O trecho não duplicado da principal rodovia do estado registrou ontem mais uma morte. Durante a manhã, uma colisão frontal em Marques de Souza vitimou o motorista de um Ford Del Rey, com placas de Gravataí. O acidente aconteceu no km 328, em Picada Flor, onde o condutor bateu em uma carreta e morreu no local. Um passageiro precisou ser hospitalizado.
O lugar da fatalidade fica a sete quilômetros de outro ponto crítico da rodovia (km 335), onde outro acidente, na Linha Perau, há duas semanas, matou o motorista de um Honda Civic, de São Jerônimo. O automóvel colidiu de frente com um ônibus da empresa Ouro e Prata. Conforme a Polícia Rodoviária Federal (PRF), o carro teria invadido a faixa contrária.
No mês passado, a rodovia foi local de uma tragédia familiar. Dois irmãos que estavam em uma Fiat Fiorino, com placas de Porto Alegre, morreram ao entrar na faixa inversa e se chocar contra um caminhão. A colisão também foi em Marques de Souza, no trecho próximo a Picada May (km 314).

Ontem, acidente em Picada Flor vitimou condutor de carro de Gravataí
As quatro mortes em menos de 30 dias, dentro de uma área de menos de 15 quilômetros, evidenciam a periculosidade do trecho. O segmento integra os cerca de 350 quilômetros da BR-386 que ainda aguardam a duplicação, de Lajeado a Iraí. Curvas perigosas, buracos, ausência de controladores de velocidade e mais de dez acessos municipais tornam ainda mais graves os riscos aos condutores.
Estatísticas comprovam que a existência de duas pistas reduz a ocorrência de acidentes com mortes. No entanto, nem mesmo a parte duplicada está livre dos óbitos. Na noite dessa quarta-feira, 5, em Estrela, Jaqueline Presser dos Santos morreu no trevo da White Martins, no km 351, em acidente envolvendo sua motocicleta Honda Biz, com placa de Lajeado, e um caminhão.
Até 2030
O leilão promovido em novembro pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), que definiu o Grupo CCR como a empresa concessionária da BR-386 para os próximos 30 anos dá uma nova perspectiva quanto às condições da Estrada da Produção. Com novas praças de pedágio, o contrato que inicia em 2019 estabelece a duplicação da rodovia, de Lajeado a Carazinho, até 2030.
Conforme o calendário estabelecido pela ANTT, o Grupo CCR deverá efetuar as primeiras intervenções, como tapa-buracos, reparos emergenciais e melhorias de sinalização e colocação de taxas refletivas já em 2019. Recapeamento de trechos e reforma estrutural de passarelas e viadutos estão previstos até 2023. A duplicação deverá começar em 2021.

Há duas semanas, colisão entre um Honda Civic e ônibus matou um condutor em Linha Perau, Marques de Souza
Trecho crítico
Além dos benefícios econômicos decorrentes da redução dos custos logísticos, líderes regionais projetam maior segurança para a estrada considerada a mais perigosa do estado.
O prefeito de Marques de Souza, Edmilson Dörr, reconhece que o trecho que perpassa a cidade é uma das partes mais temerárias da rodovia. “Já perdemos em acidentes muitos amigos e conhecidos. A gente lamenta muito toda a vez que acontece uma morte aqui, mas não temos nenhuma influência sobre isso”, afirma.
Segundo Dörr, a rodovia é fundamental para o município, pois liga a cidade ao restante do Vale e a todo o estado. “O desenvolvimento de Marques de Souza passa pela BR-386. Ela nos beneficia muito. Ao mesmo tempo em que é um lugar bonito, com montanhas e paisagens, é uma rodovia muito sinuosa e perigosa”, descreve.
Conforme o chefe do Executivo, a duplicação vai integrar melhor o município à região, bem como diminuir os perigos da estrada.
Para salvar vidas
Conforme a presidente do Conselho de Desenvolvimento do Vale do Taquari (Codevat), Cíntia Agostini, faz tempo que a BR-386 pode ser chamada tanto de Estrada da Produção como de Estrada da Morte. “As duas pessoas que perdemos nesta semana na rodovia reforçam isso”, lamenta.
Para ela, a rodovia duplicada minimiza a incidência de acidentes fatais. “Isso não quer dizer que deixarão de ocorrer, mas dados demonstram que são reduzidos de forma considerável”, analisa. As condições ruins da 386, como perigo aos motoristas e entrave ao desenvolvimento regional, motivam a mobilização de agentes locais pela duplicação faz mais de dez anos, lembra.
De acordo com a economista, a existência da Comissão Pró-Duplicação desde 2005 demonstra quão prioritário é esse tema para o Vale do Taquari. “A gente sente muito continuar perdendo pessoas. É muito difícil saber que, a cada dia ou a cada semana, alguém morre na rodovia pelo fato de ela não ter condições de trafegabilidade”, assevera.
O trecho da serra de Pouso Novo, por exemplo, torna-se muito mais perigoso do que a parte duplicada, menciona. Sem condições de ultrapassagem, com fluxo compartilhado entre veículos leves e caminhões, além de muitos acessos municipais, facilitam a ocorrência de acidentes.
Na área a ser duplicada no Vale do Taquari, são 11 municípios lindeiros. “A rodovia é muito usada pelos próprios municípios, pois ela corta as cidades. E isso, por óbvio, aumenta os perigos”, comenta.
Sobre a concessão, Cíntia considera que foi a alternativa encontrada, apesar do período de 30 anos e a imposição de novos pedágios. “Se essa é a alternativa, temos que construir o melhor projeto para a sociedade. Ali na frente, não tenho dúvidas de que isso vai diminuir os nossos custos logísticos e também ajudar a salvar vidas”, acredita.
Nova esperança
O presidente da Câmara da Indústria, Comércio e Serviços do Vale do Taquari (CIC-VT), Pedro Barth, lamenta que o processo de duplicação não esteja mais avançado. Segundo ele, há um “grande atraso” devido às condições econômicas do país. As concessões do passado também pouco colaboraram para que o tema evoluísse, considera.
“Já deveria estar em andamento a duplicação. Pagávamos caríssimos pedágios em Marques de Souza, por exemplo, e praticamente não foi feito nada”, critica Barth.
O presidente da CIC-VT prevê um “grande impulso” no desenvolvimento regional nos próximos anos em razão do fim da duplicação entre Estrela e Tabaí, acompanhado da redução dos acidentes. Para o trecho entre Lajeado e Pouso Novo, a nova concessão anima o Vale, com tarifas razoáveis na cobrança de pedágios, abaixo do que se projetava inicialmente.
Até 2030, sugere a implantação de controladores de velocidade e maior fiscalização como forma de mitigar as mortes na pista.

No mês passado, dois irmãos morreram em colisão frontal entre Fiorino e caminhão em Picada May
Alexandre Miorim: alexandre@jornalahora.inf.br