“Vou sair por aquele portão de cabeça erguida”

Abre aspas

“Vou sair por aquele portão de cabeça erguida”

José Miguel Schossler, 54, é mais conhecido em Cruzeiro do Sul como Toco. Servidor público municipal faz 25 anos, é o borracheiro do parque de máquinas. Para ele, ser funcionário público é como jogar em um time de futebol, em que o importante é não fazer gol contra

“Vou sair por aquele portão de cabeça erguida”
(Foto: Filipe Faleiro)
Vale do Taquari

Como entrou no serviço público?
Eu trabalhava de borracheiro em uma empresa de Lajeado. Então prestei o concurso. Fui chamado em fevereiro de 1996, quando o prefeito era o senhor Manuel Ruschel (in memorian).

Como era Cruzeiro naquela época?
Bem diferente. Não se tinha asfalto nas áreas próximas do centro, havia poucas máquinas para o serviço, quase não tínhamos veículos do município. Era só uma ambulância e duas patrolas. Inclusive aqui, na frente do Parque de Máquinas, era chão batido. O trabalho era mais difícil, faltavam equipamentos. Foi uma luta grande de muitas pessoas para chegar ao que se tem hoje.

O município tem um perfil agrícola. Qual o principal desafio de prestar esse atendimento?
Para tudo que a gente faz, é preciso vontade e dedicação. Tem de vestir a camisa e se esforçar. Nestes 25 anos de trabalho aqui, passei por diversos prefeitos. Alguns se tinha mais proximidade, outros nem tanto. Mas todos eles deixaram sua marca. Fizeram o que acreditavam ser o melhor para o município. Vejo que todos deixaram sua contribuição para o que temos hoje. No meu trabalho aqui, a demanda é grande. Sempre tem o que fazer. Além de ser borracheiro, também sou responsável por limpar as máquinas, abastecer os veículos, deixar tudo pronto para o motorista sair sem se preocupar.

E com as pessoas na rua. As pessoas conhecem o borracheiro Toco?
(Risos) Sim, as pessoas sabem. Se falar o meu nome, serão poucos que sabem, mas Toco, todos sabem. Mas te digo o seguinte, o servidor público não é bem visto na rua. Muitos têm uma ideia que o funcionário público é preguiçoso, que fica escorado. Isso não é verdade. Tem um preconceito, tanto que quando passam pela gente na rua dizem: “eu queria trabalhar na prefeitura, olha que moleza.”
A gente pode estar na paulera (sic), todo sujo, suando, correndo que nem louco. Já aconteceu comigo. Teve uma vez, que estava cheio de coisas, e saí para ajudar na limpeza de uma rua. Passou um por mim: “aí Toco, que sinistro. Eu queria esse trabalho pra mim.”
E não é assim. O funcionário público até tem alguns benefícios que outros trabalhadores não tem, como os autônomos por exemplo. Mas o trabalho é bem puxado. Acho que tem haver com as leis. Para consertar as estradas por exemplo. É preciso comprar material, e daí se faz a licitação. Isso é demorado, mas muitas pessoas não sabem e acabam culpando o servidor, como se a gente não quisesse fazer o trabalho.

Como mudar esse pensamento?
Pois é. Tem quem entra no serviço público e passam a conhecer a realidade. Daí mudam. Teve um secretário, anos atrás. Não vou dizer o nome. Mas antes de chegar na prefeitura, vivia falando mal. Criticava os funcionários, falava que éramos escorados.

Daí entrou como secretário de Obras. Em pouco tempo, teve uma Expocruzeiro. O pessoal se puxou. Ele foi lá, dar um discurso, e falou da nossa dedicação. Eu cheguei do lado dele depois. Chamei em separado. Ali ele reconheceu que estava enganado.

Cara, tem que ver na enchente. No ano passado, a gente quase se arrebentou. Corremos pra tudo que é lado para ajudar as pessoas. Mesmo assim, ouvimos um monte de desaforo. Teve funcionário que quase chorou, por trabalhar direto e ainda ser ofendido. Eu procuro fazer o trabalho com muita dedicação. Não importa o que dizem. Quando me aposentar, vou sair por aquele portão de cabeça erguida.

 

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