De perfis ideológicos antagônicos, Alcir Alves da Silva, 52, e Orlandino Caliari, 67, refletem dentro da região a polarização política instaurada em todo o Brasil. Em comum, apenas o desejo de transformar o país em um lugar melhor para viver.
O primeiro é radialista em Vespasiano Corrêa, município onde o candidato Jair Bolsonaro (PSL) teve o maior percentual de votos na região na primeira etapa do pleito – 74,7%. O outro é agricultor em Canudos do Vale, a única cidade onde Fernando Haddad (PT) venceu, com 44,1%.
Em Vespasiano Corrêa, Alcir da Silva atribui a preferência da comunidade local pelo 17 ao “fim da ilusão” com o PT. Segundo ele, a população despertou e cansou das alianças espúrias entre os mesmos partidos de sempre, que fazem de tudo para se manter no poder.
O comunicador considera que apenas o presidenciável do PSL reúne as condições necessárias para consertar os rumos do país, sendo merecedor de um “voto de confiança” da população. “O povo está cansado desta roubalheira. Além de não ser corrupto, é o único que representa uma verdadeira mudança”, acredita.
Outro fator para a força de Bolsonaro no município, segundo Silva, é a presença de apenas dois partidos no município: PP e MDB. As legendas dividem as nove cadeiras do parlamento e se revezam na chefia do Executivo desde a emancipação, em 1995.
Lembranças do regime
Conforme o radialista, obras importantes do período da ditadura (1964-1985) na região também ajudam a formar uma recordação aprazível à ideia dos militares no poder. Como exemplos, menciona Viaduto 13, Ponte de Veranópolis, Ponte de Ferro, de Arroio do Meio, Barragem Eclusa e início da rodovia ERS-129.
“Tenho certeza que ele não vai implantar uma ditadura militar no país. Mas ele vai sim governar com o pulso firme”, argumenta. Silva revela que votou em Lula no passado, mas teria se decepcionado como a maioria da população. Para ele, o candidato que hoje “fala a língua do povo” é Bolsonaro.
Silva é um entre os 1.305 eleitores do PSL em Vespasiano Corrêa no primeiro turno. Para o dia 28, aposta que o município registrará ainda mais votos ao líder das pesquisas, agregando de Geraldo Alckmin (PSDB), que conseguiu a segunda colocação. Haddad ficou em terceiro, com 119 votos (6,8%).
Resistência vermelha
Filiado ao PT faz 15 anos, Orlandino Caliari é o nome do partido em Canudos do Vale. Conhecido pela atuação em prol da agricultura familiar e habitação rural, é um dos principais defensores da candidatura de Haddad e colaborou para que a cidade se transformasse no único reduto do Vale com vitória do 13 no primeiro turno.
Caliari é um dos líderes regionais do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA). Aposentado, tem a agricultura como fonte de renda. “Até agora não ouvi uma proposta do outro candidato. Com Haddad, sei que os pequenos agricultores podem contar”, assegura.
A política está “no sangue”. Já concorreu duas vezes a vereador, mas ainda não conseguiu ser o primeiro parlamentar petista no município. “Consegui R$ 300 mil em emenda parlamentar para Canudos do Vale durante as gestões de Lula e Dilma”, exalta.
Apoio à agricultura familiar
Residente na comunidade de Rui Barbosa, fala com orgulho dos investimentos viabilizados nos governos petistas. Constata que a facilidade no acesso ao crédito conteve o êxodo rural e promoveu o desenvolvimento do setor primário. “Aqui foram financiados 33 tratores, construídos diversos aviários e implantada a patrulha agrícola na comunidade”, detalha.
O militante salienta ainda a importância da habitação rural, fortalecida por meio do programa Minha Casa, Minha Vida, em articulação com o MPA. “Entregamos 95 moradias durante o governo do Partido dos Trabalhadores. Os agricultores apenas custearam a mão de obra”, ressalta.
Caliari credita o resultado municipal às políticas públicas para o fortalecimento da agricultura familiar. “Seria ingrato se o resultado fosse diferente. O governo Lula deu esperança de dias melhores às famílias de Canudos do Vale”, destaca.
