Quando surgiu a ideia de fazer os almoços?
Eu tinha um filho dependente químico que foi morar nas ruas. Eu saía para procurar ele depois do serviço para levar comida e daí tinha sempre outros também. O que sobrava no restaurante meu patrão deixava eu trazer e eu doava para eles. Às vezes eu comprava. E assim começou. Quanto mais eu fazia, mais gente aparecia. Nunca mais parei. Também comecei a levar roupas, porque no inverno é crítica a situação. A gente está cada vez tendo que levar mais coisas e nunca acaba.
Quem recebe a comida?
Além deles a gente doa para a vila. Bem no fundo do nosso bairro tem um monte de pessoas que são invisíveis para a sociedade, as pessoas não veem eles. Moram na rua, são dependentes, ou são avós que cuidam dos netos. São cerca de 60 pessoas cada vez. Pra ter uma ideia, eu faço 10 kg de arroz e ainda falta.
Você recebe alguma ajuda?
A maioria vem dos clientes do restaurante onde trabalho, na Avenida dos Quinze, ali na frente dos correios. Eles doam dinheiro. Daí um dá R$ 100, R$ 50, sempre ajudam. E como eu trabalho lá já faz 12 anos, eles me conhecem. O açougueiro leva a carne no restaurante e sempre doa uma parte pra mim. Outras coisas eu compro. Toda doação é bem-vinda. Daí faço molho com batata e carne, arroz, galinhada, carreteiro, massa, às vezes faço feijão com um monte de carne, pão e salada. A igreja que participo, Assembleia de Deus, também começou a ajudar e o pastor às vezes faz um culto lá.
Qual é a reação deles quando recebem a doação?
Quando eu não vou, eles perguntam: “e a tia da comida? A minha camionete eles conhecem de longe, se eu parei, eles já vem vindo com pratos e potes. Comprei um terreno agora, bem lá no fundo onde ficam os esquecidos. Estou arrumando doações para
construir. Se alguém quiser ajudar vamos fazer uma cozinha e um banheiro, colocar piso e telhado. Vamos deixar roupas e calçados pra eles virem tomar banho, se alimentar. Esse espaço é para as pessoas, para as crianças. Vamos tentar arrecadar fraldas, leite, que são coisas que eles pedem. E nos domingos vou pra lá cozinhar. Quero conseguir sacolinhas de comidas pra eles terem na semana.
Qual é o seu sentimento depois de fazer a ação?
Paz. Eu durmo com meu coração descansado porque fiz meu melhor. Se um dia Deus me abençoar financeiramente e eu tiver dinheiro, eu digo que se eu ficasse rica eu ia ficar pobre de novo. Eu ia construir um local que as pessoas pudessem dormir, tomar banho, comer. Isso é o meu sonho, e é muito bom pro meu coração, faz muito bem. Fico muito triste de ver as crianças sem nada, de ver as avós sem nada. E quando a gente dá um alimento eles dizem “obrigado, tia”. Esse ‘obrigado’ é melhor do que qualquer dinheiro.