Baladas eternas na memória

Millenium/Tampas, Café Virtual e Rancho Bonanza

Baladas eternas na memória

Como um prédio comercial no interior de Arroio do Meio, um cibercafé de Lajeado e um antigo salão de Teutônia se transformaram nas principais casas de festas do Vale do Taquari. Conheça as histórias das baladas que acabaram, mas permanecem na lembrança de gerações de boêmios.

Baladas eternas na memória
“Aqui vivi os melhores anos da minha vida”, afirma Tampinha ao lado da estrutura da Millenium e Tampas. Hoje, prédio em Arroio Grande é utilizado como depósito / Crédito: Fábio Kuhn
Vale do Taquari

“Você é louco, vai fazer festa no meio do mato”, diziam para Luís André Weizenmann, 50, o “Tampinha” quando ele decidiu inaugurar uma danceteria em Arroio Grande, interior de Arroio do Meio. O ano era 1996.
Conhecido na noite por tocar em salões comunitários, o DJ sonhava em ter o próprio espaço. O interesse por um antigo centro comercial surgiu quando passava pela ERS-482 – estrada que liga o município e Capitão.

“Achava um prédio bonito. Aluguei o espaço e meu sogro (Roque Bruxel) me ajudou a reformar”, relembra.
No dia 17 de maio de 1996, a danceteria Millenium inaugurava. Surpresa na primeira festa: o espaço estava lotado. “Muita gente veio de curioso mesmo”, conta.

O primeiro ano foi de “altos e baixos”. Mas a partir de 1997, a casa de festa começou a bombar. Os eventos passaram a ser realizados semanalmente, nas noites de sextas-feiras. Por essa época, Tampinha inovou ao criar o Bar Country e também ampliou o espaço com mais pistas de dança.

A média de público da Millenium era de 800 frequentadores, mas em eventos especiais chegava a duas mil pessoas. Um dos eventos mais marcantes para Tampinha foi o primeiro show do Anjos do Hanngar na danceteria, em 2001. “As pessoas não conseguiam caminhar de tão lotado. Tivemos de abrir uma das portas para ter mais espaço”, lembra.

Outra situação marcante foi uma noite em que a festa terminou mais cedo. Um veículo bateu no poste a 500 metros da casa de festa e acabou com a luz. Era apenas 1h da madrugada. “Não tinha mais o que fazer. A festa terminou e todos foram para casa”, conta.

Após mais de 500 festas em 11 anos, Tampinha vendeu a marca Millenium em 2007 e passou a animar os eventos como DJ de forma exporadica. Em 2008, a festa encerrava de vez em função da diminuição no público.

Danceteria Millenium reunia média de 800 pessoas por noite de sexta-feira / Crédito: Arquivo Pessoal

Segunda chance 

Quis o destino que Tampinha retornasse ao mesmo local com uma proposta diferente dois anos depois. Ampliando mais uma vez os espaços e criando até um “jardim aberto” no segundo andar, o empreendedor da noite lançou a danceteria Tampas, em 2010.

Com promoções e até cartão vip , a casa de festas também ganhou popularidade e reuniu centenas de pessoas, desta vez, nas noites de sábado.

A Tampas só acabou devido às exigências de adaptação no prédio para a prevenção de incêndios, exigido após a tragédia estadual na Boate Kiss de Santa Maria. “Era um investimento muito alto, não valia mais a pena”, reconhece Tampinha.

Hoje, o prédio às margens da ERS-482 não possui nenhum vestígio dos tempos de glamour. O espaço que antigamente reunia centenas de pessoas é utilizado como depósito.

Tampinha também deixou de trabalhar nas noitadas faz anos e investiu no ramo de palestras e terapias alternativas. Mas, ao passar ao lado do prédio, reconhece: “aqui vivi os melhores anos da minha vida”. Muitos jovens das décadas de 90 e 2000 sentem o mesmo.

Café de toda sexta

Quando o argentino Raul Picco, 64, alugou o endereço 51 da Avenida Acvat, no bairro Americano (Lajeado), objetivo era vender café e oferecer computadores com acesso à internet para a população lajeadense. Só que a proposta original, lançada em 11 de dezembro de 2003, mudou aos poucos.

Logo os computadores foram retirados e a música ambiente começou a quebrar o silêncio do cibercafé. Um dia, Picco olhou para a estrutura no outro lado da rua, de número 66 com uma placa de aluga-se, e resolveu apostar em um pub.

