Há um momento na vida da gente em que o ciclo natural das coisas se inverte: quando nossos pais envelhecem de tal forma que nós também passamos a cuidá-los como um dia eles fizeram conosco. E isso, talvez, seja um dos mais belos ensinamentos que a vida nos dá – o sentido não-linear, mas circular e cíclico do movimento das relações da existência. Ainda mais que hoje em dia a expectativa de vida é bem maior do que tempos passados, com maiores informações sobre saúde e tecnologias para o campo da Medicina. Entretanto, nos deparamos com o crescente número de doenças psíquicas e degenerativas, como o Alzheimer e o Parkinson, que se apresentam grandemente em idosos. Tais patologias revelam a faceta humana que, não raras vezes, deixamos à margem do conhecimento por simples preconceito, já que vivemos num mundo ainda respaldado pelo culto da juventude e da saúde perfeita. Enfrentar a doença significa refletirmos também sobre as nossas vulnerabilidades e, mais do que isso, sobre a nossa finitude, o que desconstrói as nossas tolas ideias de controle sobre a vida e o tempo.
Nesse sentido, muitos filhos têm assumido o papel de cuidadores de seus pais, e nesse contexto há um ensinamento maravilhoso para todos nós: que a vida convida as pessoas a se colocarem no lugar do outro sem que notem, simplesmente porque este é o fluxo natural da existência. Poder ser “pai e mãe” de seus próprios pais não tem sentido heróico, mas sim humano, sensível e renovador para os paradigmas que trazemos, muitas vezes, engessados em nossos padrões mentais. Significa a chance do resgate de gerações através da compreensão de que a ajuda ao outro nos ajuda também. Curamos nossas feridas da alma. Descobrimos que só o amor liberta.
Exercer a “parentalidade de nossos pais” converte-se em oportunidade de gratidão, de bem querer e solidariedade, quando deixamos de lado a amargura da falta de paciência, a intolerância com as limitações apresentadas, a vontade de que tudo fosse do nosso jeito. E podemos nos perguntar: “Por que temos, como sociedade, tanta dificuldade em tratarmos nossos idosos com dignidade e respeito?” Eles são pessoas como nós, que refletem aquilo que, muitas vezes, não queremos ver.
Assim, que nossa sociedade amadureça para o estreitamento das relações com os idosos, a exemplo de civilizações orientais que há muito já se deram conta disso. Ser pai e mãe é amar. Simples assim.