúchos, e nisso ele é um fracasso”.
ENTREVISTA
“Ele ganha mais do que perde”
Estratégia política ou desabafo pessoal, a repercussão da entrevista fortalece a popularidade de Leite. Resta saber se ele consegue vencer as prévias partidárias. E mais do que isso, se consolidar como uma força capaz de desbancar Lula ou Bolsonaro. Esta é a análise de Gustavo Grohmann, doutor em Ciência Política e professor da UFRGS.
A fala do Eduardo Leite foi uma estratégia política pensando na eleição?
“Eu não diria que foi somente pensando nesta eleição. Ele é um político e políticos trabalham em eleição. Não foi pensando em uma ou outra eleição. É uma carreira política como um todo. Não há nenhum demérito nisso. Ele está jogando limpo. Porque ele falou o que ele é. É muito melhor que ele falou politicamente uma verdade, do que se ele tivesse falado politicamente uma inverdade”.
Ele ganha capital político por assumir a sexualidade?
“Há uma agenda política em torno desta questão. Ele pode ganhar por um lado e perder por outro. Pessoas com preconceito, talvez se afastem dele. Pessoas que sejam progressistas e primem pela liberdade sexual, podem se aproximar da figura. Talvez ele ganha mais do que perde. Uma boa parcela dos eleitores do RS já sabiam dessa opção dele, e mesmo assim, não se eximiram em votar nele”.
Na disputa interna pelas eleições presidenciais? Quais são as chances de Eduardo Leite em relação ao João Dória?
“Eu acho que o Eduardo Leite está em uma posição muito confortável. Porque ele é muito jovem. Ele tem um largo espaço para construir uma carreira política de enorme grandeza. Basta que o nome dele seja citado, ele já está ganhando. Se ele tem chance de ganhar do João Dória, na disputa interna, eu não saberia dizer. Talvez nem seja interessante porque o terreno político está muito conflagrado. E não vai ser uma única candidatura que vai desarmar a conflitividade existente. Para desarmar o campo autoritário, apenas uma ampla coalizão”.
Leite tem condições de ocupar o tão falado lugar da terceira via?
“Ele tem condições de ser uma terceira via. Não sei se tem força política para isso. Ele é muito jovem. Para a terceira via, não importa muito quem esteja a frente dela. O que importa é uma ampla força que deslegitime o autorismo. Porque não se trata apenas da força política partidária. Nós estamos em um momento conturbado enquanto sociedade, e um partido não será capaz de desarmar isso. A última pesquisa deu mais gente votando no Lula. Em termos eleitorais tudo pode acontecer. Os que votaram no Bolsonaro, para ser anti Lula no passado, estão votando no Lula para ser anti Bolsonaro. Volto a dizer, a minha preocupação é com a sociedade. Para dar certo, a terceira via tem de ser apartidária”.