Dependência rodoviária trava o desenvolvimento

Modais de transporte

Dependência rodoviária trava o desenvolvimento

Estradas precárias, o preço do óleo diesel, pedágios, falta de pistas duplicadas, insegurança e acidentes. Pelos trilhos, o cenário é de abandono. Na hidrovia, nenhuma embarcação transporta cargas do Vale para o porto da Capital ou de Rio Grande faz no mínimo quatro anos. Esses são alguns exemplos que elevam o custo da logística às empresas e fazem o país perder em competitividade

Dependência rodoviária trava o desenvolvimento
Reunião nessa sexta-feira abordou projetos para melhor aproveitamento do complexo portuário de Estrela (Foto: Rodrigo Martini\Arquivo)
Vale do Taquari

O custo logístico se aproxima dos 21% de tudo que é produzido no país. A título de comparação, nos Estados Unidos é 7%. “Temos 15% a mais do que deveríamos. Para a competitividade, é um custo muito elevado. E o pior, há um crescimento de 0,3 a 0,6% ao ano. Não conseguimos nem estancar, quem dirá reduzir.”

A afirmação do presidente da Câmara Brasileira de Logística e Infraestrutura, Paulo Menzel, e foi feita durante reunião na manhã dessa sexta-feira com diretores de empresas, agentes públicos e representantes de entidades de classe. O encontro ocorreu no Estrela Palace Hotel e debateu os caminhos para tornar o Porto em um entreposto logístico.

O complexo foi municipalizado. Foram oito anos de trâmite burocrático entre União e depois o Estado. Com o processo confirmado, agora a região busca estabelecer uma forma de usar a ferrovia e a hidrovia.

Ter mais opções para uso de outros modais além do rodoviário poderia trazer equilíbrio e fortalecer a economia nacional, estadual e também regional, é o que acreditam líderes regionais.

“Ter esses modais disponíveis seria um avanço não só para o Vale do Taquari. Teríamos condições de racionalizar o uso dos caminhões no transporte de insumos para a produção primária”, afirma o presidente da cooperativa Languiru, Dirceu Bayer.

De acordo com ele, no passado a cooperativa contratava o transporte por trens para compra de cereais. “A diferença era mais de um real pela saca de milho, por exemplo. Em vista do nosso consumo, significa R$ 10 milhões por ano que pouparíamos em logística, caso tivéssemos uma rede ferroviária disponível.”

O caminho de parte dos insumos trazidos pela Languiru começa no centro-oeste. O milho comprado é carregado por trens até a região de Maringá, no Paraná. Depois disso, embarcado em caminhões e trazido para a região. Segundo Bayer, o custo dessa operação fica em torno dos 5% do faturamento da cooperativa, algo próximo de R$ 1,8 bilhão ao ano.

Como forma de criar alternativas às empresas e tornar mais racional a logística, a Câmara da Indústria e Comércio (CIC-VT), promove uma série de debates sobre o tema. No encontro dessa sexta-feira, foi estabelecido como meta o desenvolvimento de um projeto de viabilidade para o Porto de Estrela.

Como tornar o Porto de Estrela útil

A proposta trazida pelo presidente da Câmara Brasileira de Logística e Infraestrutura é fazer um diagnóstico das necessidades do Vale do Taquari, do Vale do Rio Pardo e da Serra em termos de transporte de cargas. Esse estudo começa pela ferrovia, com volumes tabulados.

Esses dados teriam maior representatividade com os insumos do agronegócio e do setor metal-mecânico. Para se tornar viável, o transporte por estradas de ferro depende do tipo de carga, com preferência para produtos de baixo valor agregado em grande quantidade e peso, como ocorre com os grãos, minerais e combustível. Isso se deve às possíveis avarias no descarregamento e transferência de cargas nos entroncamentos.

Para que a ferrovia volte a operar e entre no Porto de Estrela, são necessários investimentos. Na análise dos líderes empresariais da região, se esse dinheiro for das empresas locais, isso seria impossível.

Por isso mesmo, Menzel defende o plano de viabilidade. Pois a partir dele, seria possível atrair conglomerados de investidores, demonstrando o potencial de faturamento das três regiões atingidas.

Como o complexo de Estrela é único no interior do país, pois se trata de um entroncamento rodo-hidro-ferrroviário, os líderes regionais estimam que seja possível criar no futuro um entreposto logístico na área.

Integração entre os modais

“O cenário perfeito é ter disponível os três modelos de transporte. Mas hoje temos uma malha desequilibrada. Isso faz com que o custo aumente”, avalia o empresário Diego Tomasi. De acordo com ele, quando se fala em Custo Brasil, a logística é uma das bases desse conceito. “É necessário ter equilíbrio. A racionalização do transporte faz com que toda a economia ganhe”, diz.

