“Viramos digitais para depois virar humanos novamente”
Palestrantes abordaram descontrole emocional e contradições humanas advindas da histeria digital coletiva que afeta a saúde física e mental. Também sobrou para o método ultrapassado de ensino.
O problema não é inovar, criar, nem mudar. O ser humano faz isso desde que surgiu. O risco está no efeito manada que impede análises e compreensões sensatas e fora dos padrões tradicionais. Talvez muitos não concordem com a coluna e vão dizer que a abordagem foi diferente. Se ocorrer isso, acertei o alvo.
Desintoxicar para fazer as mudanças compatíveis com os desafios em nossas empresas e na vida pessoal me parece o caminho sugerido. Esta é minha interpretação na soma das quatro excelentes palestras, nesta quinta-feira, durante a convenção lojista da CDL Lajeado, no CTC.
O evento conseguiu traduzir a loucura digital coletiva em um alerta para não cair na armadilha do comportamento robótico, que apenas repete padrões adotados pela maioria.
Começo pelo último palestrante que, pra mim, foi o melhor. O jovem Murilo Gun deu uma aula de desprendimento do efeito manada. “A criatividade é atrofiada ao longo da vida. Os pais se orgulham do filho estudioso e não do curioso”.
Gun atacou o ensino que tenta enquadrar os alunos, todos iguais. Citou que a Revolução Industrial contribuiu para criar um método repetitivo e padronizado em sala de aula, criando “soldadinhos” que não questionam, apenas repetem processos de manhã até de noite.
Chamou atenção para o olhar vertical, agravado pelo despreparo do uso das tecnologias. “As pessoas não tem mais vida. Elas só estão no celular”, observou.
Três bloqueios são fatores vitais para a falta de criatividade nas pessoas, na opinião de Gun: o bloqueio de especialista – que busca saber apenas sobre sua área de interesse, sem nenhuma curiosidade ao diferente à sua volta; o bloqueio do gabarito – exige memorizar e repetir padrões sem questionar; e o bloqueio do medo – enraizado pelas repressões que recebemos desde crianças para nos enquadrar no modelo “ideal” de sociedade, “sem fazer feio”.
O antídoto para enfrentar estas limitações é a criatividade, a imaginação e a coragem.
Confusão coletiva causa ansiedade
A dinâmica e velocidade tecnológica criaram uma confusão na cabeça das pessoas, pois os modelos mentais da maioria não estão preparados para absorver a transformação digital. Isso causa ansiedade, fazendo muitos se atirar, querer absorver tudo, o tempo todo, o mais rápido possível, sem controle, nem criticidade, repetindo o padrão do efeito manada. Eis o perigo.
O segredo está em dominar a tecnologia e não ser denominado por ela. “Pesquisas mostram que pessoas checam seu celular a cada 8 minutos. Isso gera falta de foco e indisciplina, que é o maior problema digital”, observou outro palestrante, Tiago Mello.
Isso pode acabar com um negócio e a saúde de uma pessoa.
A negação aos processos e o excesso de superficialidade igualmente tornam o brasileiro mais improdutivo. Criatividade demais para pouca prática não resolve nada. Certezas absolutas também são vistas com ressalvas, segundo Mello. Ele citou que há cinco anos diziam que as lojas físicas acabariam. “Hoje, as empresas digitais criam suas lojas físicas”.
Equilíbrio é a sugestão
A histeria – seja no tempo que for – nunca foi algo inteligente e sustentável. Martha Gabriel “enlouqueceu” os participantes com sua performance e recomendação digital. Mas fez um alerta: a sobrecarga digital tende a nos levar a outros problemas.
“Viramos digitais para depois virar humanos novamente”.
Para mim, a frase é a mais impactante e atual. A cegueira digital ainda carece de embasamento científico em maior escala, mas a sustentabilidade humana não está nela. Novas doenças e síndromes epidêmicas causarão um problema social e de saúde pública sem fronteiras, logo adiante. E dão apenas os seus primeiros sinais. Depressão, suicídio, síndrome do vazio e tantas outras farão parte de nossas vidas por conta do mau comportamento tecnológico.
Negar completamente o digital é tão nefasto quanto se atirar nele. Inquietude não tem haver com loucura ou histeria. “A jornada do consumidor busca experiências sem atrito. Não importa se no físico ou digital”, recomendou Fabiano Zorteá, que abriu o evento.
Para as marcas, o valor não está no preço, nem na qualidade do produto ou da compra. Está na sensação que a experiência provoca, muitas vezes, conectada com outro atributo complementar que, necessariamente, não é o produto de venda em si.
Citou como exemplo uma barbearia do subúrbio americano, que se diferencia ao entregar um livro para crianças lerem em voz alta enquanto cortam o cabelo. “O vídeo desta experiência viralizou”.
Finalizo minha reflexão de hoje, afirmando que o equilíbrio está em se permitir repensar. Abrir a cabeça é ter curiosidade sobre o desconhecido. Passar o dia ao celular ou negar toda e qualquer tecnologia, levará ao desequilíbrio. Ignorar o valor humano nas relações comerciais e pessoais, igualmente, nos padecerá.
Sejamos equilibrados. Isso ocorre quando refletimos.
E se…(?)