No último ano antes de prestar vestibular e tentar uma vaga em alguma universidade pelo Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), a realidade do aprendizado de Luísa Zandoná Baú, 17, mudou completamente. As aulas são virtuais, algumas por videoconferência, mas a maioria são atividades de pesquisa, exercícios e leitura, para depois ter uma explicação.
“Está bem complicado. Não é como ter uma aula presencial, em que vamos olhar e o professor vai nos ajudar a entender. Temos de ir por nós mesmos”, conta a aluna de uma escola particular de Lajeado. Para ela, o prejuízo no aprendizado é certo. “Não sei se estarei tão preparada quanto antes, em especial para o Enem.”
Ainda assim, a carga de trabalhos aumentou. “Estou estudando mais horas, mas sem a mesma efetividade do presencial”, resume Luísa. O pai dela, Gilberto Baú, acompanha de perto o esforço da filha. Reconhece que a adolescente tem objetivos claros para o futuro. “As aulas tem sido muito puxadas. Acredito haver prejuízos ao aprendizado, mas a estratégia da escola mantém atividades nos horários de aula. Então a rotina não alterou muito.” Por estar em uma instituição privada, o engenheiro mecânico acredita que a filha tem menos perdas educacionais do que se estivesse na rede pública.
Ainda distante dos planos do que fazer após o Ensino Médio, Ana Júlia Cardoso dos Santos, 13, mora no interior de Taquari. No povoado Júlio de Castilhos. Com acesso à rede de computadores em casa, conseguiu acompanhar as aulas. “Tenho vários colegas que não participaram, pois não têm computador nem acesso à internet.”
De semelhante com Luísa, a observação de que os encontros presenciais são mais efetivos para o aprendizado. “Tenho dificuldade em me concentrar. Prefiro estudar na escola.” Para facilitar o contato entre alunos e professores, a turma do 7º ano da escola estadual Júlio de Castilhos criou um grupo de whatsapp. “Os professores se dispõem a esclarecer dúvidas nos horários que teriam aulas”, conta Ana.
A mãe dela, Elisete é secretária de escola. “Dentro da sala a educação é muito mais efetiva”, afirma. As incertezas sobre o retorno dos colégios a preocupa. Para reduzir algum prejuízo, estabeleceu com a filha momentos de estudo. “Não sabemos como serão os próximos meses. Mas de fato, a qualidade do ensino foi muito atingida.“ De acordo com Ana Júlia, são duas semanas sem novos conteúdos.
A Secretaria Estadual de Educação antecipou as férias de inverno, e os estabelecimentos de ensino estão em recesso. A quarentena suspendeu as aulas presenciais faz mais de dois meses. O governo do Estado elaborou metodologia por aulas programadas, envolvendo como principal recurso de contato as plataformas digitais e aplicativos, mas a aplicação depende de cada professor.
Emoção recíproca
A pandemia exigiu adaptações nos modelos de ensino em todas as escolas. No Colégio Evangélico Alberto Torres (Ceat), de Lajeado, o diretor Rodrigo Ulrich relata que os recursos tecnológicos têm garantido o aprendizado dos alunos que aderiram ao novo formato. “O processo foi gradual. Nosso planejamento seguiu este conceito a fim de que todos, profissionais, estudantes e pais pudessem se familiarizar e obter o proveito necessário.”
Nas condições atuais, pensa que houve aspectos positivos. “Temos a evidência ainda maior da importância do colégio na vida da criança, do jovem, da família e de toda a sociedade.” De acordo com Ulrich, o cotidiano no ambiente escolar impacta sobre a criatividade, sobre os vínculos entre colegas e de resiliência criada a partir do convívio. “Nós fazemos educação há quase 128 anos tendo a vida pulsando nas salas, nos corredores, nos pátios, nas quadras, na biblioteca e, hoje, somos forçados a tentar nos aproximar disso distantes fisicamente. Mas a experiência de encontros pela internet, muito provavelmente pela saudade de estar juntos no colégio, trouxe emoção recíproca a estudantes e professores.”
Frente à desigualdade entre a rede pública e privada, o diretor do Ceat frisa que os indicadores que demonstram essa desigualdade são antigos. “Penso que os impactos da pandemia devem ser avaliados considerando isso. Então, precisamos evitar atribuir tudo ao momento que estamos vivendo. Temos de manter a atenção às dificuldades anteriores a esta situação.”
Dificuldades na maior escola do Vale
O Colégio Presidente Castelo Branco está com as aulas interrompidas desde o dia 18 de março. De acordo com o diretor Marcos Dal Cin, antes da suspensão, professores orientaram alunos e propuseram atividades para fazer em casa durante 15 dias.
Em seguida, conforme orientação da Seduc, foram reunidos alunos em grupos de whatsapp e e-mails, com objetivo de facilitar o contato e postagens de atividades semanais. Apesar do esforço, Dal Cin reconhece que não é possível atingir todos os estudantes. “Nossa comunidade escolar é bem heterogênea. Alguns com melhores condições e outros com suas dificuldades. Muitos deles com acesso restrito a internet, o que dificulta esse contato direto com parte dos alunos.”
De acordo com ele, é difícil apontar algum benefício das aulas programadas, pelo fato dos alunos serem dependentes das atividades presenciais. “Eles não foram preparados para ter uma rotina de estudos em casa. Muitas vezes o aluno com aula presencial já possui algumas dificuldades e lacunas e a presença do professor é imprescindível.”
Para Dal Cin, a classe social do aluno tem grande impacto sobre o seu aprendizado. “Para poder participar das atividades à distância, é preciso ter internet. Observamos que parte significativa dos alunos, além de não ter esse acesso, também não tem um computador. O aluno depender do celular para ter acesso as atividades, conteúdos e leituras, torna-se quase que antipedagógico.”