O Natal de Anita

Opinião

O Natal de Anita

Anita pensou mais de duas vezes antes de participar do amigo-secreto da firma. Com seis funcionários na empresa, as chances de pegar ou ser pega por Airton tornava aquilo tudo uma verdadeira roleta-russa: de paixão, delírio e extraconjugações natalinas.
Funcionário novo, ele não poupava as olhadelas insinuosas pelo extenso corpo de Anita durante o expediente, embora soubesse que ela era mulher do chefe e que o estagiário mais novo, o Adolfinho, era filho do casal.
Teve uma vez que Anita foi passar o telefone para Airton e ele acariciou os dedos dela por três imortais segundos: antes que alguém percebesse e pouco depois de que ela achasse aquilo tentador.
Tímida, ela consentiu com um sorriso e uma cruzada de pernas.
Em outra ocasião, Anita fez questão de subir a escada da firma na frente de Airton: queria que ele visse tudo aquilo que ele jamais poderia ter ou tocar. Passava de degrau em degrau vagarosamente. Vestido fechado a vácuo e sandália de prata.
Airton sentia um sopetão de amor platônico por Anita. E Anita sentia um sopetão de “A Dama e O Vagabundo” com pitadas de “A princesa e o Plebeu” por Airton.
Embora fosse gordinho e usasse um relógio que escolhera com o pé num ambulante que expunha mercadorias ilegais no chão da rua Júlio de Castilhos, Airton esbanjava bom gosto. Perfume amadeirado, cabelos espetados e milimetricamente desfiados, exalava cheiro de gel azul para topetes e um hálito de chiclete de melancia sempre eminente.
Ele não só trabalhava no marketing, como era o marketing em pessoa.
Mas aí quando avistou “Anita” no pequeno papelzinho que sorteou os amigos-secretos da firma, seu coração subiu pela glote, alcançou a boca e, antes que caísse para fora, engoliu-o em seco.
Não haveria outra oportunidade para uma declaração antes do fim do ano ou antes que o patrão Gerson descobrisse a paixão fugaz.
Assim que entregou a maquiagem de presente de amigo-secreto à Anita, dentro do potinho estava escrito: Motel L’amour, terça-feira, 15h. Quarto 2.
Era 14h48min. Airton estava no seu Corsa em frente ao que deveria ser o encontro. Para não deixar vestígios, optou apenas pelo papelzinho dentro do estojo de maquiagem. Nada de telefonemas, de Whatsapps ou provas que poderiam acabar com seu emprego ou com o casamento dela.
[bloco 1]
14h50min. Boca seca.
14h55min. Sprayzadas de menta na boca.
14h57min. Anita chega dirigindo a Hilux do marido.
Saiu do carro com um lenço que ia do pescoço até a boca, óculos escuros e um chapéu preto enorme, que mais parecia um guarda-sol.
Adentraram o quarto 2. Assim que tirou a roupa, Airton viu que Anita estava vestida de Mamãe Noel. Com gorrinho e lingerie vermelha.
Você é meu maior presente de Natal.
E atiraram-se numa cama redonda.
Passados 3 minutos, ouviram um estrondo na porta.
Meu marido. Só pode! – esbravejou Anita.
Meu emprego. Já era! – pensou Airton.
Antes de erguerem-se da cama, a polícia entrou no quarto. Acontece que o Papagaio, o maior assaltante de banco do Rio Grande do Sul, havia fugido para dentro do motel.
Ele foi localizado na banheira da suíte daquele quarto.
Em seguida, veio o jornal A Hora, o Informativo, a Rádio Independente.
Todos os jornais abarrotados naquele quarto. E flashs de fotos pra cá e pra lá.
Noutro dia, a manchete nas bancas POLÍCIA PRENDE PAPAGAIO PELA 19ª VEZ pouco aparecia com Anita de Mamãe Noel estampada na capa de todos os jornais do Vale.
Mamãe, mamãe, você parece a cantora Anita no jornal – dizia Adolfinho correndo pela casa no Hidráulica.
É mesmo. Por que você nunca cantou para mim? Tá tão bonita nesta foto… – indagou o marido Gerson.
“Prepara que agora é a hora
Do show das poderosas”
Cantava a Anita mais famosa da região.


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charge cris

Depois da crônica sobre os dramas cotidianos de um pé grande, recebi 9 pares de sapato número 46 da Lojas Compasso. Fica aí o serviço de utilidade pública a quem precisa


 
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