Aos 19 anos, um jovem de Encantado embarcava para uma experiência que jamais seria esquecida. Natural de Encantado, Jonas Augusto Bouvié, o “Japa”, embarcou em um avião, no Aeroporto Salgado Filho, em Porto Alegre e desembarcou em Osaka, no Japão para seguir a carreira profissional.
Japa é mais um dos atletas que surgiram no EC Encantado, após alguns anos marcantes atuando sob o comando de Danilo Mior, o atacante rumou para o Grêmio. Lá jogou nos juniores e foi para o Caxias, onde se profissionalizou.
Da Serra Gaúcha, ele foi para o Cerezo Osaka, onde permaneceu uma temporada. Após esse período, o clube não quis renovar o empréstimo junto ao Ser Caxias e com isso teve que retornar. Sete ano depois, voltou para a Ásia onde se tornou ídolo. Uma grave lesão no quadril abreviou a carreira aos 31 anos. Hoje se dedica ao comércio de vestuário infantil, em Venâncio Aires. “Infelizmente tive uma lesão no quadril, acabei fazendo uma artroscopia no lado esquerdo do quadril. Já meu lado direito não tenho mais o que fazer, só usando uma prótese no quadril, então tive que parar de jogar futebol”, lamenta.
Após encerrar a carreira, cursou educação física na Univates e trabalhou por dois anos nas categorias de base do Guarani. Hoje abandonou o esporte e se dedica exclusivamente a uma loja de vestuário infantil em Venâncio Aires.
Momento marcante
Os anos de 2012 e 2013 ficará para sempre na história de Japa. Na época defendia as cores do Aimoré, de São Leopoldo, que vivia uma crise e estava na terceira divisão do Gauchão. Após sua chegada, foram campeões da Terceira Divisão e no ano seguinte terminaram a Divisão de Acesso em terceiro lugar, retornando para a primeira divisão. “Fui o grande destaque da campanha, terminei como artilheiro o que me proporcionou retornar para a Ásia.”
Outro momento marcante foi em 2015, quando terminou a temporada como um dos goleadores do Suwon FC e o time conseguiu o acesso inédito para a primeira divisão da Coreia do Sul. “Em 2013 eram considerados semi-profissionais e dois anos depois estavam na primeira divisão, até hoje estou marcado na história do clube. Foi o melhor ano na minha carreira no geral.”
Sonhos e arrependimentos
Todo jogador quando inicia a carreira profissional sonha em jogar na Seleção Brasileira, disputar uma Copa do Mundo e para Japa, a situação não foi diferente. “Pode até soar impossível, mas esses sonhos me fizeram realizar outros que tinha.”
Destaca que só o fato de ter saído da base e se conseguir profissionalizar já foi um grande feito na carreira. Outro ponto positivo na carreira foi ter marcado o nome na história de alguns clubes como o Aimoré e o Suwon FC. “Sou o maior artilheiro do Suwon na liga. O único acesso que o time para a primeira divisão, ajudei a subir. Foi uma coisa histórica e meu nome está lá também, isso me deixa mais feliz.”
Se fosse começar a carreira do zero, o único episódio que faria diferente era tentar se profissionalizar no Grêmio. Em 2005, quando estava nos juniores do Grêmio, deixou o tricolor para ir ao Caxias. “Profissionalmente não me arrependo de nada, pois os erros e acertos nos ensinam muito.”
Dinheiro para receber
“Olha para quem jogou no futebol do interior isso não é muita novidade (risos).” Ele comenta que os clubes do interior tem poucas condições financeiras e essa realidade faz parte da vida dos jogadores. Na maioria dos clubes que passou fez acordos, abrindo mão de alguns direitos e dinheiro que tinha para receber. A única vez que entrou na justiça foi em 2009, os valores foram recebidos em 2019. “ Jogador que precisa de dinheiro não pode ficar todo esse tempo sem receber, precisa do dinheiro logo para pagar as contas, então preferia fazer acordos, pegar uma parte para não ficar sem nada, ou ficar se enrolando na justiça.”
Experiência na Ásia
Na primeira temporada que passou pelo Japão, em 2007. Teve pouco de dificuldades na adaptação, como idioma, comida e questão cultural, mas ao final estava acostumado e adaptado a realidade do país. Quando retornou em 2013 vivenciou situações engraçadas principalmente fora de campo.
No Japão, em uma madrugada foi acordado durante um terremoto. As pessoas costumam receber por mensagens de texto quando isso acontece, e naquele dia o clube esqueceu de avisar. “Foram 15 segundos que pareciam nunca mais terminar, você não sabe o que fazer, é algo muito assustador. Só quem viveu isso sabe.”
