A temática do combate à criminalidade não sai de pauta. Até hoje, nenhum país do mundo conseguiu acabar com o crime, nas suas mais diversas manifestações. O que alguns conseguiram foi reduzir os índices ao que chamam de “níveis aceitáveis”. Entre as medidas de que se tem notícia, uma das mais famosas baseou-se na teoria das janelas quebradas ou “broken windows theory”. Trata-se de um modelo norte-americano de política de segurança pública, que tem como premissa que a desordem é um fator de elevação dos índices de criminalidade. Se não forem reprimidos os pequenos delitos, as contravenções, as transgressões a regras expressas, haverá uma sensação de impunidade que conduzirá inevitavelmente a condutas criminosas mais graves. Para chegar a esta conclusão, pesquisadores da Universidade de Stanford realizaram uma interessante experiência de psicologia social. Deixaram dois carros idênticos, da mesma marca, modelo e cor, abandonados na rua. Um no bairro do Bronx, zona pobre e conflituosa de Nova York e o outro em Palo Alto, zona rica e tranquila da Califórnia. Em poucas horas, o carro abandonado no Bronx teve as rodas roubadas, depois o motor, os espelhos, o rádio. O carro abandonado em Palo Alto manteve-se intacto por vários dias, até que os pesquisadores decidiram quebrar um dos seus vidros. Ato contínuo, iniciou-se a depredação, idêntica à ocorrida no bairro do Bronx. A conclusão foi a de que um vidro quebrado transmite uma ideia de deterioração, de desinteresse, quebra os códigos de convivência, faz supor que a lei encontra-se ausente, que naquele lugar não existem normas ou regras.
Ao assumir o Ministério da Justiça, o ex-juiz Sérgio Moro levou adiante a promessa de campanha de reforçar o combate à criminalidade. As premissas são o aumento das penas para crimes graves, para o crime organizado e o combate à corrupção. Para isso, encaminhou ao Congresso Nacional o chamado Pacote Anti-crime. Já na semana passada, o Ministro da Infraestrutura Tarcísio Gomes de Freitas determinou a suspensão do uso de radares móveis nas rodovias federais. Segundo o despacho publicado no Diário Oficial da União, a medida visa “evitar o desvirtuamento do caráter pedagógico e a utilização meramente arrecadatória dos instrumentos e equipamentos medidores de velocidade”. Mas o que uma coisa tem a ver com a outra?
Tudo, na minha opinião. O descaso estatal em punir os responsáveis por transgressões menos graves, segundo as premissas do Ministro Moro, levará à prática de crimes mais graves. Por coerência, o cidadão poderia esperar a atuação estatal no combate a transgressões de toda e qualquer regra, seja uma infração de trânsito ou um homicídio. Se a ideia central da política de repressão é o endurecimento das punições, qual a razão para suspender a fiscalização daqueles que violam o Código de Trânsito Brasileiro? O cidadão que trafega acima do limite de velocidade sabe que, a qualquer momento, poderá ser flagrado e multado. Sem fiscalização, nossas estradas podem se tornar “terra de ninguém”. Como já cantou Caetano, alguma coisa está fora da ordem …
Opinião
Ney Arruda Filho
Advogado
Coluna com foco na essência humana, tratando de temas desafiadores, aliada à visão jurídica