A peste suína africana já matou mais de 200 milhões de animais (plantel total é estimado em 700 milhões) na China. A situação no continente asiático ajudou a evitar uma crise na cadeia produtiva brasileira.
Aliás, a expectativa de produtores, entidades ligadas ao setor e indústria é de voltar a patamares de exportações alcançadas em 2017, quando quase US$ 500 milhões em carne suína foram embarcados para o exterior.
No ano passado, somente em carne suína, o Rio Grande do Sul exportou US$ 80,88 milhões para a China. Foram mais de 413 mil toneladas vendidas.
Os chineses compraram 32% do total de carne suína embarcada em maio pelo país. As 21,1 mil toneladas representam uma alta de 51%, em comparação ao mesmo período de 2018, de acordo com dados da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA).
O cenário deixa o suinocultor André Quinot, de Forquetinha otimista. Na granja em Araguari mantém um plantel de 4 mil animais. “Nosso diferencial está na sanidade. Acredito na melhora do preço e das exportações. Alguém vai precisar atender esta demanda e nos temos que aproveitar a oportunidade”, entende.
Quinot pretende inclusive ampliar o plantel em mais 1 mil suínos. “Aguardamos a licença da integradora”, adianta.
Novos investimentos
Valentim Bergmann e a mulher Marciane Kuhn, 37, de Canudos do Vale, alojam 1,2 mil leitões. Os dois galpões foram construídos faz quatro anos e um novo está em fase de conclusão, com capacidade de receber outros 650 animais.
O investimento é motivado pela boa fase vivida pelo setor. “O preço médio por cabeça saltou de R$ 7 para R$ 10 no último lote”, diz Bergmann. Para manter os resultados, redobraram os cuidados sanitários após a epidemia na China. “A saúde dos animais é o nosso maior patrimônio”, entende Marciane.
Preservar a credibilidade
O assunto foi discutido durante a Suinofest, de Encantado. Durante o seminário de suinocultura, o presidente da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), Francisco Turra, entende que a preparação para este novo ciclo brasileiro nas exportações do produto passa pelo reforço na fiscalização de portos e aeroportos para impedir o ingresso do vírus.
Segundo ele, os chineses já eliminaram mais de 25% do plantel suíno, em torno de 12 milhões de toneladas. Com isso faltarão oito milhões de toneladas no comércio mundial de carne suína apenas para atender a China. “O Brasil precisa preservar a credibilidade e a condição sanitária para ganhar esse mercado, a exemplo do que aconteceu com a avicultura no episódio da gripe aviária em 2006, quando o país alcançou o primeiro lugar no comércio mundial e não perdeu mais a posição”, lembra.
Para o presidente do Fundo de Desenvolvimento e Defesa Sanitária Animal, Rogério Kerber, o Brasil vive um momento auspicioso na suinocultura e que, mesmo assim, não pode desconsiderar que “2019 é o ano mais desafiador do setor no Brasil, em função da necessidade de manter o status sanitário do rebanho suíno”.
De acordo com o professor da Ufrgs e coordenador do Comitê Estadual de Suinocultura, David Barcellos, os cuidados para afastar a peste e as demais doenças, são os mesmos. “As ações de prevenção e controle envolvem atividades de biosseguridade e restrição de acessos. Já existe muita informação, todos já sabem o que fazer, é preciso apenas adotar as medidas”, sentenciou.
Para Charles Tang, presidente da Câmara Brasil-China reforçou a importância do produto no país asiático. “A carne suína está para o chinês como o feijão para o brasileiro”, afirma.
Apesar de possuir status livre da peste suína africana, no país foram registrados dois surtos nos Brasil, o último em 1978, no Rio de Janeiro.
Cautela em meio a euforia
O ânimo do presidente da Associação dos Criadores de Suínos do Estado (Acsurs), Valdecir Folador é justificado pelo tamanho do mercado chinês. O país consome mais de 50 milhões de toneladas de carne suína por ano, o que corresponde a metade de todo o consumo mundial do produto. “O país é o segundo maior importador do Brasil. Abre a possibilidade de termos um excelente desempenho até 2021, pelos menos. O montante perdido devido à peste é quatro vezes o volume do que é produzido aqui”, compara.
Para Folador o setor avícola e de carne bovina também terá reflexos positivos. Apesar no cenário favorável, não recomenda o aumento do plantel no momento.
Aumento de preço e abates
Apesar de não exportar carne suína para o continente asiático, a Cooperativa Languiru, de Teutônia, projeta bons negócios. Conforme o presidente Dirceu Bayer, no ano passado a cadeia de suínos e aves registrou prejuízos devido ao preços baixos e alto custo dos insumos. “Nosso resultado financeiro só não foi pior por que temos outros negócios que proporcionaram lucro”, observa.
Com o preço dos grãos, como milho mais baixos, a realidade é outra. Com a peste, segundo Bayer, o preço pago ao produtor pela cabeça subiram e aliado ao menor custo de produção, o lucro está mais satisfatório. “A demanda pr carne aumenta, tanto no mercado interno, como externo”, diz.
Embora não projete investimentos na área, como ampliação do plantel, a cooperativa busca habilitação para elevar o número de abates por dia. “Queremos chegar a 1,7 mil por dia”, adianta.
Além dos suínos, acredita em melhores resultados para a avicultura. Quem não tem condições de pagar um preço mais alto pela carne de porco, vai optar por comprar frango, aponta. Neste segmento está previsto um investimento de R$ 55 milhões para duplicar a capacidade de abate do frigorífico (220 mil aves por dia) e agregar novos produtores.
Controle sanitário
Conforme Carlos Alberto de Figueiredo Freitas, presidente Executivo da Dália Alimentos, de Encantado, a peste resultou na redução do rebanho, seja por abate sanitário ou por abate antecipado de suínos sadios, destinados à formação de estoques preventivos.
Esses abates representaram uma redução entre 25 e 30% do plantel suíno na China e, considerando que aquele país produz e consome 50% da produção mundial de suínos é como se o mundo tivesse reduzido sua produção entre 12,5 a 15%, compara.
Esta situação causou um desiquilíbrio entre a oferta e a demanda, assim como elevou os preços no mercado internacional.
“Todos os países exportadores sem a doença são os potenciais abastecedores dessa lacuna no mercado internacional”, afirma.
Até agora, o Brasil não tem ocorrência dessa doença e, portanto, vem sendo beneficiado, já que o país pode participar do mercado internacional, que dispõe de preços mais rentáveis do que os praticados no mercado interno.
“Como sempre, é extremamente importante que cada país tenha controle sanitário de seus animais, pois rebanho sadio é condição básica para habilitação e participação no mercado internacional de carnes”, enfatiza. Por dia são abatidos 2,7 mil animais. Os produtos também têm visibilidade no exterior, com exportação para 20 países localizados no Continente Asiático e Africano e no Leste Europeu. A exportação tem como principal destino Hong Kong, que registrou 30% das exportações em 2018, seguido do Vietnã e Cingapura. Em 2018, a Dália Alimentos obteve Receita Operacional Bruta de R$ 1.142 bilhão e a suinocultura representou R$ 462 milhões, o equivalente a 40,45% do faturamento.