Ao chegar à UPA Lajeado, o industriário Carlos (nome fictício) relatava dificuldade para respirar, sentia dores de cabeça, na garganta e apresentava tosse seca. De imediato, foi tratado como um caso suspeito de coronavírus.
Teve aumento da pressão arterial, foi feito um eletrocardiograma e constatado que estava com taquicardia. Nos exames de pulmão, nenhum sinal de infecção.
Ele prefere não ser identificado e conta que foram duas semanas afastado do trabalho. Fez o teste para o novo coronavírus, que deu negativo. Ainda preocupado com as dores, continuou indo no médico. O diagnóstico, ao que tudo indica, se trata de episódios de ansiedade.
Conforme o médico psiquiatra e professor da Univates, Roberto Pierobom Lima, casos ligados a síndromes psíquicas podem desenvolver sintomas físicos de origem emocional. Na literatura médica, isso se chama somatização.
O termo é reconhecido no Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais publicado pela Associação Psiquiátrica Americana dos Estados Unidos. “Dores de estômago, alergias, diarréia são quadros comuns em pessoas que estão ansiosas. Pode ocorrer até eventuais crises de asma derivadas de problemas psicológicos”, diz.
Os sintomas reais, diz, podem confundir as pessoas. A partir disso, acreditam que contraíram a doença. De acordo com o médico psiquiatra, a covid-19 é uma doença heterogênea com diversos sintomas, fáceis de confundir com outras enfermidades.
Conforme a Organização Mundial da Saúde (OMS), os mais comuns da covid-19 são febre, tosse seca, mal-estar e dificuldade para respirar. Também há casos com secreções nasais, problemas gástricos, perda de olfato, entre outros.
Explicação no pensamento e no subconsciente
Outra abordagem possível para explicar o aparecimento de sintomas em pessoas que não se contaminaram pode vir na psicanálise. “Somos divididos em consciência e subconsciência. Gostaríamos de sempre explicar os episódios da vida pela racionalidade, mas não é assim. O inconsciente opera indiferente da nossa vontade”, frisa o psicanalista Sérgio Pezzi.
Neste momento histórico de pandemia mundial há um crescimento de sofrimentos psíquicos, diz. Para conseguir diferenciar o que é uma doença orgânica de alguma enfermidade da mente, tanto o diagnóstico clínico quanto a escuta profissional de alguém que possa identificar problemas na saúde mental é importante, considera Pezzi. “Há possibilidade da covid-19 despertar manifestações histéricas nas pessoas. A mente pode achar que estamos com alguma doença orgânica. Pelos tipos de sintomas que percebemos. E não necessariamente serão confirmados.”
Excesso de informações
Tanto o psiquiatra Lima quando o psicanalista Pezzi afirmam: o excesso na busca por informações sobre a pandemia traz mais pânico às pessoas. “Temos de diferenciar informação de conhecimento. Desde o início da pandemia, sabíamos que era algo novo, além do que conhecíamos. Sem dúvida que é preciso informar sobre o avanço da doença, os óbitos. Mas também é preciso buscar algum alento”, afirma Pezzi.
De acordo com ele, um fenômeno que tem causado muito prejuízo à saúde mental das pessoas é a falta de leitura. “A ignorância traz dificuldade em assimilar o momento. Muitos acabam acreditando em notícias falsas, sem criar compreensão do que precisamos fazer.”
Para o médico psiquiatra, Roberto Lima, estar sempre buscando informações e notícias da pandemia “inunda” o indivíduo de uma preocupação permanente. “Viver ligado na doença é ruim. Estar acompanhando cada óbito, o número de infectados, faz a pessoa ficar mais tensa do que o necessário. Torna esse momento insuportável do ponto de vista emocional.”