Engraçado para quem?

Opinião

Amanda Cantú

Amanda Cantú

Jornalista

Colunista do caderno Você

Engraçado para quem?

Precisamos problematizar o humor. Sim, “brincadeira” também tem limites.

Apesar de ser um elemento fundamental na vida em sociedade, o humor também se revela o um reflexo do grupo que o produz. Ou seja, o que é considerado engraçado em uma sociedade diz muito sobre a forma como seus indivíduos pensam e se comportam.

Há alguns dias, enquanto assistia aos stories do Instagram, me deparei com uma “brincadeira” que mencionava a blogueira Mari Ferrer. A “gracinha” não tinha o intuito de atacar a imagem da Mari, mas a relacionava com uma “piada” sobre relacionamentos românticos.

Mari ficou conhecida, para quem não acompanha seu trabalho como blogueira, pela coragem de denunciar um crime de estupro. No julgamento, foi mais uma vez humilhada e desacreditada.

Você pode argumentar que a “brincadeira” em questão não buscava ofender a Mari, então, tudo bem, certo? Não.

Primeiro, uma situação tão dolorosa e cruel não deveria ser tema de piada. Mesmo que a intenção não seja ofender, é preciso ter bom senso. Não é porque a internet é um espaço público, que permite voz igualitária a quase todos, que podemos simplesmente distribuir preconceitos, ódio e, inclusive, “brincadeiras” que, mesmo com uma faceta inocente, agridem e, por vezes, marcam para sempre.

Quando uma “piada” ofende alguém, mesmo que não seja a intenção, ela perde toda a graça.

Como jornalista e estudante de Comunicação, a última coisa que busco aqui é atacar a liberdade de expressão. Até porque seria, no mínimo, hipocrisia da minha parte fazer isso em um espaço de opinião como este.

Porém, uma “piada” ou “brincadeira” que ridicularizam determinados indivíduos incentivam relações desiguais. Crianças, por exemplo, repetem discursos que aprendem em sociedade, práticas que veem como legitimadas por ela.

Se uma criança vive em um meio onde é aceito fazer “piadas” com mulheres, pessoas não brancas, pessoas LGBTQIA+, pessoas com deficiência ou qualquer um que não se encaixe naquilo que é considerado “padrão” ou “normal”, o que essa criança vai reproduzir? Que tipo de adulto ela se tornará?

Há algum tempo, vi uma frase, na internet mesmo, que dizia “dá para saber muito sobre uma pessoa apenas observando do que ela ri”. E é isso. Se a sua “piada” machuca alguém, ela não tem graça, ela não é legal, ela não é piada.

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