Gisele Barcelos ganhava R$ 940 trabalhando em uma fábrica de calçados em Bom Retiro do Sul. Quando perdeu o emprego, passou a depender dos R$ 172 pagos pelo programa Bolsa Família. Recebeu o benefício durante seis meses. Toda vez que pegava o dinheiro, comprava comida, fralda e leite para as crianças. Sobravam apenas alguns trocados.
Com o marido também desempregado, ficou impossível pagar o aluguel. A saída foi voltar para Estrela, onde mora a mãe. Construíram uma pequena casa de madeira nos fundos do terreno. Ali vivem ela, as duas filhas, de 1 ano e 2 meses e 4 anos, e o marido. Também desempregado, ele consegue apenas trabalhos informais temporários.
A mudança trouxe um problema. Por morar no mesmo terreno, foi incluída no cadastro da mãe, que não tem direito ao benefício. A família ficou sem renda.
Eu preferiria voltar a trabalhar porque eu ganhava bem mais do que o Bolsa Família. Estou procurando, mas está bem difícil”, conta Gisele, que parou de estudar na sétima série.
A família vive no loteamento Marmitt, região pobre no bairro Moinhos, em Estrela. São casas simples, a maioria de madeira, e muitas dividem terrenos com outras. No local, é comum encontrar lares que dependem ou já dependeram da verba paga pelo governo federal.
Dinheiro dura um dia
A alguns metros dali, mora Jaqueline Machado. Até 2014, ela também trabalhou em fábrica de calçados. Desde então está desempregada. Com depressão, ela tentou o benefício do INSS. “A causa foi ganha, mas o juíz ainda não liberou o dinheiro”, afirma.
Todos os meses ela recebe R$ 170. Até o começo de 2018, eram R$ 300. Ela não entendeu o motivo da redução. “Não dá para quase nada. Tenho que comprar remédio, comida para as crianças. No primeiro dia o dinheiro se vai.”
O marido, Nelson Vargas, já trabalhou como gari, lixeiro e auxiliar de transportadora. Hoje, recolhe papelão para reciclagem. Ganha cerca de R$ 500 por mês. Com esta renda, o casal tem que sustentar as duas filhas, de quatro e sete anos e, em breve, mais uma criança. Jaqueline está grávida cinco meses. Eles moram em uma casa de duas peças sem banheiro no terreno da mãe de Nelson. Para garantir o sustento, eles contam com ajuda dos vizinhos. “A gente tem que viver, né?”, comenta Nelson.
Seis mil famílias no Vale
Na região, são 6.268 famílias beneficiadas pelo programa. Em outubro de 2016, eram 6.537. A redução é de 4%. Em dezembro de 2018, foram repassados R$ 1,03 milhão a estes beneficiários. Uma média de R$ 165 reais por família.
O município com maior percentual de beneficiários é Boqueirão do Leão. 12,5% da população local tem acesso ao programa, são 377 famílias. O município com menor acesso é Vespasiano Correa, onde há apenas duas famílias cadastradas, representando 0,2% da população
Nessa terça-feira, completou 15 anos que o programa de transferência de renda se tornou lei. Criado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em outubro de 2003, por uma medida provisória, o Bolsa Família virou lei em 9 de janeiro de 2004.
“É pouco, mas muitas vezes tudo o que tinha”
Mãe de três filhas, Marisa Duarte da Silva, 34, recebe o auxílio Bolsa Família faz 15 anos. Diarista no cultivo do tabaco, lembra dos períodos de aperto e que o valor mensal de R$ 130 socorreu para colocar os alimentos dentro de casa.
“Não dá pra comprar muito, mas é uma grande ajuda”, revela. Atualmente ela mora com o companheiro Luciano Bechert, 31, na área rural de Boqueirão do Leão. Estão juntos há cinco anos e se viram da forma que podem para dar boas condições às filhas de Marisa.
Ana Paula, 18, é a mais velha das três meninas, lembra da importância do auxílio. “O Bolsa Família ajudou muito quando a mãe não tinha onde trabalhar e não entrava dinheiro em casa”, conta.
A dificuldade em conseguir emprego, cuidar das filhas e ter onde morar emociona Marisa, mas ao mesmo tempo dá mais força para vencer na vida. “Saúde em primeiro lugar, o resto se conquista. O bom seria não precisar do Bolsa Família, mas enquanto a situação não melhora é uma grande ajuda”, destaca.
MATHEUS CHAPARINI – matheus@jornalahora.inf.br