Quando assessor da Reitoria da Univates em áreas não acadêmicas de interesse regional, em 2001 focamos a cadeia produtiva do leite, importante por envolver dezenas de milhares de produtores rurais. Com o diagnóstico de pesquisa abrangente e ampla discussão setorial, vimos o que necessário para organizar e desenvolver o segmento. Agregam-se ao trabalho, de forma decisiva, as Cooperativas Dália e Languiru. Em duas visitas técnicas à Galícia/Espanha (2007 e 2010) vimos o modelo necessário, emitindo-se, na FestLeite de Anta Gorda, a “Carta de Galícia”, com os princípios de um Programa consistente, inédito no Estado e no País. Nascem, então, os conceitos “Vale dos Lácteos” e “Vale dos Alimentos”.
Com a posse de Tarso Genro em 2011, seu laborioso secretário estadual da Agricultura, Luiz Fernando Mainardi,
conheceu nosso modelo laticinista em reunião na Dália. Como consequência, convida o Vale do Taquari a expandi-lo no RS para a organização e desenvolvimento da cadeia produtiva do leite estadual. Em 2012 Mainardi lidera comitiva oficial à Galícia, firmando Convênio para a migração e apropriação de know how. Signatários: Governos da Galícia e RS, Univates/Codevat e CIC Vale do Taquari. Para coordenar o trabalho, nossa assessoria é contratada por Ocergs e 5 grandes Cooperativas, inclusive Dália e Languiru e colocada à disposição do Governo.
Em dezembro de 2013 a Assembleia Legislativa aprovou, por unanimidade, Lei instituindo um Programa de Estado para a organização e desenvolvimento do setor leiteiro (PRODELEITE) e, em outra Lei, um Fundo setorial para financiar as ações necessárias (FUNDOLEITE), apropriando modelos vistos na Galícia/Espanha, USA, Canadá, Israel, Holanda, Uruguai e Nova Zelândia, através da Câmara Setorial do Leite do RS, Para operar o modelo estipulou ao Estado conveniar com entidade privada representativa do setor. Surge, para isto, em 2014 o Instituto Gaúcho do Leite (IGL), privado, representativo, constituído por 45 entes ligados ao Setor. Corroborando este esforço, o fato de a cadeia leiteira representar, em 2014, 9,4% do PIB gaúcho.
Desde o início SINDILAT/RS, dois laticínios multinacionais e uma grande Cooperativa foram contra. Recolheram o Fundoleite em depósitos judiciais para amparar ações na Justiça, posteriormente vencidas em todas as instâncias. Privaram o Fundo de 49% da arrecadação, prejudicando os trabalhos do IGL, a cadeia leiteira e a economia gaúcha. A partir de 2015, com a complacência do Secretário da Agricultura do Governo Sartori, e ao arrepio da legislação, aqueles poucos desarticulam o IGL e a organização setorial em implantação.
Pois agora, querem editar Decreto Estadual alterando os critérios – previstos em Lei – para uso dos vultosos recursos parados no Fundoleite, ignorando, inclusive a Lei maior, a do Prodeleite que rege todo o modelo.
Aqui, o escândalo. Primeiro, a aberração jurídica: na surdina, alterar uma Lei através de Decreto do Executivo, driblando a chancela dos Deputados. Por segundo, o mecanismo proposto para uso dos recursos do Fundo, inclusive depósitos judiciais vinculados, beneficia o mesmo grupelho.
Trago o fato por exemplificar os bastidores do Poder Público, em todos os níveis. Poucos se articulam para espoliar a larga maioria, valendo-se de pretensa impunidade. E o porquê disto? Um dos fatores, nosso Judiciário: lento e omisso. O outro, nossa omissão.
O caso relatado atinge em cheio a nós “valedotaquarianos”. Grupinho público privado nos afrontou ao desmontar um modelo gestado aqui, sob a liderança de Univates, Codevat, Amvat, CIC Vale do Taquari e Cooperativas Dália/Languiru. Nós e os gaúchos em geral o deixaremos? Se sim, merecemos um sincero muar.