• Como você se tornou garçom?
Comecei lavando copos no restaurante Caixeiral. Era um sábado, dia de muito movimentado, e faltou um garçom. Então me colocaram para atender o pessoal. Isso foi em 67, tinha uns 20 anos na época. Me lembro que esse restaurante tinha muito movimento. O pessoal saia do cinema mais cedo para pegar um lugar lá.
• Dizem que você se tornou muito conhecido por ser garçom. É verdade?
Sim, muitos nas ruas me abanam e me conhecem. Me lembro de uma Festa da Uva que fui em Caxias do Sul. Um homem ficou me olhando e veio na mesa. Havia ajudado ele um dia quando estava com o pneu furado e ele veio me agradecer. As pessoas guardam essas gentilezas.
• Você lida com um público amplo. Qual o segredo para atender todos os clientes bem?
Importante é ser educado com as pessoas. Se não tiver um modo de agir adequado, não se vai a lugar nenhum.
• Tem outras dicas para alguém que pensa em ser garçom?
O garçom não é apenas a pessoa que leva as bebidas. Se eu atendo uma mesa, eu olho se falta alguma coisa, se a pessoa se esqueceu de um talher ou um guardanapo, por exemplo. O garçom precisa ver a necessidade do cliente.
• Você costuma ganhar muita gorjeta?
Na época do Caixeiral, quando comecei a trabalhar, eu vivia só da gorjeta. Claro, hoje com a condição do Brasil, é difícil o cliente ter essa condição. Hoje até se dá gorjeta, mas não é tanto quanto no passado.
• Qual o valor mais alto que ganhou?
A maior que recebi foi no ano passado. Um rapaz de Passo Fundo me deu R$ 120 com notas enroladas. Ele estava acompanhado por uma mulher e os almoços devem ter custado cerca de R$ 80.
• Você passou por alguma situação constrangedora na profissão?
Aconteceram alguns casos de racismo comigo. Um deles foi em uma churrascaria. Antes das carnes, o cliente era servido com um prato de sopa. Uma criança não queria tomar a sopa e a mãe dela, sem me ver, disse que se a criança não limparia o prato, ia mandar o ‘nego lhe pegar’. Teve outro caso de uma médica de Porto Alegre. Atendi ela numa boa e antes de ir embora ela pediu para falar com o gerente. Disse para ele que foi muito bem atendida por mim, mas que não suportava negros e da próxima vez queria ser atendida por outra pessoa. O gerente disse que eu era o melhor garçom da casa e provavelmente atenderia ela novamente.
• O que você sentiu nesses momentos?
No momento, a gente fica um pouco assim… mas a vida continua. Graças a Deus isso não me atingiu e consegui superar rapidamente.
• Teve algum fato curioso que presenciou?
Faz uns dez anos, atendi um casal que estava conversando numa boa. Eles pediram uma champanhe. O homem era meu conhecido e, no fim, me chamou para dizer que a champanhe era para comemorar a separação. Na hora fiquei sem saber o que fazer. Só disse: ‘se não der certo, não adianta continuar’.
• O que representa ser garçom?
Pra mim é tudo. Eu vivi minha vida trabalhando como garçom. Não fiquei rico, mas ganhei muitas amizades. Isso é o mais gratificante.