Pandemia eleva parcela de jovens longe da escola e do trabalho

“Nem-nem”

Pandemia eleva parcela de jovens longe da escola e do trabalho

Análise da FGV estima que 35,2% da população entre 20 a 24 anos se afastaram do mercado e da formação no segundo trimestre deste ano. Nos últimos cinco anos, a parcela dos 18 aos 29 anos foram os que mais perderam renda. Por outro lado, formação cultural e histórica faz RS ter o segundo menor índice da nação.

Pandemia eleva parcela de jovens longe da escola e do trabalho
Para evitar a evasão, professores e direções passaram a fazer uma busca ativa dos alunos. Em alguns casos, estudante e familiares são chamados para conversar sobre a importância de continuar os estudos. Filipe Faleiro
Brasil

A população dos 15 aos 29 anos conhecidos como “nem-nem” (termo usado para jovens que não trabalham e nem estudam) cresceu de maneira exponencial durante a pandemia. É o que aponta estudo da Fundação Getúlio Vargas Social (FGV).

Entre essa faixa etária, os mais atingidos são aqueles de 20 a 24 anos. Nos últimos três meses de 2019, 28,6% desse público não trabalhava e nem estudava. Em abril, maio e junho deste ano, meses de maiores restrições devido à pandemia, esse percentual saltou para 35,2%, maior patamar já registrado.

Quando se avalia a faixa dos 25 aos 29 anos, houve uma elevação dos 25,5% para 33%. O levantamento foi feito pelo economista e diretor da FGV Social, Marcelo Neri. Na conclusão do estudo, alerta que a situação dos jovens é preocupante, pois junto com a ausência de renda também se verifica uma desigualdade educacional para os recém formados ingressarem no mundo do trabalho.

O estudo considera dados do Pnad Contínua, feito pelo IBGE. O indicador verifica capitais e regiões metropolitanas do país. Ainda que não se tenham números específicos sobre o Vale do Taquari, serve de parâmetro para análises voltadas à formação e empregabilidade dos jovens, afirma a economista e presidente do Conselho Regional de Desenvolvimento (Codevat), Cintia Agostini.

“O sul do país, o nosso estado e o Vale tem muito latente na sua formação histórica e cultural o valor do trabalho. O surgimento dos povoados, a chegada de grupos familiares vindos da Europa, trouxe consigo a obrigação de trabalhar para pagar dívidas do processo de imigração.”

 

 

De acordo com ela, essa preocupação se manteve ao passar dos anos. “No planejamento estratégico do Codevat que fizemos em 2005 e em 2009, identificamos que a nossa sociedade preza muito pelo trabalho. Isso vem do nosso histórico”, afirma.

Diante dessa preocupação comunitária, o efeito sobre a região é que tenha menores perspectivas dos “nem-nem”. Algo que pode ser confirmado pelo próprio PNAD Contínua, pois o RS é o penúltimo estado em percentual de jovens que não trabalham ou não estudam (confira o gráfico).

 

Cicatriz para o futuro

As condições sociais das famílias dizem muito sobre a oportunidade de trabalhar e estudar. O termo nem-nem carrega consigo um tom pejorativo, com se o jovem não quisesse trabalhar ou estudar, realça o diretor do Centro de Gestão Organizacional e professor da Univates, Sandro Faleiro.

“Por vezes, esse jovem se afasta por necessidade. Pois tem que ajudar a família em casa, ou mesmo em algum trabalho informal. Quando se tratam da classe média, muitos tiveram oportunidade de estudar, fizeram cursos e não aceitam trabalhos que sejam fora da sua área.”

De acordo com ele, essa geração carrega consigo outra experiência de vida. “No passado, se saia de casa mais cedo. Era preciso desbravar o mundo e arranjar o próprio sustento. Agora temos uma parcela desses jovens que vivem com os pais por mais tempo.”

Quando se parte para uma análise vinculada a classe social, se percebe que as famílias mais carentes enfrentam problemas advindos da pouca formação, o que acarreta nas oportunidades de trabalho, analisa Faleiro.

“Temos uma parcela desse público que acaba ficando muito tempo sem fazer algo, sem descobrir suas aptidões, ou saber o que querem. No futuro, quando entrarem no mercado de trabalho, vão ficam em serviços com menos exigências e com salários menores.”

Na avaliação dele, é preciso desenvolver canais de oportunidade, por meio das associações de bairros e dos poderes públicos para auxiliar esses jovens para que façam cursos profissionalizantes. “Há diversas formações gratuitas, que podem inclusive ser feitas pelo celular. O que precisamos é fazer essa informação chegar a esse público”, realça.

 

Risco de mais evasão

Com a suspensão das aulas presenciais, ainda em março, escolas verificam uma queda na participação dos alunos nas atividades remotas, em especial na rede pública estadual. “A pandemia agravou alguns casos.

Temos escolas em que os alunos exibem uma maior ou menor valorização do aprendizado. No entanto, isso não pode ser traduzido como evasão”, diz a coordenadora pedagógica da 3ª Coordenadoria Regional de Educação (CRE) Regiane Heinrichs Mallmann.

O formato para considerar evasão mudou com a pandemia. Antes eram emitidas as Fichas de Comunicação de Aluno Infrequente (FICAIS). A partir disso, se formava uma atuação em rede, com o Conselho Tutelar, direções das escolas e Ministério Público (MP) para interceder e fazer esse jovem retornar ao colégio.

Agora, o procedimento adotado foi de busca ativa. Com um canal direto entre escola, família e aluno. Caso não se tenha resposta, o caminho é informar o MP. De acordo com a CRE, o maior risco de desistência está entre os alunos do EJA (Educação de Jovens e Adultos). Nesta modalidade, houve um percentual de cancelamento de matrículas em torno de 28% durante a pandemia.

Acompanhe
nossas
redes sociais