Em 3 de setembro de 2004, inaugurava o Café Virtual no endereço que o tornaria famoso como uma das danceterias de maior sucesso da região. “Comecei com quatro ou cinco caixas de cerveja no freezer e uns destilados. Ainda tinha a máquina de café”, relembra ao falar da primeira festa. “Não havia nem seguranças. Eu mesmo cobrava a entrada”, complementa.

O evento se popularizava nas noites de sexta-feira, até chegar um ponto em que Picco começou a parar frequentadores na porta pela falta de espaço. A média de público, segundo o proprietário, chegava a 900 pessoas por noite. “Toda a semana a gente agregava algo. Faltava uma festa assim por aqui”, resume ao falar sobre o motivo do sucesso.

Mais de duas mil festas foram realizadas nos 11 anos e seis meses da casa noturna / Crédito: Arquivo Pessoal

Conforme Picco, foram mais de 2 mil eventos organizados em 11 anos e seis meses. O Café Virtual encerrou as atividades em 2015 pelo desinteresse dos locatários do espaço em manter a danceteria lá. As festas de despedida estão entre as mais marcantes para o argentino. “Faltou espaço”, resume.

Até hoje, lamenta o desfecho repentino da casa e evita passar pela avenida que antes frequentava noturnamente. “Formamos uma grande família. No começo falava em ter umas quatro ou cinco mesas e vender café, mas virou a melhor festa de Lajeado”, acredita.

Picco até tentou abrir o Café Virtual em outro ambiente, na Avenida Alberto Pasqualini, mas sem o mesmo sucesso, acabou fechando após poucos meses. Um “remember” para relembrar os tempos de ouro do Café Virtual está sendo organizado, promete o empresário. Os detalhes ainda são segredos.

 

Café Virtual começou como um lan hause no prédio onde hoje está o Marreta / Crédito: Arquivo Pessoal

O famoso Rancho Bonanza

Linha Geralda se tornou conhecida dos amantes da música graças ao Salão Hagemann. Por décadas, a estrutura recebeu conjuntos musicais que atraiam centenas para a localidade interiorana de Teutônia.
Atentos às novas tendências, proprietários resolveram criar um novo conceito de festas no fim dos anos 90 e início dos anos 2000. Eles alugaram o espaço para duas promotoras de eventos: o Enigma e o Django Promoções.

Mauro André Mallmann, o “Maurinho”, foi o DJ residente desde a abertura no dia 10 de agosto até as últimas festas em 2010. Conforme ele, a balada ficou famosa pelo “queijinho”, iluminação e músicas “italodance”, aceleradas pelas 140 batidas por minuto (bpm). “Tudo isso criava um ambiente que mexia com o imaginário do público”, conta.

O auge do Rancho Bonanza foi os anos 2004 e 2005, aponta. A casa chegou a receber até 1,8 mil pagantes por noite nesse período. Maurinho percebe que esses momentos ainda seguem na memória das pessoas. “A gente marcou história. Sinto até hoje o carinho das pessoas”, afirma.

Mesmo com todo o sucesso, o Rancho Bonanza sucumbiu à acensão de novos estilos musicais. Na última década, o espaço foi utilizado apenas pela família de proprietários para eventos particulares.

ENTREVISTA
Pierre Bogorny

“Por melhor que seja, tudo tem um ciclo”

Com cerca de 35 anos de carreira, Pierre Bogorny, 50, conheceu a maioria das casas de festas dos vales do Taquari e Rio Pardo. Para ele, as danceterias encerram as atividades pelo fato do público buscar, de tempos em tempos, novos ambientes.

O que mudou das festas da década de 90 para hoje?
Mudou a psicologia dos evento. Nos anos 90 se tocava de tudo e todas as tribos iam para o mesmo lugar. Hoje, as pessoas são focadas em um ritmo. Quem gosta de funk vai só no funk, quem gosta do rock vai só no rock. Assim é difícil reunir público e as casas, principalmente as maiores, acabam se tornando inviáveis.

Quem empreende neste ramo diz que as casas noturnas têm prazo de validade. Por que isso acontece?
Todas têm um ciclo de vida. Mesmo que o lugar seja muito bom, as pessoas se enjoam e querem ir para outro lugar. Pode ser na mesma quadra. Isso acontece porque se cria um ciclo vicioso e o público de um lugar será sempre o mesmo. Ai a gente vê aquele lugar luxuosíssimo, mas o pessoal está indo num galpão de quatro paredes. É isso que acontece.

Algo pode ser feito para mudar isso?
É difícil. Por melhor que seja, tudo tem um ciclo. Há quem tente reformar a casa a cada período, mas nem sempre dá certo. É difícil fazer uma transformação para mudar a característica do evento e nem sempre é vantajoso financeiramente.

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