Em 2015, na Coreia do Sul, o país vivia um momento conturbado com a Coreia do Norte, principalmente com problemas políticos. “Parecia que a guerra ia estourar a qualquer momento.” Conta que durante os jogos e treinos era comum ver jatos de guerras, mísseis sendo atirados contra o território sul-coreano. Além disso, como na Coreia, os jogadores são obrigados a prestar serviço militar, os colegas de clube estavam de prontidão para servir o exército. “Foi um momento bem preocupante, pois se estoura a guerra, como que iria sair do país? Foi um momento muito delicado que passei lá.”
Sobre a China, conta que é um mundo dentro do país, com culturas e dialetos totalmente diferentes. Relata que o momento mais engraçado foi ver um chinês traduzindo para outro chinês o que o treinador chinês falava. “É uma coisa muito impressionante e engraçada, me chamou muito a atenção.”
Outra coisa que o marcou é a alimentação que é muito exótica. Conta que o fato de viver no país o fez entender a cultura e o motivo da alimentação das pessoas. “O país é muito grande, muitas pessoas não têm condições de comprar e come o que tem.”
Diferenças com o futebol brasileiro
No Japão, a principal diferença vista foi na dinâmica de jogo. Por ser um futebol mais rápido, o diferencia da Coreia e na China. “Os jogadores são psicologicamente muito forte, o que torna muito mais difícil de os enfrentar, pois não desistem nunca, se entregam em campo.”
Já na Coreia do Sul o principal destaque fica por conta da força física, onde o jogo é mais de contato. Além disso cita o fato do respeito entre jogadores e comissão técnica. “Como tudo é muito mais rígido, tem a influência militar, os atletas mais novos respeitam muito os mais velhos e todos escutam e não contrariam o treinador e os diretores.”
Sobre a China, Japa conta que eles são os mais atrasados, principalmente na parte profissional dos atletas e dirigentes. Conta que o trabalho de base está sendo muito forte e que já existem jogadores habilidosos. “Se eles forem mais profissionais, em pouco tempo vão se tornar uma potência no esporte mundial.”
Fase artilheira
Em 2016, o futebol a segunda divisão do futebol da China chamou a atenção por contratar vários talentos do futebol mundial. Uma das equipes era comandada por Vanderlei Luxemburgo e tinha como principais jogadores os brasileiros Luís Fabiano, Jadson e Geovânio.
Japa atuava no Meizhou Hakka, equipe pequena que recém tinha subido da terceira divisão. Mesmo o time não fazendo uma boa campanha no campeonato, o atacante estava fazendo muitos gols
e empatado na artilharia ao lado de Luís Fabiano e outro atleta africano. “Enquanto que eles ganhavam todas as partidas e estavam brigando para subir, meu time perdia, empatava e pouco vencia.”
No fim do campeonato, o Luís Fabiano terminou com 22 gols, o atleta africano com 20 e Japa com 18. “Foi um ano muito bom, momento que estava dando muito certo. Não tive tanta visibilidade, pois meu time não fez uma boa campanha. Mas foi um momento muito especial, brigar pela artilharia com um jogador de Seleção Brasileira, que jogou uma Copa do Mundo, me deixou muito feliz, foi um marco para minha carreira.”
Partida especial
Na Coreia do Sul, a segunda divisão tinha um formato diferente. Após os pontos corridos. O primeiro colocado sobe para a elite. A segunda vaga é disputada em três playoffs. O primeiro jogo eliminatório é entre o terceiro e o quarto colocado, onde o time de melhor campanha joga pelo empate. O Suwon FC, time de Japa, empatou em 3 x 3 e se classificou. O segundo playoff foi contra o Daegu FC, segundo colocado, e o time do brasileiro precisava vencer. Aos 35min do segundo tempo, após uma cobrança de escanteio, a bola sobrou dentro da área e Japa chutou no ângulo. “Saí correndo comemorando como um louco, pulei a placa de publicidade e caí em cima da cadeira do fotógrafo, me levantei e fui para a galera. É um jogo que me lembro até hoje.”
O último playoff foi contra o Busan onde o Suwon venceu por 1 x 0, gol de Japa. “Eu já era muito bem falado na Coreia. Consegui aquele gol que foi muito importante pra classificar o time, pois o eramos considerados pequeno e não tínhamos muito torcedores. Naquela decisão, eles lotaram o estádio e a nossa torcida estava atrás de onde fiz o gol, foi uma loucura. Foi um momento muito bom, fiz gol em todas as fases.”
Ficha técnica
Nome completo: Jonas Bouvié, o “Japa”
Idade: 33 anos
Natural de: Encantado
Reside em: Venâncio Aires
Equipes que atuou: Ser Caxias, Cerezo Osaka (Japão), Guarani-VA, Porto Alegre, Ypiranga, Londrina, 14 de Julho, Avenida, Nova Prata, Aimoré, Lajeadense, FC Osaka (Japão), Suwon FC (Coreia) e Meizhou Hakka (China);
Títulos:
Copa Paulo Rogério Amoretty, em 2007 com o Caxias;
Campeão da Divisão de Acesso, em 2011 com o Avenida
Campeão da Terceira Divisão, em 2012 com o Aimoré