De acordo com o aposentado, o futuro do Brasil e o sistema democrático estão em xeque, com a possibilidade de vitória do candidato rival. “O jogo ainda não terminou, tenho esperança numa virada histórica”, confia.
Corrida ao Piratini divide eleitores no Vale
Ao contrário do resultado em todo o RS, o primeiro turno no Vale do Taquari foi de vitória do atual governador. Com 85.022 votos (35,3%) contra 77.546 (32,2%), José Ivo Sartori (MDB) venceu Eduardo Leite (PSDB) em 26 dos 38 municípios da região.
Com metade dos governos municipais sob comando da legenda, o MDB demonstrou a força da militância local e garantiu a vitória em 12 das 16 cidades que administra (75%). Contudo a sigla perdeu território para os tucanos em Estrela, Paverama, Roca Sales e Canudos do Vale.
Do outro lado, o PSDB não conseguiu fazer o tema de casa. O partido perdeu nos quatro municípios que governa: Teutônia, Encantado, Cruzeiro do Sul e Mato Leitão. Mas contou com a ajuda da coligação para boas votações em localidades sob gestão do PTB, Marques de Souza e Pouso Novo; do PP, Fazenda Vilanova; e do PPS, Bom Retiro do Sul.
Estilo da colônia
Conforme o deputado estadual reeleito Edson Brum (MDB), a boa performance de Sartori na região se deve ao trabalho de seriedade à frente do governo, que teve atitudes que favoreceram quem produz. Segundo o parlamentar, a atual gestão favoreceu o empreendedorismo rural e urbano, que é também uma das principais vocações do Vale.
Brum salienta os cortes de despesas, como a redução da quantidade de secretarias, de 30 para 17, e de 25% dos cargos de confiança (CCs). “Sartori está tentando fazer com que o Rio Grande do Sul se encaixe num tamanho e peso em que a sociedade consiga pagar”, sustenta.
O deputado também comenta que o estilo de homem simples, de família, oriundo da colônia, faz com que os eleitores da região se identifiquem. “Ele não é uma almofadinha, não é um mauricinho. O seu estilo de simplicidade e franqueza, de quem veio da colônia, tem tudo a ver com a nossa região”, sugere.
Acerca das estratégias para a última semana antes do pleito, Brum frisa a intensificação da campanha. Segundo ele, prefeitos, vereadores e líderes regionais estão empenhados em bater de casa em casa para conquistar votos nesta reta final. “Não tem outra maneira. Agora é mobilização total”, resume.
Governar sem lamentar
Segundo o deputado federal eleito Lucas Redecker (PSDB), o ex-prefeito de Pelotas teve um “desempenho muito bom” no Vale, visto que, antes da campanha, era um candidato pouco conhecido em municípios fora da região sul do estado. Leite cresceu de 8%, nas primeiras pesquisas, para 36% no resultado do primeiro turno, destaca.
Redecker pondera também que o partido da candidatura adversária, por ser mais antigo, tem um “maior enraizamento” nas cidades do Vale. Para o dia 28, o deputado projeta a conquista de votos dos concorrentes derrotados no primeiro turno, para que Leite reverta a “pequena desvantagem” que tem em relação a Sartori na região.
A tática é a mesma desde o início do período eleitoral: apresentar de forma transparente as propostas de governo, “sem esconder surpresas” para o eleitor. “Não podemos anunciar promessas e, ao assumir o cargo, fazer o oposto, sob o pretexto de que a situação financeira é mais grave do que se pensava”, critica.
“A região terá as portas do Palácio Piratini sempre abertas, até porque o Eduardo admira muito a característica empreendedora do Vale do Taquari”, realça Redecker. Conforme o parlamentar, o governo do Estado não pode apenas lamentar a situação financeira, mas buscar soluções para superá-la.
Alexandre Miorim: alexandre@jornalahora.inf.br | Colaboração: Filipe Faleiro e Ezequiel Neitzke