A gravidez não foi fácil para Daniele Carine Wolff Immich, 34. Durante sete meses, diversas internações e outros problemas de saúde resultaram no nascimento prematuro de Vitória Carolina. 24 horas depois, a menina, com hoje quatro anos e meio, teve complicações e entrou em coma. Entre problemas pulmonares, a necessidade de transfusão de sangue e intubações, Vitória ganhou alta hospitalar e foi considerada um milagre.
Aos três meses, ela teve uma gripe grave e, depois de voltar à UTI, teve uma parada respiratória e problemas no desenvolvimento. “A Vi chorava muito, gritava, ela era rígida, era difícil para dar banho, trocar fralda”, conta a mãe. Com nove meses e diversos exames, descobriram que a menina tem microcefalia. Ela também foi diagnosticada com esquizencefalia, paralisia cerebral, espinha bífida, disfagia, recusa alimentar extrema, e epilepsia de difícil controle.
“O diagnóstico foi difícil, mas eu disse que daria o meu melhor pra ela viver”, lembra a moradora de Lajeado.
Tem dias mais difíceis do que outros, mas a relação das duas ensinou a mãe sobre o amor e paciência, e foi reforçada pela fé. Muitas vezes é preciso tentar alimentar a menina por mais de 15 minutos e mesmo assim, a recusa faz com que ela fique mais de dez dias sem comer. Mas Vitória é forte e hoje balbucia algumas palavras e está sempre sorrindo. As fisioterapias ajudam, mesmo que ela não possa caminhar.
Logo que a filha nasceu, a mãe deixou o emprego e, ao mesmo tempo em que se dedicava à Vitória, também criou o filho João Victor, de sete anos. Daniele e João são parceiros, tanto na educação dele quanto no cuidado da irmã, e o que a família mais gosta de fazer é brincar.
“Sempre tentei ser uma mãe presente também para o João. Ele é minha joia. Soube entender e me ajuda, às vezes até nos exercícios da Vi. Quando fico meio pra baixo ele vê meu sofrimento, mas fica lá do meu lado. Ele é a minha base”, conta Daniele. Ser mãe de João e Vitória mudou a vida dela, que faz de tudo para vê-los felizes.

Daniele se dedica integralmente ao cuidado dos filhos João Victor e Vitória / Crédito: Primiê Fotografia
“A parte mais difícil é o emocional”
Perto das 6h, Ingrid Eichler, 39, já está de pé com o filho Fernando, de três anos, no colo. É assim que começa a rotina de cuidados do menino diagnosticado com gangliosidose GM1. Sem que ele consiga ver, sorrir ou mexer nenhum músculo, 24 horas do dia de Ingrid são dedicadas ao filho desde que ele nasceu.
Fernando foi diagnosticado aos nove meses. Depois de diversos exames, os médicos deram um prazo de dois anos de vida para o menino. “Foi muito difícil receber o diagnóstico, perdi o chão”, conta.
Mas ela não desistiu, e se alternava entre os cuidados do menino e o trabalho. Foi só quando a doença se agravou que ela conseguiu um auxílio doença pelo INSS e passou a se dedicar integralmente a Fernando que divide o amor da mãe com Anna Clara, 15, e Mariana, 10.
“Recentemente o Fê ficou 61 dias na UTI. Minhas filhas se acostumaram com os momentos em que não posso dar atenção a elas e entendem. É um constante aprendizado. Muitas vezes olho pra cima e peço pra Deus me orientar, porque um erro meu pode custar a vida dele”, conta.
Além dos medicamentos, Fernando passa por diversos procedimentos durante o dia. Perto da meia noite, ela coloca o filho na cama, mas não lembra a última vez que teve uma boa noite de sono, já que está sempre atenta aos aparelhos.
Apesar dos desafios que ela enfrenta todos os dias, o sonho de Ingrid sempre foi ser mãe e a alegria faz parte da rotina da família que vive em Boqueirão do Leão. “Estar com meus filhos é maravilhoso. Acho que a parte mais difícil é o emocional. O medo constante, a angústia, a responsabilidade, a incerteza. Cuidar do Fernando é um prazer, mas o medo de errar é grande. Só quero que ele tenha qualidade de vida, assim como minhas filhas, e que ele não sofra pelo tempo em que estiver com a gente”, diz a mãe.

