Lembranças de um trabalho em extinção

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Lembranças de um trabalho em extinção

Adelar Foltz, 76, é um dos últimos alfaiates ainda atuantes na região

Lembranças de um trabalho em extinção

“Para a primeira calça que eu fiz na minha vida, eu trabalhei uma semana inteira”. Era a década de 50 quando Adelar Foltz, 76, iniciou as aulas de alfaiataria com um profissional do bairro Conventos, a exemplo da mãe, costureira. Com pouca prática, o trabalho minucioso demorava dias para ser concluído. Aos poucos, a cautela deixou lugar à agilidade e maestria. Mas a demanda ainda exigia noites em claro na “oficina”.
Naquela época, as máquinas de costuras, tesouras e fita métrica já eram as principais instrumentos de trabalho. Depois de duas ou três provas pelos clientes, o traje estava pronto para ser passado pelos ferros – hoje elétricos. “No meu tempo de aprendiz, era um ferro à carvão”, recorda Foltz.
Formado com apenas 17 anos, o alfaiate trabalhou com muitos profissionais da área até criar uma sociedade com um amigo e abrir a própria alfaiataria. No início, havia cerca de dez alfaiates pela região. “Era uma profissão bem quista”, entende Foltz.
Hoje, com as grandes produções em confecções, o movimento diminuiu e o trabalho foi desvalorizado. Foltz, já aposentado, é um dos últimos a exercer a prática na região.
 

Bailes de debutantes

“No meu tempo de jovem, todo mundo usava terno, e tinha que ser sob medida”, explica Foltz. Em festas de primeira eucaristia, confirmação ou crisma, crianças escolhiam as melhores calças.
Era comum nos bailes de debutantes os homens fazerem filas para medirem os trajes na “oficina” de Foltz. “Na época, a gente fazia smokings. Hoje não se usa mais, mas naquele tempo não podia entrar em um baile sem smoking”, lembra o alfaiate. Tinha ocasiões que a demanda acumulava 30 trajes que eram feitos durante as madrugadas, para ser possível cumprir os prazos prometidos.
Era comum usar a caxemira, depois o tergal e hoje o poliéster para fazer os trajes que nos anos 50 não se aventuravam em cores diferentes do azul, cinza, ou preto. “Hoje já são mais coloridos”, compara Foltz. Mesmo não confeccionando gravatas, não raras vezes os clientes visitavam a alfaiataria para pedir ajuda no arranjo do “nó”.
 

Histórias da profissão

Não faz muitos dias, um jovem entrou na alfaiataria para pedir o conserto de um sapato. “Ele viu uma máquina de costura e imaginou que eu fizesse o conserto”, conta Foltz, entre sorrisos.
Em outra ocasião, uma senhora levou até a “oficina” um terno para ajustar. “Ela trouxe o casaco de um cara que acho que pesava 120 quilos, e queria reformar para um de 60. Eles acham que é fácil, só diminuir, mas teria que desmanchar toda a peça”, lembra.
Com 62 anos na profissão, o alfaiate não costumava treinar aprendizes. Uma vez um rapazote quis aprender, mas não aceitou ficar trabalhando dois anos sem receber. “Era assim que aprendemos, trabalhando”, comenta.
Mesmo aposentado, não deixa de manusear a máquina de costura e atender os clientes mais antigos. Entre uma costura e outra, fez ternos para muitos médicos e políticos da região. A profissão lhe trouxe muitas amizades.
Casado faz 52 anos, Voltz teve uma filha e uma neta. Ele não sabe quanto tempo ainda vai poder trabalhar na oficina, e acredita não existir na região alguém mais novo que permaneça com a prática. “Também estou ficando velho. É uma pena que esta profissão está indo para o fim.”
 


 

BIBIANA FALEIRO – bibiana@jornalahora.inf.br

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