Um enxame representa perigo para muita gente. Centenas de abelhas protegem a rainha, os futuros filhotes e o precioso mel. Mas não há nenhum risco quando se trata de melíponas, espécies sem ferrão.
A maioria dos produtores começa por hobby e depois, com os resultados, investe em mais abelhas de espécies diferentes. Foi assim com Sérgio Krein, de Cruzeiro do Sul.
Apaixonado por abelhas, mantém no quintal da casa em torno de 90 enxames de várias espécies, com destaque para Mandaguari, Manduri, Mandaçaia, Mirim entre outras. A produção por colmeia varia de 50 gramas a quatro quilos.
No caso de Krein, onde o mel é colhido num intervalo entre 12 e 24 meses, a produção alcança até 20 quilos por ano. “O mel é muito saboroso e cheio de benefícios para a saúde. O aconselhado é deixar na geladeira, isso ajuda na conservação”, ensina.
Quanto aos cuidados, observa a temperatura do ambiente como determinante para as abelhas saírem do apiário em busca de alimento. “Elas trabalham a partir dos 22 graus. No inverno ficam dentro da caixa. Não forneço alimento, pois pode alterar o instinto e fazer com que o enxame morra”, diz.
Reforça a importância das abelhas para o ecossistema e a produção de alimentos. “Em alguns casos, elas respondem por até 100% da polinização. Hoje, com o uso demasiado dos agrotóxicos, muitas morrem e está cada vez mais difícil preservar a atividade”, lamenta. Outro problema são as abelhas Iratim, mais conhecida como abelhas limão. “Elas largam um feromônio. A substância faz os animais não se reconhecerem e brigarem entre eles até a morte”, explica.
Modelos distintos
Além de alojar as caixas em um sistema de ilha, todas elas possuem modelos e tamanhos diferentes. “Todas são experimentais. Quero identificar qual a melhor forma de alojar elas”, explica.
Com este sistema, todas, mesmo sendo de espécies diferentes, ficam no mesmo espaço. “Não tenho visto brigas nos cinco anos em que optei por esta mudança”, afirma.
No pátio existe uma diversidade de plantas, as quais garantem boa oferta de alimentos. Como desafio, cita a necessidade de elaborar campanhas para auxiliar na preservação das espécies e legalizar a atividade. “A maioria está na informalidade. Estamos carentes de informação e isso prejudica o avanço”, entende.
Meta é legalizar a atividade
Conforme o assistente técnico regional em Apicultura e Meliponicultura da Emater/RS-Ascar, engenheiro agrônomo Paulo Conrad, criador de abelhas sem ferrão há 45 anos, para uma maior expansão da meliponicultura, existe a necessidade de difusão de técnicas de manejo e cuidados com a criação racional. Esse conhecimento está nos criadores e muito pouco nas instituições, observa.
Outro passo importante é legalizar a atividade, ter certificação e inspeção do mel produzido para conseguir comercializar o produto dentro das normas de segurança alimentar. “Aprimorar as pesquisas, buscar mais conhecimento, principalmente no manejo e conscientizar quanto aos impactos causados pelo uso desenfreado de agrotóxicos”, coloca.
Estima existirem pelo menos cinco mil criadores no Vale do Taquari, muitos com uma ou até duas colmeias. “Enquanto uns estão no anonimato, outros tem uma centenas de enxames. É preciso implantar a cultura da preservação da espécie”, enfatiza.
Segundo ele, as abelhas nativas sem ferrão possuem uma função muito significativa na natureza. Principalmente pela polinização das plantas e manutenção dos ecossistemas agrícolas que produzem o alimento, além de produzirem um mel saboroso e rico em propriedades medicinais.
“É estimado que um terço da alimentação humana depende diretamente da polinização das abelhas, que foram consideradas os seres vivos mais importantes do planeta terra”, ressalta.
No Rio Grande do Sul, a Emater estima que 45 mil famílias estejam envolvidas com a apicultura e 10 mil com meliponicultura, tendo 24 espécies nativas catalogadas.
Humanidade ameaçada
“Se não fossem as abelhas, não existiriam seres humanos”, destaca o presidente da AMEVAT, Nelson Angnes, preocupado com os agrotóxicos e o desmatamento que são os grandes vilões dizimadores da espécie.
Angnes ressalta a importância para a sobrevivência no futuro e para garantir alimentos para todos. “As abelhas precisam de atenção. O bem que elas fazem ao mundo necessita sair da invisibilidade”, destaca.
Destaca que as abelhas estão ameaçadas de desaparecer porque está havendo muito desmatamento, destruindo assim suas colônias. “As pessoas não sabem que ao desmatar elas também estão destruindo inúmeras espécies de abelhas de grande valor, tanto para a natureza quanto para as próprias pessoas”.
Outro entrave a ser superado é a legislação sanitária e de processamento do mel dessas espécies, para que o produto destas abelhas possa entrar para o mercado formal e possa agregar renda aos criadores.
Preservação das espécies
Como maior dificuldade, relata a morte de abelhas nos últimos anos, muitas vezes originadas pela aplicação de agrotóxicos em lavouras. “Com a pulverização aérea, as perdas têm sido maiores e temos cada vez mais dificuldade de repor o número de enxames mortos”, lamenta.
Segundo ele, em meio ao cenário de apreensão, a criação racional de abelhas sem ferrão surge como forma de contribuir para a preservação das espécies e garantir a polinização de pomares e lavouras, gerando incremento na produtividade e na qualidade de frutas e grãos. “A humanidade acorda para a importância das abelhas, mas precisamos avançar cada vez mais”, aponta.
Os números dão a dimensão da importância da ação de aves e insetos para a agricultura. Segundo a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), 70% das culturas agrícolas dependem de agentes polinizadores, como abelhas (as mais eficientes), borboletas e besouros. Além de ampliar a produtividade de grãos como soja, canola e girassol em até 40%, a presença de abelhas resulta em aumento do teor de óleo nessas culturas.
Seminário
No dia 19 de outubro, a Associação de Meliponicultores do Vale do Taquari (AMEVAT) promove o IX Seminário Regional de Meliponicultura, no Parque do Imigrante, em Lajeado. O evento deve reunir mais de 500 defensores de abelhas sem ferrão do Rio Grande do Sul, das 8h às 17h.