A qualidade de vida na praia é superior às condições experimentadas em áreas mais urbanas. Até mesmo se comparada com outros locais fora das metrópoles, como o campo ou a montanha. Isso é consenso entre moradores do litoral e veranistas. Principalmente durante o verão. Estudos comprovam. Os ambientes naturais que proporcionam contato do homem com a água têm efeitos positivos sobre a saúde e o bem-estar das pessoas.
O litoral é reconhecidamente um lugar de descanso e diversão. E diversos aspectos confirmam os benefícios. Morando no litoral, é possível ter acesso mais fácil a peixes e frutos do mar frescos, o que significa um aumento na ingestão de gordura poli-insaturada. Além disso, o calor e o clima praiano são convites para o consumo de alimentos mais refrescantes, como frutas e saladas.
Exercícios também fazem parte da qualidade de vida na praia. No litoral, há possibilidade de dedicação maior aos esportes, como alongamento, yoga, caminhada, corrida, ciclismo, surf e natação. E todos podem ser praticados à beira-mar, proporcionando relaxamento, bom humor e lazer aos moradores ou veranistas.
Em tese, são essas características que despertam, cada vez, essa intensa migração de pessoas do Vale do Taquari para o litoral. Foram essas as motivações, por exemplo, do lajeadense Cristiano da Silva, 40, que desde o mês passado trocou as ruas de Lajeado pela orla de Capão da Canoa, no litoral norte do RS.
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Recentemente, assumiu a sociedade em um bar estilo pub na mais populosa praia do estado. Denominado Spartacus Churrasco Grego Gourmet, o empreendimento está localizado bem no centro de Capão da Canoa, cidade com pouco mais de 52 mil habitantes, mas que durante o período de verão vê sua população praticamente dobrar com a chegada dos veranistas.
“A casa nasceu para ser um ambiente descontraído e com gastronomia variada. No cardápio, estão vegetais e legumes orgânicos, petiscos nacionais e regionais, e o delicioso churrasco grego (shawarma). Tudo é baseado no estilo de comida do Mediterrâneo”, anuncia o empreendedor lajeadense.
“Cheech”, como é chamado entre os amigos, já viveu outras experiências na praia. Na década passada, morou por algum tempo na “Ilha da Fantasia”, Florianópolis. Mais precisamente na Praia dos Ingleses, onde trabalhou em uma pousada junto com conhecidos de Lajeado e realizou o primeiro empreendimento com o atual sócio, Robson de Oliveira, de Caxias do Sul.
“São 16 anos de amizade. Em 2004, fizemos uma festa juntos em iate, e agora resolvemos iniciar esse projeto-piloto aqui em Capão da Canoa. É adequado às nossas necessidades e plano de negócio. Acreditamos que esta cidade é uma porta de acesso para outros municípios do estado e também de outras regiões”, resume.

Natália com o filho Davi. “Antes morávamos em Porto Alegre e nossa vida se resumia a shopping e praça do condomínio. Hoje temos mais liberdade.”
“Tudo se torna mais simples”
Natália Heineck nasceu em Lajeado em fevereiro de 1984. Em março de 2015, resolveu morar em Garopaba, motivação que veio após o nascimento do primeiro filho, Davi, hoje com 5 anos. “É um paraíso. Praias lindas, cidade pequena e tranquila. Sempre pensei em criar meu filho longe de tanta violência e em um lugar onde eu daria a ele mais qualidade de vida.”
Na cidade, mora com o namorado e é vizinha da irmã e do cunhado. Todos lajeadenses. Ela está satisfeita com a escolha, e reforça a preocupação com o pequeno Davi. “Para mim, isso não tem preço. Brincar na rua, na praia, na pracinha. Crescer tendo outros valores de vida. Antes morávamos em Porto Alegre e nossa vida se resumia a shopping e praça do condomínio. Hoje temos mais liberdade.”
“Nati”, como é conhecida entre os amigos, já morou também no Estado da Califórnia, nos Estados Unidos. É uma aventureira por natureza. E não pensa em voltar. “O custo de vida é mais baixo, e tudo aqui se torna mais simples. Precisamos de muito menos pra viver na praia. Não pretendo sair daqui. Encontrei meu lugar”, resume.
“Quase não uso carro”
A arroio-meense Maria Dolores Wathier Wolschick nasceu em 1962. Em 2015, comprou um terreno em Garopaba junto com a filha. “Sempre tive o sonho de morar na praia. Depois de alguns anos veraneando, decidimos dar início à concretização do sonho.” A escolha pela cidade catarinense veio ao natural. “É um lugar tranquilo, de belíssimas praias e que proporciona muita qualidade de vida. É um lugar sem violência, onde podemos manter portas e janelas abertas.”