Daniele se dedica integralmente ao cuidado dos filhos João Victor e Vitória Ingrid é mãe de Fernando, Anna Clara e Mariana. Maternidade sempre foi um sonho / Crédito: Arquivo Pessoal
“Uma mãe nunca deixará de fazer algo por seu filho”
Largar tudo e se dedicar integralmente aos cuidados da filha. Esta foi a solução encontrada por Cristiane de Oliveira Schneider, 39. Moradora de Cruzeiro do Sul, ela viu sua vida mudar quando a pequena Luana, na época com um ano de idade, sofreu uma encefalite viral.
A enfermidade atingiu o cérebro da menina, que acabou perdendo todos os movimentos, além de não conseguir falar. Desde então, necessita de um acompanhamento 24 horas por dia. Cristiane, que trabalhava desde a adolescência, deixou o emprego para ficar ao lado da menina.
A rotina diária mudou. Enquanto o marido e o filho mais velho, hoje com 18 anos, trabalham fora, ela acompanha Luana em casa, na Apae, em Lajeado, ou nas sessões de fisioterapia. “Ela se alimenta por sonda, usa fraldas. É totalmente dependente de mim. Mesmo quando ela vai para a escolinha eu tenho que estar por perto”, comenta.
O que move Cristiane, mesmo com tantas adversidades, é a possibilidade de dar uma vida melhor para Luana, que completa sete anos este mês. A luta é diária, mas o sentimento materno, para ela, sempre falará mais alto.
“Os médicos não nos dão muita expectativa, mas estou sempre correndo atrás. Vou fazer de tudo para que ela tenha uma vida melhor, pois a fé é a última que morre e não perco minha esperança. Uma mãe nunca deixará de fazer algo pelo seu filho. Tudo o que estiver ao meu alcance, eu vou fazer”, afirma.
Mesmo com toda essa dedicação e o pouco tempo livre para si, Cristiane busca formas também de se manter forte mentalmente. “Preciso cuidar um pouco de mim também, agora voltei a fazer caminhada quando ela está na Apae. E, quando vamos em um restaurante, ou até na praia, sempre levamos ela. Nunca deixamos de fazer as coisas”.

A possibilidade de dar uma vida melhor à Luana é o que motiva a mãe Cristiane / Crédito: Arquivo Pessoal
“O meu fã número um sempre foi ele”
Gabriel, 20, gosta de ouvir música e ajuda a mãe nas tarefas de casa. Logo que acorda, deixa a cama arrumada e ajuda a pôr a mesa do café. Apesar de, hoje, mais independente, o Gabi vai ser sempre criança no coração dos pais. Principalmente da mãe Tatiane Ávila Silva, 37, que se dedicou integralmente ao cuidado do filho por 18 anos.
Com um mês de vida, Gabriel teve convulsões e passou oito dias internado. Teve alta hospitalar com a epilepsia controlada, mas com desenvolvimento comprometido, de modo que a idade mental do menino não é a mesma da física.
“Um de nós sabia que ia ter que abrir mão de uma vida profissional naquele momento para se dedicar exclusivamente a ele, então eu fui de braços abertos para essa nova rotina de ser mãe 100% do dia”, conta Tatiane.
Atendimentos de fonoaudiólogos, neurologistas e fisioterapeutas eram sempre acompanhados pela mãe e aos dois anos e meio, Gabriel deu os primeiros passos e arriscou as primeiras palavras.
“Foi uma das partes que mais nos alegrou, porque ele demorou muito pra falar e assim que começou, não parou mais”, conta Tatiane. Na época, a família morava em Porto Alegre e se mudou para Lajeado em 2012.
Na nova cidade, Gabriel fez amigos na escola e ganhou mais independência. Quando ele tinha pouco mais de 10 anos, Tatiane voltou a estudar, mas foi só quando ele fez 18 que ela voltou ao mercado de trabalho, na área de contábeis, deixando o filho com uma cuidadora. Mesmo assim, ela ainda faz questão de buscar o filho na escola e ajudar nas tarefas.
“Eu sempre tive aquele meu companheiro de todas as horas, agora sinto falta disso. O meu fã número um sempre foi ele”, conta. Hoje, Gabriel já fala em ir para a faculdade e trabalhar e a mãe acredita no futuro do filho. Mas seu maior medo é que ele não seja aceito.
“Como mãe, a gente se preocupa muito, mas essa foi a melhor coisa que aconteceu. Eu olho pra trás e não vejo minha vida antes do Gabi. As coisas boas, e todos os aprendizados que a gente teve, foi tudo muito intenso. Com o Gabi a vida é mais colorida, tudo é melhor com ele”, afirma.

Tatiane se dedicou integralmente ao cuidado de Gabriel por 18 anos / Crédito: Bibiana Faleiro
ENTREVISTA
“Se faz necessário a construção de uma rede de apoio”
A psicóloga Tayna Rodrigues fala sobre a importância da saúde mental e emocional das mães de crianças especiais.
A Hora: Como lidar com situações onde a dependência dos filhos tende a se manter no futuro?
Tayna – Se faz necessáris a construção de uma rede de apoio, onde a mãe aciona pessoas de confiança para o auxílio nos cuidados diários e necessários. Também para que a mãe tenha alguém para dividir angústias, sofrimentos, questões emocionais e alegrias.
AH: Quais os principais cuidados para que as mães mantenham um equilíbrio mental?
Tayna – Primeiramente não anular sua individualidade, necessidades e desejos. Realizar atividades que atendam suas necessidades, desejos, bem estar, momentos prazerosos, saudáveis, dar atenção a sua rotina e que proporcionem conexão com elas mesmas.
AH: Como vocês, profissionais, trabalham a autoestima destas mães?
Tayna – Buscamos trabalhar a sua individualidade, fazendo entender a necessidade de se priorizar, a importância de se permitir relaxar e fazer atividades prazerosas, nesses casos é muito importante focar no que ela consegue modificar e entender se a situação está ou não no seu controle. Também é trabalhando a auto aceitação, manejo de suas emoções, conflitos, aceitação da realidade e confiança em si.