Nível do rio baixa e relembra ‘praias’ do passado

Rio Taquari

Nível do rio baixa e relembra ‘praias’ do passado

Reforma na barragem de Bom Retiro do Sul diminuiu as águas em 2,5 metros no fim de semana. Fenômeno levou saudosistas para a orla do Taquari atravessar a pé pontos do rio que costumam servir para navegação

Nível do rio baixa e relembra ‘praias’ do passado
Ilhas de cascalho se formaram no Taquari durante o fim de semana, em função da queda de quase três metros no nível das águas (Foto: Aldo Lopes)
Vale do Taquari

A Praia do Cascalho era um dos principais destinos dos veranistas no Vale do Taquari até a década de 70. Localizado próximo à Escadaria de Estrela, o espaço maior que o complexo da Polar atraia banhistas, pescadores e famílias inteiras nas tardes mais quentes do ano. Até concursos de belezas eram realizados no local.

“Quem não ia pra Tramandaí, ia pra praia do Taquari. Havia gente de todas as classes sociais, desde aquele que queria aproveitar uma tarde de lazer até os que vinham pra beira do rio lavar o carro ou as roupas”, relembra o membro do Instituto Histórico Geográfico do Vale do Taquari, João André Mallmann, o “Jam Brasil”.

Outros campings públicos do passado são citados pelo pesquisador. Entre eles, as prainhas de Lajeado (próximo ao Porto dos Bruder e da antiga Ponte de Ferro, na divisa com Arroio do Meio), o balneário de Muçum e a Praia da Figueira, em Cruzeiro do Sul.

(Foto: Aldo Lopes)

Todos esses espaços foram submersos pelas águas em 1976, quando foi inaugurada a barragem eclusa de Bom Retiro do Sul. Objetivo era tornar o Taquari navegável. Nesse período de quase cinco décadas, saudosistas puderam relembrar as praias do passado em períodos de manutenção da represa.

Foi isso que aconteceu nesse fim de semana.

Na manhã de segunda-feira, nível do rio voltava ao normal com fechamento das comportas (Foto: Fábio Kuhn)

Quase três metros a menos

Para realizar melhorias em um dos portões que possibilita a passagem dos navios, a barragem de Bom Retiro do Sul abriu as comportas e diminuiu o nível do rio para 9,5 metros no fim de semana – 2,5 metros a menos que o normal.

A operação iniciou na sexta-feira, 12, e se estendeu até o amanhecer da segunda-feira, 15. Com isso, surgiram “ilhas de cascalho” em meio às águas do Taquari.

Em entrevista ao programa Frente e Verso na manhã dessa segunda-feira, o engenheiro André Soares explicou que a diminuição no nível do rio foi necessária para secar a eclusa e iniciar o conserto no portão.

“Tivemos que drenar oito milhões de litros de água. Como a barragem tem alguns vazamentos, foi necessário baixar o nível do rio para fazer essas intervenções e secar a eclusa ”, detalhou.

Com a finalização dessa etapa, Soares informa que as comportas foram fechadas novamente. Ainda na segunda-feira, o leito retornou aos 11 metros. O trabalho para conserto da eclusa deve durar cerca de 30 dias.

Conforme o engenheiro, outras manutenções semelhantes com a baixa no nível do rio já aconteceram nos quase 50 anos da barragem. Última delas foi em 2005.

Caminhando pelas águas

“Taquari velho, o pessoal atravessando a pé como antigamente”. Com essa frase, Paulo Berti, 59, iniciou um vídeo sobre o movimento atípico de pessoas nas águas do rio durante a manhã de sábado. As imagens, compartilhadas inicialmente com amigos, ganharam as redes sociais no fim de semana.

O morador de Lajeado não chegou a conhecer as “antigas prainhas”. Entretanto escutou muitas histórias. As mais engraçadas delas envolviam a antiga rixa entre lajeadenses e estrelenses. “O pessoa ia pras festas em um dos municípios e tinham que voltar correndo pelo rio para não apanhar”, conta.

Outra lembrança compartilhada com Berti era a época em que as ilhas formadas no rio se transformavam em extensões dos restaurantes na barranca do Taquari. As pessoas levavam mesas para a água e eram servidos no local de banho, reconta Berti.

Para Jam Brasil, o fim das prainhas deixou órfã parte da sociedade que dependia desse tipo de lazer. “A barragem é importante para questão econômica, mas depois de um tempo, o pessoal começou a questionar se foi válido acabar com as praias para dar espaço à navegação. Para mim, não valeu a pena”, conclui.

Vídeo de Paulo Berti mostra pessoas caminhando pelas águas no sábado (Foto: Arquivo Pessoal)

Imagem do acervo digital do site Nossa Dica mostra como eram as prainhas no passado (Foto: Acervo Histórico)

Rainha das Praias

Um concurso de beleza itinerante se tornou a principal atração às margens do Rio Taquari. Chamado de Rainha das Praias do Taquari, o evento foi organizado pela rádio Alto Taquari de 1968 a 1975.

Reportagem do grupo A Hora de fevereiro de 2019 relembrava a história do concurso de beleza que reunia candidatas de 21 municípios banhados pelo Taquari. Representante de Cruzeiro do Sul, Maria Ignêz Vogt foi a vencedora da primeira edição.

Entre as lembranças do evento está a construção de uma passarela sobre as águas, por onde as candidatas desfilavam e mostravam sua beleza. Em função das enchentes no Taquari, várias competições tiveram de ser realizadas longe do rio.

Idealizador do concurso, Waldir Sudbrack era gerente da rádio Alto Taquari. Conforme ele, o evento foi um sucesso instantâneo nas décadas de 60 e 70. Só foi finalizado com o fim das prainhas, após a inauguração da barragem de Bom Retiro do Sul.

Prejuízo na navegação

Em contraste com o saudosismo, as empresas que atuam com transporte e extração de areia no rio Taquari acumulam cerca de 40 dias paradas por causa dos reparos na barragem de Bom Retiro do Sul.

No caso da Areial do Porto, as três embarcações estão paradas desde o dia 7 de fevereiro. Dos quatro funcionários, um cuida dos navios e os demais estão de férias. “Não temos expectativa de quando será possível voltar. Já cogitamos se vale a pena manter as atividades por aqui”, desabafa o gerente administrativo, Nelson de Almeida Neto.

Conforme ele, a navegação pelo rio Taquari já é comprometida no verão devido ao nível do rio. Situação piorou nos últimos anos com os constantes problemas na barragem de Bom Retiro do Sul e de Amarópolis, em General Câmara.

Sem a possibilidade da navegação, Neto informa que os serviços permanecerão interrompidos. Alternativa era levar a carga com caminhões, mas o excesso de peso unido aos custos logísticos impossibilitam o transporte pelas rodovias.

Acompanhe
nossas
redes sociais