Pasmem! Tem até “coaching da pegação” que “ensina pegar qualquer mulher nota 8, 9 ou 10, mesmo sendo feio, sem dinheiro ou sem qualquer outra qualidade”. Inacreditável, e tem quem compra.
O trabalho de coach é um processo, uma metodologia, um conjunto de competências e habilidades que podem ser absorvidas e desenvolvidas por qualquer indivíduo capaz de fazer sinapses sobre a evolução das coisas, seja no profissional ou pessoal. Esta é a definição mais próxima, segundo o IBC – Instituto Brasileiro de Coaching. Em síntese, trata-se de um trabalho profissional que estimula e desperta o potencial interno de outras pessoas.
Mas na prática, nem sempre isso ocorre. O tema desvirtuou, completamente. As inúmeras possibilidades na internet permitiram que o nome coaching seja utilizado por “qualquer um” para “qualquer coisa”. Têm “coaching” que mais parece um culto religioso de alienação, sem nenhuma base e nem coerência.
O neurolinguista e estudioso do comportamento humano, Nelson Spritzer, costuma brincar que se dermos um chute em algum toco por aí, sairá um monte de coach. Não muito diferente, o escritor e palestrante, Gabriel Carneiro Costa, descreve em seu livro Não Me Iluda que “é assustador ver coaches querendo ocupar lugar de psicólogos, filósofos, historiadores e psiquiatras”, quando mal completaram formação de 20 horas.
As pérolas e bizarrices são encontradas, principalmente, no mundo digital. Desde “Coaching do amor” para “aprender a conquistar mulheres com fórmula de sedução” até “Coaching da pegação” para “pegar qualquer mulher nota 8, 9 ou 10, mesmo sendo feio, sem dinheiro ou sem qualquer outra qualidade”. Extremos que sequer vale a pena comentar, embora muitos caiam na bobagem.
Apesar de não regulamentado, o trabalho de coach é muito útil, quando aplicado com seriedade e qualidade. É uma espécie de mentoria, envolvendo um tutor e um aprendiz. A fórmula é a mais antiga da humanidade para propagar e repassar conhecimento, mas por quem realmente tem algo a ensinar.
Os métodos, modelos ou fórmulas podem ser diferentes, mas todo trabalho sério está embasado por algo eficiente, ético e coerente. Do contrário, é manipulação e caça níquel.
Pessoalmente, converso com muitos empresários. Tenho percebido que os coaches, conselheiros ou consultores se confundem, muitas vezes, na organizações. Certo ou errado, no fim das contas, falta cliente para tanto “coach” que se apresenta por aí, vendendo soluções e ilusões.
Quando o círculo familiar ou profissional, ou mesmo de amizade, não nutre nossas necessidades de compreensão ou performance, talvez seja momento de escolher um profissonal específico e preparado para nos ajudar. Simples assim.
Contudo, qualquer desenvolvimento que envolva orientação e modificação de comportamentos deve ter um objetivo claro. Ampliar nossa resiliência ou capacidade de performar traz autonomia, autoavaliação e um maior poder de escolhas. Ainda assim, essa definição não engloba uma grande parte das práticas nomeadas como coaching.
É preciso ter muito cuidado com as soluções fáceis. Os vídeos malucos estão por toda parte. Geralmente, o instrutor conta cases de sucesso, como se fossem testemunhos de que sua técnica é eficaz. Ele trabalha na fragilidade das pessoas, mostra que elas podem ser diferentes. A estrutura do discurso é a mesma de uma ladainha. “Você está nessa situação agora e pode algo muito melhor, basta seguir os ensinamentos de…”, e por aí vai. Obviamente, a pessoa vulnerável se identifica com o discurso e cai.
É uma estrutura comercial presente em vários negócios, na propaganda, nos gritos de guerra e em tantas outras, flertando, muitas vezes, com a manipulação.
E por que essas práticas se mantém? Na verdade, “elas beneficiam as escolas de formação e os coaches de palco”, escreve o psicólogo Felipe Dias, em um de seus artigos de opinião, divulgados pela UFRJ. Aquela alegria e emoção sentidas no programa de “personal coaching” vão fazer o consumidor do curso querer fazer o curso “executive coaching”, depois o “business coaching”, “power coaching”, “extreme coaching”, “master ultra power leader coaching”, comenta.
No fim das contas, o coaching é um mercado que se retroalimenta. As escolas de formação em coaching, como qualquer outro negócio, buscam clientes cada vez mais fiéis e, para isso, criam soluções criativas de manutenção. A melhor forma é ter aspirantes a coaches, mas que de fato nunca se sintam completamente preparados. “Tudo construído em cima de um mercado de ilusões”, reforça Dias.
Ele compara a onda do coaching atual com as redes de marketing multinível. Por isso já existem o coach do coach dos coaches.
E a “indústria” não para.
Fundamental se dar conta de que não há fórmulas mágicas. Para trabalhar como business coach, por exemplo, além de formação em ciências de comportamento, é necessário estudar sobre negócios, liderança, empresas, mercado, decisões, pessoas, enfim.
Não basta criar um blog ou sair dando palestras, só porque alguns amigos da rede social curtem o que você posta. Cuidado com os animadores de torcida. Você se “pilha” hoje e amanhã não saberá o que fazer. Então sentirá falta por mais “carga”, e assim o ciclo vicioso se renova.
Uma formação ou um trabalho de coaching para se orientar e desenvolver comportamentos mais produtivos e com maior autonomia é sempre bom, mas escolha bem.
Do contrário, prefira bons livros. Eles costumam ser mais econômicos e com resultados bem melhores. Até mesmo uma simples conversa com alguém próximo, que não custa nada.
Opinião
Adair Weiss
Diretor Executivo do Grupo A Hora
Coluna com visão empreendedora, de posicionamento e questionadora sobre as esferas públicas e privadas.