Reduto da tradição

REDUTO DA TRADIÇÃO

Reduto da tradição

Expoente da cultura gaúcha, Dério José Marchi transformou a própria casa em centro de artes nativas. A residência do gaúcho fica no centro de Canudos do Vale. Lá, além de formar dezenas de músicos, ele repassa para jovens o apreço pelas canções tradicionalistas

Reduto da tradição

Quem vê a técnica e precisão rítmica de Dério José Marchi, 70, não imagina que tudo foi aprendido sem professores na Alta Forquetinha, interior de Canudos do Vale. Numa época sem televisão e rádios, Dério, ainda garoto, despertou o interesse musical ao participar da cantoria dos pais e tios. “A maioria não sabia ler ou escrever, mas tinha noção musical incrível. Era um dom”, resume.
Com 12 anos, ele e os irmãos Edemar e Hilário (in memoriam) compraram a primeira sanfona. O preço foi 35 cruzeiros, o que valia uma safra inteira de feijão cultivada pelos três aspirantes a músicos.
As primeiras notas e escalas foram aprendidas sozinho, relembra Dério. Tudo no ouvido. Com 19 anos, comprou uma nova gaita. O modelo Super 5 da Todeschini, que era referência da época e lhe acompanha até hoje.
Depois de criar as próprias bandas e passar pela famosa “Yankes” (com quem gravou o primeiro disco), Dério teve contato com a música gaúcha ao integrar o Grupo Sentinela. “Passamos por todos os CTGs do estado e conheci grandes artistas. Foi ali que me apaixonei pelo tradicionalismo”, resume.
Na década de 90, parou de se apresentar, mas continuou ligado ao mundo musical. De gaiteiro, passou a ser professor e propagar o apreço pela tradição aos jovens. As primeiras aulas eram voluntárias na própria casa, localizada no centro de Canudos do Vale. Depois, foi contratado para dar aulas em municípios como Progresso, Marques de Souza, Pouso Novo e Sério.
Pelas aulas de Dério, passaram mais de 500 alunos. Alguns seguem a carreira musical. Outros se tornaram professores, formam a próxima geração de músicos e multiplicam ainda mais a influência do antigo gaiteiro.
O trabalho de Dério revelou e ainda revela talentos escondidos nos interiores do Vale do Taquari.

Dério aprendeu a tocar gaita sozinho. Hoje, repassa os ensinamentos e o amor pela tradição aos jovens. Mais de 500 alunos já receberam os ensinamentos do morador de Canudos do Vale

Dério aprendeu a tocar gaita sozinho. Hoje, repassa os ensinamentos e o amor pela tradição aos jovens. Mais de 500 alunos já receberam os ensinamentos do morador de Canudos do Vale

A residência que virou reduto gaúcho

Embora tenha dedicado boa parte da vida à música, Dério teve outras profissões, como agricultor, taxista e caminhoneiro. Última atividade foi em uma ferraria instalada na própria casa.
Já aposentado e com a ajuda da esposa Nadir, decidiu transformar o antigo local de trabalho no Centro de Artes Nativas Querência Gaudéria. A inauguração ocorreu em 10 de janeiro de 2014, com o lema “educando através da música e das tradições”.
Quem chega ao local é recebido por Dério pilchado. Lá estão expostas indumentárias campeiras, eletrodomésticos antigos e réplicas de instrumentos de trabalho. Destaque para as miniaturas de moinho, monjolo e moedor de cana, que simulam o funcionamento das máquinas rústicas do passado. “Tenho a ideia e produzo. Tudo que está aqui foi eu que fiz”, comenta com orgulho.
Uma das novidades foi a construção de carrinhos de lomba com restos de madeira que podem ser usados pelos visitantes. “A maioria das crianças não conhece esse brinquedo. É uma forma de mostrar como era bela nossa infância”, acredita.
A entidade é aberta para visitação e recebe inúmeras escolas todos os anos. As visitas aumentam com a Semana Farroupilha.

FÁBIO KUHN – fabiokuhn@jornalahora.com.br

 

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