Pelo menos 195 mil brasileiros morreram em virtude do coronavírus em 2020. O número é expressivo quando analisado isoladamente. Ao integrar a lista geral de óbitos (1,451 milhão), o número covid representa 13,4% do total de mortes no Brasil. Significa que um em cada oito brasileiros morreu em virtude da doença. Os dados constam no Portal da Transparência, no link registrocivil.org.br
Quando comparado 2020 com os cinco anos anteriores (veja tabela), verifica-se que o número geral de mortes oscila bastante. Em 2016, por exemplo, o percentual de pessoas falecidas no país alcançou 14,3%, muito próximo do índice de 2020. Diferente foi em 2017, quando o crescimento ficou em 3,3%. A média de crescimento das mortes no Brasil foi de 8,6%, desde 2016.
Especialistas dividem opiniões quanto à análise dos dados. Os mais críticos ao alarmismo defendem que houve pouca oscilação na soma geral. Os números do IBGE são um pouco diferentes, com registros superiores em 2018 e 2019 – alcançando 1,3 milhão de mortes – , mas a diferença mexe pouco no percentual. Como o IBGE ainda não divulgou o número do ano passado, aqui, preferimos os dados do Portal da Transparência, já com parâmetros atualizados.
Chamam atenção outros fatores. Segundo dados da Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais, as mortes ocorridas em casa dispararam neste ano, apresentando aumento de 22,2%. Para a associação, esse crescimento se deve à insegurança dos cidadãos em comparecer nos postos de saúde e hospitais, que têm estado com suas capacidades de atendimento comprometidas. Foi observado que, entre as mortes ocorridas em domicílio, o maior crescimento foi de mortes causadas por Síndrome Respiratória Aguda Grave, que aumentou mais de 700%.
Nos hospitais, também houve uma explosão de falecimentos justificados por essa síndrome, sendo observado um crescimento superior a 980%. Esse dado é importante, uma vez que muitos casos de covid-19 não identificados até o falecimento do paciente são registrados como Síndrome Respiratória Aguda Grave. No geral, houve aumento de 34,9% de mortes causadas por doenças respiratórias, sendo a Síndrome Respiratória Aguda Grave a principal responsável por essa elevação dos registros.
Os falecimentos causados por sintomas cardíacos também aumentaram em relação a 2019, passando de 270,2 mil para 284,1 mil, ou seja, um crescimento de 5,1%. Desses casos, os sintomas cardiovasculares inespecíficos subiram 28,8% entre os anos. A associação explica que o aumento dos óbitos em domicílio é um dos fatores que contribuíram para a não identificação das causas dessas mortes.
Aqui na região, o Centro Regional de Oncologia – CRON corrobora com a informação sobre esta realidade. “Muitas pessoas ficaram com medo de ir aos consultórios ou clínicas, formando uma demanda reprimida de diagnósticos”, explicou o oncologista Renato Cramer, em entrevista à Rádio A Hora 102.9 há poucas semanas.
Em resumo, os dados abrem uma lacuna para interpretações. Se observados os números, friamente, poderíamos afirmar que a covid 19 praticamente não alterou o número de mortes no Brasil. Pessoas que antes morriam com outras doenças, agora faleceram vítimas da covid.
A incógnita é com o ano em curso, principalmente, quando invocados os represamentos de diagnósticos ou tratamentos, o que pode acarretar em vítimas futuras, em escala maior. Mas isso, apenas o tempo responderá. Ao findar de 2021, seremos capazes de atestar ou refutar esta possibilidade.
Outra “doença” que deveria preocupar a sociedade, mas não tem a mesma atenção global, é a fome no planeta. No Brasil, morreram mais de 60 mil pessoas de fome nos últimos 10 anos. Muitas crianças entre as vítimas, por complicações decorrentes de desnutrição. Isso representa uma média superior a 6 mil mortes por ano, ou 17 por dia.
Somos capazes de nos comover pela covid, o que é correto. E deveríamos ampliar nosso olhar também para as crianças e jovens morrendo de fome, número que apenas aumentará com a pandemia.
É por essas e outras que o bom senso para seguir o trabalho não pode mais ser questionado. Ainda que alguns preferem a “doma de vidro”, o Brasil não suporta o isolamento em casa, sem trabalhar. A expressão “geladeira cheia” vem desta falta de sensatez para garantir o mínimo a milhões: comida.
Bom fim de semana a todos!