Sócio de uma empresa de logística por caminhões, com atuação em diversos estados do país, Tomasi afirma: “engana-se quem pensa que há competição entre os modais. Os três tem suas potencialidades e características. Por exemplo, transporte de eletrônicos, pelo valor embarcado, é para o caminhão. Agora quando falamos em ferro, aço, grandes quantidades de soja, é melhor pelo trem.”

“Temos a pior malha rodoviária do país”

Buracos, estradas mal sinalizadas, esburacadas e pistas simples. Tudo isso interfere no atendimento dos prazos de entrega, no custo do frete e da mecânica dos caminhões, realça o proprietário de uma cooperativa de Logística, Adelar Steffler. “Temos a pior malha rodoviária do país. Pegamos a ERS-130. Um volume enorme de produtos passa por essa estrada e não temos nenhum quilômetro duplicado.”

A crítica de Steffler não fica só nas rodovias estaduais. “Vamos ver a BR-386. Maior corredor para escoar as produções do RS. Desde a divisa com Santa Catarina até a Região Metropolitana. Se tivermos 20% de estrada duplicada é muito.”

Na opinião dele, falta vontade política tanto para dotar as rodovias de melhor infraestrutura, quanto para desenvolver um projeto nacional para uso das ferrovias e hidrovias. “Mesmo com a estrada esburacada o caminhão passa. Mas a manutenção na ferrovia é obrigatória.”

 

Ping Pong – Paulo Menzel, presidente da Câmara Brasileira de Logística e

Infraestrutura

“Temos que admitir, o porto não existe mais”

Um projeto para a região, para atrair investimentos ao complexo portuário mais ocioso do país. Essa é a proposta de Paulo Menzel para o Porto de Estrela. Frente à tecnologia atual, os imóveis na área têm pouca utilidade. É preciso de uma nova estrutura, defende.

A Hora – Por que o custo logístico do país é tão alto?

Paulo Menzel – De tudo que é produzido no país, 21% se transforma em custo logístico. Esse número não deveria passar de 6%. Nos Estados Unidos subiu um ponto, chegou em 7,8%, e o governo americano anunciou investimentos de 50 bilhões de dólares para voltar a dar competitividade às empresas. Há 28 pilares que somam o custo logístico. O uso dos modais é um deles.

De forma geral, no Brasil esse impacto é tão grande sobre as empresas pois governo após governo esqueceram de investir em outros modais de transporte. Esqueceram de investir em infraestrutura. Deixaram de lado sistemas de logística para que tivéssemos melhores condições de competir. Simples assim.

Há muitos anos, decidimos que o país deveria ser rodoviarista. Isso, por si só é um pecado. Assim chegamos no estágio em que estamos.

Como fazer para equilibrar?

Paulo – É preciso ter projeto. Não vamos a lugar algum, seja quando falamos de logística, ou mesmo quando olhamos para a sociedade, sem termos um plano. Precisamos de conhecimento para saber onde estamos e onde desejamos chegar.

Sobre o Porto de Estrela. De que maneira é possível tornar o complexo mais útil para a economia regional?

Paulo – É um avanço que o complexo tenha vindo para a administração municipal. Mas temos que admitir, o porto não existe mais. O que temos ali é uma área, com alguns prédios absolutamente inservíveis para a logística. Minha proposta para a sociedade é que se faça um estudo não só para Estrela, para Lajeado, mas para a mesorregião, para que se traga desenvolvimento econômico, com custos logísticos adequados.

Detalhes

 

  • O porto foi inaugurado em 1977, com o projeto de ser um marco logístico do país, pois reúne os modais rodoviário, ferroviário e hidroviário;
  • A distância de 188 quilômetros de Estrela a Porto Alegre pelo Rio Taquari leva cerca de 12 horas de navegação;
  • Até Rio Grande, a viagem de 458 quilômetros é percorrida em no mínimo 36 horas;
  • Nenhum trem chega ao porto desde dezembro de 2014;
  • A hidrovia para transporte de cargas a Porto Alegre foi desativada um pouco antes, em 2013;
  • Desde 2015, o Porto de Estrela tem o menor índice de aproveitamento entre todos os 33 complexos organizados no país;
  • No fim dos anos 80, a movimentação chegou a 1,3 milhão de toneladas por ano. Foi o pico.
  • Em 2012, foram 328 mil toneladas. No ano seguinte, 180 mil toneladas;
  • O transporte ferroviário é, em média, 30% mais barato do que o rodoviário. Quanto maior o percurso, maior é a economia;

 

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