O que está acontecendo no bairro Santo Antônio é muito sério para ser tratado apenas como caso de polícia. Ainda dá tempo de quebrar o estigma do “nós” e o “eles” e estancar a marginalização, desde que tenhamos grandeza de assumir nossa responsabilidade.
Foi um erro construir os condomínios populares Novo Tempo I e II no local onde estão? Sim, foi. O resultado material da mega operação policial do último domingo foi pequeno? Sim, muito. A grande maioria dos moradores do Novo Tempo são pessoas de bem? Sim, sem dúvida. O tráfico de drogas se infiltrou e criou poder paralelo dentro dos condomínios? Sim.
Se tudo acima é real, por onde começar a mudar a realidade que rouba a cidadania de milhares de lajeadenses?
Moram no Novo Tempo mais de 1,5 mil pessoas, população próxima a todo o município de Sério, por exemplo. Calcula-se algo em torno de 400 a 500 crianças, cuja rotina é impactada pelo barulho dos tiros, pelo entra e sai de traficantes que ameaçam, amedrontam e ditam as regras.
A polícia deu uma resposta nesse domingo e, pelas palavras do delegado regional José Romaci Reis, reassumiu o comando de forças no local. A mobilização e o aparato policial foi passo importante, ainda que seja insuficiente para encaminhar uma solução definitiva. O problema do Novo Tempo não se resolve com bala.
O drama criado no Santo Antônio tem a ver com toda a sociedade lajeadense. Maioria das pessoas que mora lá tem chaves de muitas casas de bairros nobres da cidade. Faxineiras, pedreiros, garçons, industriários, comerciários, vendedores, ganham a vida trabalhando pelos mais variados locais e setores, e assim como eu, você, todos nós, lutam para garantir um futuro melhor para si e para seus filhos.
A partir desse entendimento, ergue-se a mobilização pública e social que precisa ocorrer para acabar com a marginalização e tentar igualar o mundo de oportunidades para quem vive na periferia. Um passo se deu ontem, em dois momentos.
A primeira, com a intervenção do Ministério Público e a Secretaria Municipal de Habitação, ouvindo e recadastrando todas as famílias que moram no Novo Tempo. Elas não podem continuar órfãs de serviços públicos descentes, muito menos de um amparo que lhes auxilie a enfrentar os problemas sociais que se apresentam todos os dias.
A outra foi à noite, com a ação Visionários da Cidade, ligada ao Comitê de Governança Empreendedora de Lajeado, com o propósito de formar líderes e estimular o protagonismo cidadão dos jovens.
Pacto pela paz
Uma terceira iniciativa é o Pacto pela Paz, adotado pelo governo municipal em parceria com o Instituto Cidade Segura, cujo trabalho consiste no reestabelecimento do convívio harmonioso em áreas conflagradas.
Ainda que o CIEP seja um colégio estadual, é lá que o Pacto pela Paz deveria iniciar sua atuação. Professores, alunos e comunidade escolar estão carentes, precisando de ajuda para conseguir equilibrar as emoções conflitantes das crianças e adolescentes. O corpo docente se desdobra em meio à insuficiência de professores. “Chegamos a dar banho em algumas crianças que chegam até a escola”, confessa a professora Adriane, 20 anos de CIEP.
Um novo tempo
Lajeado ainda é uma cidade pequena se comparada às grandes metrópoles nacionais e mundiais. Seus problemas ainda são pequenos diante da realidade dos grandes centros. Ainda assim, é preciso agir diferente para não caminharmos para o mesmo desfecho. Já assentamos a pobreza no Santo Antônio e alimentamos os bolsões de miséria. Não podemos continuar errando. É hora de iniciar uma transformação, mobilizar as forças públicas, privadas e sociais e assumir o papel de agente desse novo tempo que precisa nascer na periferia lajeadense.
Prioridades
Lajeado está em frenesi em busca de um “sim” para a instalação de um colégio militar na cidade. Agora, ouço que Encantado se articula para entrar na lista também. Investir e aumentar as possibilidades de acesso ao ensino e a educação nunca são demais, bem pelo contrário. No entanto, penso que antes de apostar as fichas em novas instituições, deveríamos olhar com mais carinho para as existentes. Todas, especialmente as estaduais, estão precisando de aportes e investimentos, seja na infraestrutura ou no número de professores. E o detalhe, são elas que atendem as crianças com menos capacidade financeira.
Banners na calçada
O assunto abordado na coluna faz duas semanas, sobre instalação de banners de publicidade nas calçadas de Lajeado, deu o que falar. A fiscalização, com notificações contra comerciantes, anunciada pelo governo municipal, deve começar na próxima semana. A ideia, explica o secretário de Planejamento, Rafael Zanatta, “é mais alertar para o que diz a lei em vez de sair multando os comerciantes. Se as pessoas entenderem que a legislação atual está errada e que esse tipo de publicidade é algo importante para a cidade, elas podem conversar com os vereadores para alterar essa lei”. Bem democrático.