Aos 55 anos, “Toli” já mora faz um ano em Garopaba e não pretende voltar. “Esporádicas vezes eu me desloco de carro.”
“Toli”, como é chamada nas rodas de amizade, gosta de caminhadas. “Aqui posso fazer diariamente em contato com a natureza. E consigo fazer praticamente tudo caminhando. Esporádicas vezes eu me desloco de carro”, diz ela, que foi morar definitivamente em Garopaba faz pouco mais de um ano e hoje não pensa em voltar. “No início foi mais difícil, pois não conhecia muitas pessoas. Com o tempo, fiz amigas que também optaram pela vida na praia. Hoje nos encontramos quase todos os dias pra tomar ‘chimas’. Não penso em voltar, me sinto em casa aqui”, finaliza.
“A tranquilidade a favor, e a sazonalidade contra”
O empresário João Caetano Puerari saiu pela primeira vez de Lajeado em 2004. Foi morar durante um ano na Nova Zelândia, pequena ilha da Oceania. Em 2007, mudou-se para a Austrália, onde ficou cerca de dois anos. O espírito aventureiro e praiano é compartilhado com a noiva, Taís Gregory, que também foi morar no paradisíaco continente em 2007, ficando naqueles mesmos países.

Caetano com a noiva Taís e o pequeno Benjamin, que já é “nativo” de Garopaba. “Tenho saudades de Lajeado, mas não voltaria.”
Ambos chegaram juntos em Garopaba, uma das cidades que mais recebe lajeadenses no estado de Santa Catarina. O ano era 2010. “Escolhemos o local pela beleza natural, e pelas boas ondas para a prática do surfe. Eu já veraneava aqui com a família desde 1990”, conta o empresário e surfista. Há oito anos vivendo no pico, define bem os prós e contra do litoral catarinense. “A tranquilidade a favor, e a sazonalidade contra.”
Em 2010, eles arrendaram o restaurante Kimo. Quatro anos depois, em janeiro de 2014, iniciaram o próprio negócio. Uma hamburgueria chamada Guna Madê. O local é sucesso entre os veranistas e turistas, e constantemente é muito bem avaliado pelos mais diversos sites e blogs sobre viagens e gastronomia. Mesmo assim, Puerari alerta novamente para os riscos da sazonalidade.
“É o inimigo dos empresários no litoral. Passamos o ano numa cidade de 30 mil habitantes, e vamos para 200 mil durante 60 dias do verão e para 300 mil no Réveillon. Tenho oito funcionários durante o ano e 24 nesta temporada. E treinamento para um serviço de excelência gera custos e leva mais tempo que o próprio período de trabalho”, comenta.
Ele também alerta para a elevação do custo de vida. “O turista vem com dinheiro para gastar. Isso gera oportunidade de cobrar mais. Tornando tudo mais caro. Do ‘miojo’ até os terrenos. Para o morador, é um custo de vida muito alto”, ressalta. Sobre os pesos nas contas, cita o aluguel anual de imóveis. “Na temporada, os proprietários cobram diárias altas. Então, precisam que o aluguel anual seja, no mínimo, igual ao que ele ganha naqueles 60 dias.”
Ainda assim, ele não se arrepende da escolha de trocar o asfalto da cidade pela areia de Garopaba. “Tenho saudades de Lajeado, mas não voltaria, pois meu lazer é surfar e Lajeado não me proporcionaria esses momentos. Lajeado se tornou o melhor lugar do mundo para visitar. Aqui, pegar uma praia, surfar, cachoeiras e trilhas são de graça”, resume.
Rodrigo Martini: rodrigomartini@jornalahora.inf.br